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A adorável gastronomia italiana, pela qual sou apaixonado e, modestamente, aprendi a preparar alguns pratos de seu riquíssimo cardápio, durante os 10 anos que vivi em Roma, é apreciada em todo planeta por suas massas, sobretudo gli spaghetti, os macarrões, e o tradicional sugo al pomodoro, ou seja, o molho de tomate. Nada é mais tipicamente italiano, portanto, do que uns spaghettini al pomodoro. Mas os spaghetti e os tomates, como sabemos, não são naturais da Itália, porém, provenientes de dois outros continentes.
As massas desembarcaram no Bel Paese, no século XIV, levadas da China pelo mercador veneziano Marco Polo (1254 – 1324), e os tomates chegaram do Novo Mundo, a partir do século XVI, trazidos nos galeões da Espanha, controladora, à época, da Itália meridional. A descoberta das Américas brindou muitas novidades aos europeus, entre as quais, para além do tomate, a batata, milho, cacau, peru e tabaco. Entretanto, a rigor, foram os portugueses que mudaram, há mais de 500 anos, o sabor do Velho Mundo, transportando do Extremo Oriente, em suas caravelas, os extraordinários temperos culinários, as especiarias, como a pimenta, a canela, o cravo e a noz moscada, encontradas na Índia e nas inúmeras ilhas da Indonésia.
O bem-sucedido domínio lusitano do comércio na Ásia, obviamente, causou inveja às demais nações da Europa e, por isso, nos albores do século XVII, seriam criadas as legendárias Companhias das Índias Orientais, com recursos privados, ao contrário dos empreendimentos portugueses, administrados diretamente pela Coroa de Lisboa. O advento das companhias das Índias seria a origem do capitalismo globalizado, segundo vários estudiosos, inclusive o escocês Adam Smith (1723 – 1790), considerado o pai da Economia moderna.
A pioneira das companhias foi fundada na Inglaterra, em 1600, por iniciativa de comerciantes de Londres, a prestigiosa East India Company, gerida, em grande parte, contudo, pela soberana Elizabeth I (1533 – 1603) – a vetusta Rainha Virgem. Todas as possessões da EIC seriam transferidas para a Coroa Britânica, em 1858, com o fechamento da companhia, integrando seu vastíssimo Império. A segunda empresa de comércio marítimo privado seria constituída, em 1602, em Amsterdam, a holandesa Vereenigde Ootindische Compagnie, a renomada VOC, na esteira da proclamação da calvinista República das Sete Províncias Unidas, em 1581, após os protestantes abolirem a Monarquia católica dos Habsburgo nos Países Baixos.
Os neerlandeses estenderam ao outro lado do mundo o confronto contra os Habsburgo de Viena d’Áustria e, em consequência, ocuparam diversos territórios lusitanos na Ásia – porque Portugal, de 1580 a 1640, estava sob tutela da dinastia austríaca que reinava em Madri. A sede da VOC no Extremo Oriente era na atual capital da Indonésia, Jacarta, denominada então Batávia. A companhia holandesa existiu até 1799. E, por fim, em 1664, foi estabelecida, em Paris, a Compagnie Française des Indes, a CFI, anexando regiões no Golfo de Bengala, que, anteriormente, eram feitorias lusas. Sua sede, na Índia, era na cidade Pondichéry. Passou à História um dos governadores-gerais da CFI, o indiano Ananda Ranga Pillai (1709 – 1761), autor de curiosos diários sobre a vida naquele tempo na Índia. Ilustra a coluna, justamente, um exótico retrato de Pillai na capa da preciosa revista parisiense “L’Histoire”.
O capitalismo globalizado consolidaria o paladar multinacional, faria a fortuna dos comerciantes ingleses, holandeses e franceses, e, no auge das companhias, os tornaria, como observou Adam Smith, mais poderosos que seus próprios Estados.
ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOGO” ( BRASIL / PORTUGAL)
Albino Castro é jornalista e historiador