JAIR BOLSONARO: O CAPITÃO EM SEU LABIRINTO

CHARGE DE AROEIRA ” BLOG BRASIL 247″

O ex-presidente enfrentará o julgamento mais significativo da história política do Brasil. Uma condenação poderia acabar com sua liderança na extrema direita.

Paradoxalmente, a responsabilidade de um líder por um crime pode ser óbvia e improvável. Há casos em que o bom senso aponta para a responsabilidade, mas as investigações não conseguem encontrar as evidências necessárias para levar o culpado óbvio a julgamento.

Aconteceu duas vezes com Donald Trump, mas não parece ser o caso de Jair Bolsonaro. Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) acreditam ter provas suficientes para julgar o ex-presidente pelo plano de golpe que levou ao ataque aos prédios presidenciais em Brasília em 8 de janeiro de 2023.

O procurador especial Robert Mueller investigou a interferência russa no processo eleitoral dos EUA, usando equipes de hackers e especialistas em campanhas online, para ajudar Trump a derrotar Hillary Clinton. Ao final de seu árduo trabalho, o ex-diretor do FBI tinha certeza de que o magnata de Nova York sabia e permitiu que agentes do Kremlin o ajudassem a se tornar presidente. Mueller conseguiu provar reuniões entre agentes russos e o círculo íntimo do candidato republicano. Mas não conseguiu obter as provas necessárias para garantir a certeza indicada pela experiência e pelo bom senso dos que investigaram o caso.

Algo semelhante aconteceu com a violenta tentativa de golpe de 6 de janeiro de 2021. Quem acompanhou pela televisão aquele trágico acontecimento, que tentou destruir o processo eleitoral vencido por Joe Biden, não tem dúvidas sobre a responsabilidade de Trump. Mas o FBI não encontrou nenhuma evidência para confirmar isso. Pela segunda vez, o óbvio não era provável, ou seja, não havia provas necessárias.

Nem havia qualquer evidência, além dos gritos de alguns fanáticos que buscavam assassinar o vice-presidente Mike Pence, de que existisse um plano que incluísse tal assassinato no ataque ao Capitólio.

O fato de Trump ter retornado à presidência, apesar de sua clara responsabilidade, entusiasma Bolsonaro. 6 de janeiro de 2021 deixou uma mancha na história americana. E se algo confirmou que o então líder da Casa Branca estava por trás da revolta, foi o perdão que ele concedeu, assim que retornou ao Salão Oval, aos 1.000 violentos “apoiadores de Trump” que invadiram o Capitólio. Essa concessão massiva de impunidade implica um reconhecimento indireto de sua responsabilidade, embora não seja válida como prova.

O fato de Trump ter conseguido retornar à presidência não deve causar muita excitação a Bolsonaro, porque seu caso é diferente. A tentativa de golpe no Brasil inclui o depoimento de um associado pessoal arrependido do então presidente, juntamente com depoimentos de altos oficiais militares revelando que tinham conhecimento do plano. Essa evidência também confirma que o plano incluía três assassinatos. A conspiração planejou envenenar o presidente Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alkmin e o então presidente do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes.

Não teria sido o primeiro assassinato cometido pela extrema direita no Brasil. O ex-presidente Juscelino Kubitschek foi assassinado em 1976 pela ditadura militar brasileira, chefiada na época pelo general Ernesto Geisel.

O ex-presidente João Goulart também pode ter sido vítima de um assassinato. Nesse caso, por envenenamento. O regime impediu uma autópsia e, quase quatro décadas depois, o corpo foi exumado, mas nenhum vestígio de veneno foi encontrado. No entanto, não está descartado que a morte de Goulart na Argentina tenha sido por envenenamento, e que o passar do tempo apagou as evidências, impossibilitando a confirmação do crime com autópsia. De fato, na Argentina João Goulart já havia sofrido um ataque da Triple A.

Se o plano de golpe tivesse dado certo, Lula, Alkmin e Moraes teriam morrido. Aliás, Bolsonaro diz que é uma caça às bruxas e que não há provas contra ele. No entanto, o Supremo Tribunal Federal, utilizando a confissão feita por um ex-assessor pessoal do líder conservador, bem como depoimentos de vários altos oficiais militares, decidiu dar continuidade ao julgamento.Marcos Galperin

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Apesar das evidências esmagadoras, o líder de extrema direita aposta que sua situação se reverterá e, em última análise, o beneficiará em seu retorno à presidência, como ocorreu com as acusações contra Trump por interferência russa fraudulenta no processo eleitoral que lhe rendeu sua primeira presidência, e também pelo ataque ao Capitólio.

Junto com seus ministros da Justiça, Defesa e Casa Civil, Bolsonaro é acusado de tentativa de golpe de Estado e destruição de patrimônio público, pelo complô que incluiu também o assassinato do então presidente, do vice-presidente e do chefe do Judiciário.

Assim, o Brasil terá o maior julgamento por crimes políticos desde a restauração da democracia. O processo de impeachment que afastou Fernando Collor de Mello do cargo por crimes de corrupção denunciados pelo próprio irmão do ex-presidente, bem como o julgamento de 2005 que prendeu o poderoso chefe da Casa Civil do primeiro governo do PT, José Dirceu, pelo escândalo de corrupção apelidado de “Mensalão”, foram menos graves do que aqueles supostamente cometidos por Bolsonaro.

O impeachment que tirou Dilma Rousseff do poder em 2016 por ter encoberto o déficit para se reeleger também não se compara a este caso. O julgamento por corrupção que Michel Temer enfrentou imediatamente após deixar o cargo também não é comparável. Os crimes que levaram Bolsonaro a julgamento são ainda mais graves do que aqueles investigados na Lava Jato, na qual o juiz de Curitiba Sergio Moro prendeu Lula com base em provas escassas e frágeis, decisão revertida dois anos depois pelo mais alto tribunal.

Os olhares da região estarão voltados para o histórico processo judicial, que pode resultar em uma sentença severa e ter um impacto profundo e com consequências imprevisíveis no cenário político brasileiro.

A única coisa certa é que, se os ministros do Supremo Tribunal Federal confirmarem a culpa de Bolsonaro no julgamento, seus seguidores linha-dura não mudarão seu apoio ao líder ultraconservador. Como Mark Twain explicou: “Nenhuma quantidade de evidência pode convencer um idiota”.

CLÁUDIO FANTINI ” REVISTA NOTÍCIAS” ( ARGENTINA)

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