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Ministério Público do DF arquiva investigação sobre o financiamento do BRB ao senador para compra de mansão. Entenda
O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) considerou regular o financiamento do Banco de Brasília (BRB) a Flávio Bolsonaro, para adquirir sua mansão em 2021. A deputada Erika Kokai entrou com uma ação questionando o financiamento e a renda de Flávio. O promotor Eduardo Gazzinelli Veloso solicitou os documentos ao BRB e concluiu:
“A proposta dos compradores seguiu a tramitação e os normativos previstos para a negociação” e não houve indícios de que o BRB tenha flexibilizado regras em benefício do senador. A visão é que a instituição também apresentou garantias suficientes”.
Ou seja, acreditou no que Flávio declarou: renda mensal de R$28.525,93 com 50% que possuía em uma franquia de chocolate, que ele vendera pouco antes.
Nada mais interessou, nem analisar as contas da franquia, nem o valor do imóvel adquirido.
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Os fatos
Vamos a uma análise do que ocorreu:
- Em 2021, Flávio Bolsonaro adquiriu uma mansão em Brasília, com financiamento de R$ 3,1 milhões do Banco de Brasília (BRB).
- Para obter o financiamento, declarou renda mensal de R$ 56.833.51.
- Metade da renda, ou R$ 24.934,81 viriam de seu salário como parlamentar.
- R$ 3.372,87 de aplicações financeiras e R$ 28.525,83 de uma franquia de chocolate.
Todo o inquérito do MPDFT limitou-se a avaliar se o financiamento foi concedido legalmente. Para tanto, baseou-se em duas declarações de Flávio: a renda declarada e o valor do imóvel adquirido.
Onde estão os erros?
O valor do imóvel
Primeiro vamos atualizar os valores: de julho de 2021 a março de 2025 o fator de atualização é 1,208 – correspondendo a um reajuste de 20,8%.
Fonte | Valor original | Atualizado |
Salário de deputado | 24.934,91 | 30.114,35 |
Franquia de chocolate | 28.525,83 | 34.471,25 |
Investimentos | 3.372,87 | 4.073,33 |
Renda da esposa | 8.650,00 | 10.447,20 |
Valor do imóvel | 6.000.000,00 | 7.248.000,00 |
Valor financiado | 3.100.000,00 | 3.744.800,00 |
Valor à vista | 2.900.000,00 | 3.703.200,00 |
A deputado Erika Kokai questionou, junto ao MPDFT, a capacidade financeira de Flávio Bolsonaro para realizar a operação. Especialmente porque os ganhos como parlamentar dependem de cada eleição e o financiamento tinha prazo de 30 anos.
Segundo a Folha, para rebater a argumentação da deputada, a defesa de Flávio apontou no processo que a renda familiar dele não se restringia à “atividade parlamentar, visto que o mesmo atua como advogado, além de empresário e empreendedor, por muitos anos”. Depois, recuou na historia dos ganhos como advogado, quando a mídia constatou que sequer tinha registro na OAB.
A conclusão do MPDFT foi de que “a operação seguiu os manuais internos do BRB e usou como base documentação fiscal, bancária e contábil que comprovaria a renda do casal, incluindo atividades empresariais de Flávio e a atuação de Fernanda como dentista”
Fantástico! Analisou os documentos apresentados, sem se preocupar em analisar sua veracidade, passou ao largo da análise do preço da mansão adquirida. E, mais uma vez – alvíssaras! – Flávio Bolsonaro se safou.
O que deveria ter feito o promotor
Fato 1 – investigar o preço pago pela mansão, como o GGN fez em 19 de março de 2021.
A mansão de Flávio tem 1.100 m2 de área útil. O que significa que ele pagou R$ 5.427 por m2.
O preço do m2 em outras mansões, oferecidas pela Viva Real, vão de 32,2% a 158% acima dp preço supostamente pago por Flávio.
Uma forma de aprofundar as investigações seria analisar o histórico do vendedor, Juscelino Sarkis, que tem uma característica comum às atividades fora do padrão: uma enorme quantidade de CNPJs.
Observamos na época que Sirkis namorava uma juíza que trabalhou diretamente com João Otávio Noronha, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), juiz de confiança dos Bolsonaro, inclusive sendo cotado para o Supremo Tribunal Federal. Apresentamos como mera curiosidade.
Fato 2 – analisar a franquia de chocolate
Vamos a uma análise padrão de uma franquia.
Royalties | 5% a 10% da receita bruta |
Taxa de publicidade | 2% a 4% da receita bruta |
Custos operacionais | 30% a 50% da venda |
Vamos a uma pequena simulação sobre o quanto deveria ser o faturamento da loja,. para proporcionar R$68.942,50 de lucro líquido mensal.
Na tabela,m trabalhamos com o melhor cenário para o Flávio:
- Margem: de 50% a 100% sobre o valor do produto. Usamos a melhor hipótese para Flávio: 100%.
- Royalties: 5% a 10%. Usamos 5%.
- Publicidade: de 2% a 4%. Usamos 2%.
- Custo operacionais: de 30% a 50%. Usamos 30%
Estimativas | Lucro declarado | ||
Faturamento bruto | R$ 430.000,00 | ||
Custo do chocolate | 50% | -R$ 215.000,00 | |
Royalties | 4% | -R$ 17.200,00 | |
Publicidade | 2% | -R$ 8.600,00 | |
Custo operacionais | 30% | -R$ 129.000,00 | |
Lucro bruto | R$ 60.200,00 | R$ 68.942,50 | |
Lucro líquido | 50% | R$ 34.471,25 |
Na melhor das hipóteses (para Flávio) , portanto, a loja deveria vender R$430.000,00 mensais de chocolate e adquirir R$215.000,00 mil em chocolate da fábrica para justificar sua retirada mensal de R$ 34.471,25.
Vamos ver quanto de chocolate a franquia deveria adquirir com R$ 215 mil mensais.
Tipo de Chocolate | Preço por Kg | Quantidade mensal |
Fracionado simples | R$ 20,00 | 10.750 kg |
Chocolate ao leite comum | R$ 30,00 | 7.166 kg |
Chocolate nobre/gourmet | R$ 50,00 | 4.300 kg |
Chocolate premium (belga) | R$ 80,00 | 2.687 kg |
Supondo que a loja adquirisse chocolate nobre/gourmet, teria de adquirir 4.300 kg por mês para justificar os lucros informados. E qual seria a compra média de chocolate pelas franquias?
📊 Comparativo Estimado de Compra Mensal por Loja | |
Franquia | Estimativa de Compra Mensal por Loja |
Cacau Show | ~240 kg |
Kopenhagen | ~2.500 kg |
Brasil Cacau | ~1.250 kg |
Ou seja, os dividendos declarados são um embuste. Mas foram aceitos como corretos pelo promotor, meramente baseando-se nos documentos apresentados por um então deputado investigado pelas rachadinhas.
Segundo Flávio, a franquia serviu para justificar o valor pago à vista e o financiamento a prazo. Mas nem necessitava. Apenas 3 anos depois, ele quitou o financiamento. De onde saiu o dinheiro? Não interessa.
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)