DA PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA À REVOLUÇÃO : O QUE ACONTECEU DURANTE 41 ANOS DA REPÚBLICA VELHA

De 1889 a 1930, o Brasil viveu sob uma república excludente, dominada por oligarquias. Saiba como esse período moldou a sociedade brasileira

A chamada República Velha, ou Primeira República, durou oficialmente de 1889 a 1930, mas o que foi chamado de “república” nesse período na verdade foi pouco democrático.

Nascida de um golpe militar e comandada por uma elite rural que mantinha valores autoritários e racistas, a Primeira República foi, na prática, um acordo entre os mais ricos para continuar dominando as classes sociais e o governo da época.

Vamos entender como se deu esse processo, um resumo sobre República Velha, os principais acontecimentos e como esse período reflete a nossa sociedade atual.

O fim da monarquia

Primeira República começou com o fim da monarquia, em 15 de novembro de 1889, quando o Marechal Deodoro da Fonseca liderou um golpe militar que derrubou o imperador Dom Pedro II. Mas o que levou ao fim da monarquia no Brasil?

O estopim foi uma série de crises acumuladas.

Pintado em 1893, o quadro Proclamação da República, de Benedito Calixto, retrata o instante simbólico do início da Primeira República no Brasil. Obra: Benedito Calixto 

Pintado em 1893, o quadro Proclamação da República, de Benedito Calixto, retrata o instante simbólico do início da Primeira República no Brasil. Obra: Benedito Calixto 

A principal delas foi a abolição da escravidão, em 1888, com a assinatura da Lei Áurea. A elite agrária, que era dona da maior parte das terras e da força de trabalho escravizada, ficou furiosa: perderam seus “bens” sem receber nenhuma compensação do governo imperial. Essa elite rompeu com Dom Pedro II e passou a apoiar a criação de uma república — não por desejo de igualdade, mas para manter seus privilégios de outra forma.

O Primeiro Período da República Velha

Logo após o período de distanciamento da monarquia, a Constituição instituída em 1891 estabeleceu o voto direto, mas apenas para homens alfabetizados com mais de 21 anos.

Isso excluía a maioria esmagadora dos brasileiros: mulheres, analfabetos, soldados do Exército, padres e toda a população indígena estavam fora do processo eleitoral. Também não havia Justiça Eleitoral — o que facilitava fraudes e manipulação nos resultados.

Nessa época, votar não era um direito pleno, era um privilégio de poucos.

O Coronelismo

Entre os principais acontecimentos do primeiro período da República Velha está o coronelismo, que consistia no controle político e social exercido por “coronéis” — líderes locais, geralmente grandes fazendeiros, que mandavam na vida política das regiões do interior.

Eles mantinham sua influência por meio de relações de dependência: ofereciam emprego, comida, favores e proteção em troca de obediência e votos. Esse sistema era sustentado pela pobreza e pelo medo. O chamado voto de cabresto era comum — o eleitor era forçado ou convencido a votar conforme a vontade do coronel.

Outro acontecimento importante nesse primeiro período foi a crise do encilhamento, que aconteceu entre 1890 e 1892 e teve seu estopim logo após a Proclamação da República.

O governo do então ministro da Fazenda, Rui Barbosa, tentou estimular o crescimento econômico incentivando a criação de empresas e facilitando a emissão de papel-moeda. A intenção era gerar emprego e modernizar a economia, mas sem controle e com muita especulação, o plano virou um desastre.

Surgiram centenas de empresas fantasmas atrás do financiamento do governo e o mercado acabou entrando em colapso, resultando em inflação, desemprego e instabilidade econômica.

Charge crítica ao voto de cabresto durante a República Velha, em que o eleitor, retratado como um burro, é guiado pelo político até a urna, simbolizando a manipulação e o controle do voto pelas oligarquias. Imagem: reprodução 

Charge crítica ao voto de cabresto durante a República Velha, em que o eleitor, retratado como um burro, é guiado pelo político até a urna, simbolizando a manipulação e o controle do voto pelas oligarquias. Imagem: reprodução 

O Segundo Período da República Velha

A partir de 1894, com a saída dos militares do poder e a eleição de Prudente de Morais, tem início o que ficou conhecido como a República das Oligarquias.

Essa fase da Primeira República foi dominada por um acordo informal entre as elites de São Paulo e Minas Gerais – os dois estados mais ricos e influentes da época. O estado de São Paulo era o maior produtor de café, enquanto Minas Gerais produzia gado, leite e derivados, o que deu origem ao termo “política do café com leite”.

Esse acordo consistia em revezar o poder entre políticos paulistas e mineiros, mantendo o controle do governo federal e garantindo vantagens econômicas e políticas para suas oligarquias.

Durante toda a Primeira República (1889–1930), o Brasil teve 13 presidentes. Aqui tem uma lista para entendermos melhor:

  • Deodoro da Fonseca (1889–1891) – Alagoas
  • Floriano Peixoto (1891–1894) – Alagoas
  • Prudente de Morais (1894–1898) – São Paulo
  • Campos Sales (1898–1902) – São Paulo
  • Rodrigues Alves (1902–1906) – São Paulo
  • Afonso Pena (1906–1909) – Minas Gerais
  • Nilo Peçanha (1909–1910) – Rio de Janeiro
  • Hermes da Fonseca (1910–1914) – Rio Grande do Sul
  • Venceslau Brás (1914–1918) – Minas Gerais
  • Delfim Moreira (1918–1919) – Minas Gerais
  • Epitácio Pessoa (1919–1922) – Paraíba
  • Artur Bernardes (1922–1926) – Minas Gerais
  • Washington Luís (1926–1930) – São Paulo

Os dois primeiros eram militares — Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto — e governaram o que se convencionou chamar de “República da Espada”, mas foi a partir de Prudente de Morais que os civis (também ligados às oligarquias estaduais) passaram a ocupar o poder.

Outro fato curioso são os dois presidentes que, aparentemente, fogem à regra.

Mas embora não fossem de São Paulo ou Minas Gerais, Hermes da Fonseca e Epitácio Pessoa não representaram uma ruptura com a lógica da política do “café com leite”.

Hermes, do Rio Grande do Sul, era militar e foi eleito com apoio das oligarquias, num momento em que o Exército buscava recuperar influência política. Já Epitácio, da Paraíba, foi escolhido como solução de compromisso pelas elites paulistas e mineiras após a morte de Rodrigues Alves, sendo visto como um nome neutro e confiável.

Em ambos os casos, apesar da origem fora do eixo dominante, os dois preservaram os interesses das oligarquias e ajudaram a manter a estrutura excludente da República Velha. Apesar de a olho nu não parecer, foram exceções que confirmaram — e sustentaram — a regra.

Na foto, Prudente de Morais, primeiro presidente civil do Brasil e marco inicial da República das Oligarquias, dominada pela política do “café com leite”. Imagem: Arquivo Nacional

Na foto, Prudente de Morais, primeiro presidente civil do Brasil e marco inicial da República das Oligarquias, dominada pela política do “café com leite”. Imagem: Arquivo Nacional

A Revolução de 1930

A Revolução de 1930 foi o movimento político-militar que pôs fim à República Velha e impediu a posse do presidente eleito Júlio Prestes, dando início à era Vargas.

O estopim do conflito foi a quebra do acordo da política do café com leite que explicamos acima, quando o então presidente Washington Luís, paulista, decidiu apoiar outro paulista como sucessor — rompendo o rodízio pré-acordado com Minas Gerais.

As elites mineiras, se sentindo traídas pelo paulista, se uniram ao Rio Grande do Sul e à Paraíba e fundaram a Aliança Liberal, lançando a candidatura de Getúlio Vargas, então governador do Rio Grande do Sul.

Apesar de Vargas ter perdido a eleição, seu vice foi assassinado em julho de 1930, em um crime que teve grande repercussão política. Em 3 de outubro de 1930, começou o levante armado.

Em poucas semanas, o movimento ganhou apoio popular, adesão de militares e pressão das elites descontentes. Washington Luís foi deposto em 24 de outubro por generais do Exército, e Vargas assumiu o poder provisoriamente em 3 de novembro.

Mais do que uma simples troca de governo, a Revolução de 1930 encerrou o domínio das oligarquias agrárias e abriu caminho para um novo modelo de governança do país.

Registro da chegada de Getúlio Vargas ao poder em 1930, marcando o fim da República Velha. A faixa celebra o armistício da Revolução de 1930 com a frase: “Eis a paz... entre nós”. Imagem: Arquivo

Registro da chegada de Getúlio Vargas ao poder em 1930, marcando o fim da República Velha. A faixa celebra o armistício da Revolução de 1930 com a frase: “Eis a paz… entre nós”. Imagem: Arquivo

Os reflexos da República Velha nos dias atuais

Apesar de ter terminado oficialmente em 1930, a República Velha deixou heranças profundas que ainda influenciam o Brasil de hoje — especialmente nas estruturas de poder, nas desigualdades sociais e na forma como a política é feita em muitas regiões do país.

coronelismo, por exemplo, ganhou novas roupagens, mas não desapareceu.

Em várias cidades do interior ainda existem políticos que concentram poder absoluto, controlam recursos públicos, trocam favores por votos e usam sua influência para manter famílias no poder por décadas.

O clientelismo sobrevive nas promessas de emprego, nas “ajudas” pontuais em troca de apoio político e no uso da máquina pública como moeda de barganha.

Além disso, a desigualdade social estruturada naquele período nunca foi, de fato, enfrentada. A concentração de terras, herdada da lógica escravista e consolidada na República das Oligarquias, permanece como uma das bases da injustiça brasileira.

E a elite econômica que dominava o país no início do século XX ainda encontra ecos em grupos que se opõem à distribuição de renda, à reforma agrária e à inclusão social.

história da República Velha mostra que nem toda república é, de fato, democrática. Entre 1889 e 1930, o Brasil viveu sob um regime marcado pela exclusão, pela concentração de poder e pela perpetuação dos interesses das elites agrárias — que apenas trocaram a coroa por uma farda ou uma cartola.

O povo, recém-liberto da escravidão, continuou fora da política, sem acesso a direitos básicos, submetido ao controle dos coronéis e ignorado pelas instituições. A desigualdade social e a dificuldade de fazer a política representar verdadeiramente os interesses da maioria têm raízes profundas nesse passado.

Compreender esse ciclo histórico é essencial para desmontar os mitos que ainda sustentam visões idealizadas do Brasil — mitos que servem para esconder os privilégios de poucos à custa da pobreza de muitos.

É por isso que a proposta da pós-graduação do Instituto Conhecimento Liberta (ICL), com a disciplina “Narrativas da História do Brasil: a Perspectiva dos Oprimidos”, é tão necessária.

O curso convida a repensar o país a partir das vozes silenciadas e das lutas invisibilizadas, fugindo das versões oficiais que ainda hoje moldam nosso imaginário político e social.

Se você quer compreender o Brasil para além dos livros didáticos, refletir sobre as raízes das injustiças e pensar caminhos para transformá-las, conheça a pós-graduação aqui!

REPORTAGEM DO BLOG ICL NOTÍCIAS” ( BRASIL)

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *