
Diogo Cão (1440 – 1486) foi um extraordinário aventureiro transmontano. Nasceu na senhorial Vila Real e viveu apenas 46 anos, porém, assinalou seu nome, literalmente, na História de Portugal. Não só pelas descobertas marítimas. Mas, sobretudo, por ter criado os fabulosos padrões que demarcaram a soberania da Coroa de Lisboa, a partir do século XVI, nos territórios conquistados ao longo do Atlântico nas Áfricas – antes do desembarque no Brasil.
Os padrões são colunas de pedra, com as Cinco Quinas, esculpidas com cinzéis, tendo, no topo, inscrita a data de sua fixação. Diogo Cão fincou um total de quatro marcos, entre 1482 e 1486, durante o Reinado de D. João II (1455 – 1495), o Príncipe Perfeito. O primeiro foi o de Santo Agostinho, colocado em 1482, ao Sul da atual cidade portuária angolana de Benguela. O segundo, o Padrão de São Jorge, foi erguido dois anos depois, em 1484. É o de maior valor histórico e até hoje permanece na Foz do Rio Zaire, conhecido também como Rio Congo, na República do Congo – que enfrenta uma ofensiva rebelde na fronteira com Ruanda.
O conflito é mediado pelas forças da ONU comandadas por um General brasileiro, Ulisses Mesquita Gomes. O terceiro, ainda em 1484, nas margens do Cabo Negro, ao Sul de Angola. O último foi no Cabo da Cruz, na costa da Namíbia – que, aliás, só deixaria de ser portuguesa no final do século XIX, quando foi entregue à Alemanha, após a Conferência de Berlim, ocorrida em 1884 e 1885, definir uma ‘partilha’ da África. Passaram a ser “protetores” de nações africanas, para além de Portugal, Inglaterra e França, que lá já estavam, a própria Alemanha, com a Namíbia, Camarões, Tanzânia e a ilha-estado de Zanzibar. Assim como a Bélgica, com o Congo, descoberto por Diogo Cão, e a Espanha, tutora da Guiné Equatorial.
Deve-se ao célebre Padrão de São Jorge a existência de um Congo Português. O enclave congolês luso corresponde, atualmente, à região angolana de Cabinda. Integrou, junto com Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, os territórios que restaram sob o Reino de Portugal, oficialmente, após a Conferência de Berlim. Até então, praticamente toda a África negra, desde o século XVI, estava sob domínio dos monarcas lisboetas.
O Congo Português sobreviveu até 1951 – quando as terras foram incorporadas à administração de Angola. Cabinda voltou ao centro das atenções, logo depois da Revolução dos Cravos, em 1974, quando o Zaire, atual Congo, governado por Mobutu Sese Seko (1930 – 1997), reivindicou a anexação do enclave ao seu país. E quase conseguiu. Havia naquele momento três líderes disputando o espólio da rica colônia: o poeta Agostinho Neto (1922 – 1979), do MPLA, vinculado ao Partido Comunista Português (PCP) e à União Soviética, o sociólogo nacionalista Jonas Savimbi, da UNITA, e o economista Holden Roberto (1923 – 2007), da FNLA, cunhado de Sese Seko. Temeu-se que Cabinda caísse no controle de Kinshasa caso os guerrilheiros de Holden Roberto, apoiados pelo regime zairense, vencessem o MPLA e a UNITA. A FNLA foi, entretanto, a primeira a ser derrotada. O confronto decisivo deu-se entre o MPLA e a UNITA – com a vitória dos sucessores de Agostinho Neto, que, ainda hoje, passado meio século, continuam no poder.
Tive uma gratíssima surpresa, em 2016, em Berlim, ao visitar o precioso Museu da História da Alemanha, na famosa Unter den Linden, na companhia de minha querida esposa, Dona Andrea Wolffenbüttel. Encontramos, quase à entrada, o quarto marco de Diogo Cão (foto). Justamente o dedicado à conquista da Namíbia. O Padrão foi localizado pelos alemães em 1893 e levado para Berlim no início do século XX.
ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)
Albino Castro é jornalista e historiador