AS PERGUNTAS QUE O PRIMEIRO MINISTRO LUIS MONTENEGRO DEIXOU SEM RESPOSTA

CHARGE DE HENRI ( PORTUGAL)

Dos clientes pontuais da Spinumviva à compra de duas casas em Lisboa, passando pela opção de pernoitar num hotel de cinco estrelas enquanto faz obras para juntar o apartamento que comprou em seu nome ao dos dois filhos, há várias questões que Luís Montenegro deixa sem resposta

“Nunca quem não quer perceber vai dizer que entendeu a explicação”. Foi com esta frase que o primeiro-ministro justificou, na comunicação que fez ao país no sábado à noite, a opção de não prestar mais esclarecimentos sobre os casos que vieram a público nos últimos dias e que degradaram de tal forma o ambiente político que o Governo decidiu avançar com uma moção de confiança, mesmo sabendo que a oposição tem a intenção de a chumbar e, com isso, fazer cair o Executivo.

Depois de ter feito essa comunicação ao país, continuaram a sair notícias que geraram novas dúvidas. Em alguns casos, o primeiro-ministro foi dando algumas respostas aos órgãos de comunicação social que o questionaram sobre informação que tinha, mas nunca respondeu de viva-voz aos jornalistas nem deu mais esclarecimentos durante o debate da moção de censura proposta pelo PCP, esta quarta-feira no Parlamento.

Na sequência de informações que foram sendo tornadas públicas, a VISÃO enviou um conjunto de questões ao gabinete de Luís Montenegro, às quais não conseguiu obter nenhuma resposta. A essas juntam-se algumas outras que foram sendo feitas pelos deputados da oposição, sem qualquer esclarecimento.

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Estas são as perguntas que estão por responder, o que sabemos já e o motivo pelo qual é importante serem esclarecidas por Montenegro.

Quais são os clientes a que a Spinumviva prestou serviços?

Esta pergunta tem sido feita repetidamente, sem que haja uma resposta. O primeiro-ministro começou por dizer que o segredo comercial o impedia de fazer essa revelação sem antes ter autorização dos clientes. Depois, a própria sociedade fundada por Luís Montenegro divulgou as empresas com as quais mantém avenças. Nessa lista não constava a Cofina, que Montenegro tinha começado por revelar ao Correio da Manhã ter sido um dos seus clientes, presume-se que por ser uma prestação de serviços pontual. No entanto, isso nunca foi explicado nem revelados outros clientes pontuais, o tipo de trabalho prestado e os valores cobrados. Também não foi explicado por que motivo no registo de interesses entregue quando foi para o Governo Luís Montenegro escreveu, segundo o Expresso, “nada a declarar” na parte reservada a serviços prestados que possam suscitar impedimentos. Isto, apesar de entretanto ter dito publicamente que pediria escusa caso tivesse de tomar decisões sobre a Solverde que foi, até esta quarta-feira, uma das empresas que manteve avenças com Spinumviva.

Das três contas referidas na notícia da TVI/CNN como tendo servido para pagar o apartamento em Lisboa, alguma delas é a conta caucionada no valor de 200 mil euros que o primeiro-ministro revelou ao Correio da Manhã ter?

Segundo o Correio da Manhã, na segunda declaração de rendimentos entregue à Entidade da Transparência enquanto primeiro-ministro, Montenegro declarou uma conta caucionada no valor de 100 mil euros. O próprio revelaria àquele jornal que o montante de crédito permitido por essa conta do BCP seria afinal de 200 mil euros. À TVI, Luís Montenegro disse ter usado três contas para pagar o apartamento que comprou em seu nome e da sua mulher já como primeiro-ministro. Uma delas estava exclusivamente em nome da sua mulher e essa é a justificação para não ter sido declarada, apesar de estarem casados em comunhão de adquiridos, regime que obriga o titular de cargo público a declarar todos os montantes detidos pelo cônjuge, a menos que sejam produto de uma herança ou tenham sido adquiridos antes do casamento. À VISÃO, São Bento não esclareceu se Montenegro usou uma conta caucionada, como tudo parece indicar, para comprar a casa.

Por que motivo recorreu a uma conta caucionada para este efeito e não a um crédito à habitação?

Uma conta caucionada é uma conta de crédito corrente usada normalmente por empresas para fazer face a problemas de tesouraria. Por exemplo, pagar a fornecedores enquanto espera pagamentos de clientes. É sempre um crédito de curta duração, porque os juros são calculados diariamente e facilmente atingem montantes elevados. No site do BCP, banco em que Montenegro diz ter uma conta caucionada de 200 mil euros, a taxa de juro efetiva a um ano para este tipo de conta é de 12,183%, Para se ter uma ideia, no crédito à habitação as taxas variam entre os 2 e os 4%. Não parece haver racionalidade financeira nesta opção, mas Luís Montenegro também deixou esta pergunta da VISÃO sem resposta.

A conta caucionada está em nome de Luís Montenegro ou em nome de uma empresa? Que empresa?

A pergunta faz sentido, porque estas contas são apresentadas pelos bancos como produtos essencialmente destinados a fazer face a “necessidades ocasionais de tesouraria” das empresas. O gabinete do primeiro-ministro deixou a questão da VISÃO sem resposta.

Uma vez que uma das casas é propriedade dos filhos, qual o objetivo das obras feitas para unir os dois apartamentos? Os apartamentos destinam-se a servir de residência de apoio à família em Lisboa ou foram comprados como investimento?

As perguntas da VISÃO ficaram sem resposta.

A TVI/CNN revelou que o primeiro-ministro está a morar num hotel de luxo no centro de Lisboa enquanto decorrem as obras dos apartamentos que comprou na Travessa do Possolo. Desde quando está o primeiro-ministro instalado no Epic Sana das Amoreiras?

Tendo em conta o valor da diária que, para um quarto normal ronda os 200 euros por noite, faz sentido questionar a opção do primeiro-ministro, que ganha 4500 euros líquidos e que tem a hipótese (à qual António Costa recorreu durante o confinamento da pandemia) de pernoitar na residência oficial em São Bento. O estilo de vida acima das possibilidades aparentes foi questionado, por exemplo, quando esteve em causa o apartamento de Paris onde José Sócrates viveu. Esse tipo de situações levou mesmo, por diversas vezes, o PSD a tentar criar o crime de enriquecimento ilícito, uma iniciativa que acabaria chumbada pelo Tribunal Constitucional por constituir uma inversão do ónus da prova.

Quantos quartos estão a ser usados? Os seguranças do primeiro-ministro também ficam alojados no mesmo hotel?

A VISÃO fez esta pergunta para perceber se Montenegro está a usar o hotel também como espaço de trabalho e também porque as questões de segurança levam a que, normalmente, em deslocações haja pelo menos um elemento do corpo de segurança da PSP a ficar com o chefe de Governo. Nesse caso, era importante saber se é assim e se esse custo está a ser suportado por Montenegro a título pessoal ou pelo Estado.

Qual o valor pago por noite?

Tendo em conta a informação de que se tratará de uma suite e que haverá vários lugares de estacionamento reservados, o preço pode ser superior ao que aparece nas pesquisas para um quarto normal. Ainda assim, é possível que, como é normal nestas situações, o hotel faça um desconto numa estada de longa duração e o preço desça. A pergunta da VISÃO ficou sem resposta.

É o Estado que paga esta estada? A que título?

Hugo Soares, líder parlamentar do PSD e secretário-geral do partido, disse de forma visivelmente agastada numa entrevista à SIC Notícias que era o próprio Luís Montenegro a pagar o hotel. No entanto, a VISÃO confrontou diretamente o gabinete do primeiro-ministro com a pergunta, por nunca o próprio a ter respondido. Ficou sem resposta. Tal como não foi dada nenhuma justificação (nem sequer por Hugo Soares) para Montenegro não usar as instalações da residência oficial em São Bento, onde Cavaco Silva chegou a morar com a mulher e os filhos e onde António Costa pernoitou durante o seu confinamento por causa do vírus covid-19.

MARGARIDA DAVIM ” REVISTA VISÃO” ( PORTUGAL)

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