
Luís Montenegro decidiu baralhar as contas dos comentadores – que já o estavam a ver a cavalgar uma mais do que provável rejeição da moção de censura do PCP – e avançou mesmo para uma solução que nos põe à beira de novas eleições. Fê-lo arrastando todo o governo para um caso que só a ele dizia respeito, o da avença da Solverde à sua empresa, a Spinumviva. E ao decidir avançar mesmo com uma moção de confiança – que mais do que provavelmente vai ser chumbada com os votos contra de PS e Chega – puxa também os portugueses para um rodopio de voto nos próximos meses: legislativas antecipadas, autárquicas e presidenciais. O primeiro-ministro fala em devolver a palavra aos portugueses, a oposição – quase a uma só voz – fala em instabilidade da exclusiva responsabilidade do líder do executivo da AD. A instabilidade que aí vem é certa, independentemente de quem a provocou. Já a clarificação pelo voto é bastante mais difícil de dar como garantida.
A ocorrerem, as eleições apanham o PSD num momento de grande fragilidade. O Governo não teve tempo para distribuir pelos portugueses as benesses que foi prometendo com a almofada financeira deixada em orçamentos anteriores. Pelo contrário, fica colado aos problemas que o SNS já tinha e que não melhoraram, aos atrasos nas colocações de professores na Educação pública. A “cereja” no topo do bolo é deixada pelas polémicas da Lei dos solos (que fez cair um secretário de Estado e salpicou o PM) e das avenças da Spinumviva. Em resumo: polémicas que deixam na cabeça de muitos portugueses a ideia de que os partidos do arco do poder – PS e PSD – apenas esperam que o outro saia para poderem fazer os seus negócios, os políticos (com os seus boys) e os outros.
A clarificação que Montenegro quer apenas o pode beneficiar politicamente a ele.
O PS está em melhor situação? Não. Esta polémica pode ter fornecido um balão de oxigénio a Pedro Nuno Santos, mas não elimina a enorme confusão que grassou nos socialistas quanto às autárquicas e quanto à escolha do partido para as presidenciais; não esconde que Pedro Nuno apostou na estratégia errada de que a AD iria colar-se, e perder com isso, ao Chega. E não melhora o cenário: mesmo com uma vitória do PS dificilmente haverá uma maioria de esquerda que lhe permita reeditar a Geringonça.
O outro partido cujos votos e deputados eleitos decidem para onde vai o país é o Chega. Não sou daqueles que acreditam que estas novas eleições vão fazer disparar a votação do partido de André Ventura. Também o Chega teve de lidar, e muito, com as suas próprias polémicas. Ao seu nível, como por exemplo com o caso do deputado Miguel Arruda e o seu alegado furto de malas. Também estes casos poderão ter feito dano nas intenções dos portugueses.
A questão é, portanto, uma: Quem tem medo de eleições em maio – como pareceu apontar já ontem à noite o Presidente Marcelo? Face à possibilidade de ser “queimado lentamente” nos próximos meses e numa Comissão de Inquérito, Luís Montenegro escolheu salvar a sua imagem política e pessoal. É o seu legado que lhe dá medo. Pedro Nuno Santos teme que os números da noite de eleições lhe deem uma derrota ou uma vitória de Pirro. E que tudo fique como está, mas sem ele à frente do PS.
O Bloco de Esquerda e o PCP devem estar a temer eleições e uma eventual aniquilação nas urnas. Ponto.
André Ventura sorri, com a perspetiva de a direita populista ganhar ainda mais ascendente no Parlamento.
Veremos o que dizem os portugueses.
NUNO VINHA ” DIÁRIO DE NOTÌCIAS” ( PORTUGAL)
Diretor-Adjunto do Diário de Notícias