O PLANO DA PÓLVORA

Mario Draghi, aluno dos Jesuítas e nascido na cidade de morte de Santo António, foi meteórico PM de Itália. Provou na carne a ingovernabilidade nacional. Como presidente do BCE, verificou que a Europa da União estava por fazer. Agora tem um plano.

É um extenso relatório, em duas partes, de quase 400 páginas no total, sobre o que está mal, o que está bem e o que poderia estar melhor, na mesma Europa.

Em poucas palavras, a União já não é uma superpotência económica, maravilha da Técnica e política e diplomaticamente influente por toda a parte. E está longe de ser um poder militar dissuasor, apesar de um membro, a França, pertencer ao clube nuclear, com modernização do seu arsenal de ataque aéreo e submarino.

Em menos palavras ainda, se a Europa quer ser relevante, possui pouco tempo para mudar.

De forma específica, tem de destruir os obstáculos à inovação, crescimento empresarial e grandes obras infraestruturais multinacionais, saindo do mero recurso ao crédito bancário e envolvendo autarquias, grupos privados, associações de investidores, cooperativas, fundos de pensões e cidadãos individuais com gosto pelo risco.

Tem de facilitar o financiamento da banca, tornar eficiente e alargado o orçamento da União (que empalidece perante o americano, em termos de percentagem do PIB), desburocratizar, simplificar e clarificar procedimentos administrativos, criar um verdadeiro mercado financeiro, segurador e de ações, com regras comuns, e a criação de uma verdadeira autoridade europeia, sucessora da ESMA, sugestão aliás já contida noutro relatório marcante, feito por Enrico Letta, um outro ex-chefe de governo italiano, em abril deste ano.

Tem de deixar aos cidadãos a capacidade de investir, aforrar e sediar-se em qualquer país membro, e de eliminar a fiscalidade múltipla, precisa de tornar a banca unificada mas flexível, inteligente mas transparente, resistente e capaz de recorrer, em caso de perigo, a uma autoridade europeia, e não apenas nacional ou local.

Tem de apoiar a modernização, o estudo das práticas de economia concorrentes, a produtividade e a qualidade dos produtos, o crescimento quantitativo e qualitativo em setores estratégicos (comunicações, semicondutores, microssistemas, energia, transporte, exploração espacial, mineração “verde”, sensores e redes, etc.), e de tem saber conciliar liberdade de mercado, respeito de regras de justiça e protecionismo pontual, como acontece, por exemplo, nos EUA.

Tem de conciliar a Europa social, de garantias laborais e pensões, assistência e segurança, com a maior eficácia da relação entre horas de trabalho, remunerações pagas e resultados.

Tem de combater decisivamente a dependência em segurança, defesa, sistemas de vigilância e informações, face aos EUA, criar novos laços e erguer rapidamente estruturas de proteção, intervenção e ação conjunta, baseadas em projetos militares comuns e numa política acelerada de produção, infusão de novas tecnologias e incentivos ao serviço nas forças armadas.

Tem de reduzir drasticamente os preços da energia, produzir, investir e produzir local (unificando políticas nacionais tradicionais de preferência), e gastar muito mais fundos em pesquisa e desenvolvimento industrial e tecnológico, aproximando-se outra vez do nível americano.

Apesar dos choques migratórios, dos dramas da liderança e da radicalização social, do irredentismo de certos estados e da competição chinesa, a Federação Americana conseguiu manter-se como primeira economia mundial.

Porque não pode isso acontecer também com a Europa, incluindo em novos acordos com o seu ex-componente, o Reino Unido, e mantendo o princípio de que a União não é um estado federal, mas um projeto de sobrevivência, e vida, de Estados nacionais?

A resposta dependerá das chefias de países em crise, mas não há, neste momento, um projeto credível de crescimento, fora da União. Se houver, falamos.

Isto digo eu. Não Draghi.

PS – Outro tiroteio sobre Trump, outro cidadão “normal” a quem salta um fusível, e que vem dos republicanos. Ou dos democratas. Ou dos que apoiam “indianos” para a presidência. Ou dos apoiantes da Ucrânia. Ou do Hamas. Ou do Haiti. E há uma kalashnikov. Magnicidas marginais melancólicos.

O outro plano

O segundo plano é o de Zelensky (VZ), aliás ligado a Draghi. Foi este que propôs a entrada da Ucrânia na UE, e a expulsão da Rússia do sistema SWIFT.

VZ vai entregar à atual e à futura liderança americana um “roteiro de vitória”, em que propõe uma via realista para obter a libertação do país.

O mesmo projeto tem quatro elementos fundamentais e um supletivo que envolvem fornecimentos militares adequados e ajuda à indústria nacional, ofensivas sobre pontos-chave e mecanismos de defesa de cidades e pessoas, e possível aceitação de uma retirada geral russa, sem condições mas também sem retaliação e sob proteção externa.

Nada disto satisfaz a atual chefia do Kremlin. E outra ainda não existe.

Ao cabo das tormentas

Montenegro lidou com as crises remuneratórias das forças de segurança e de defesa, com a instabilidade entre professores e médicos, com as catástrofes naturais, guerras lá fora, e agora com os fogos. Não se pode ainda fazer um balanço absoluto, mas o seu Governo parece disposto a lutar, mesmo em situações-limite. Isto prepara para a próxima batalha orçamental ou confere ao executivo de minoria relativa um falso sentido de facilidade e “favas contadas”?

Pelo que conheço dos atores, sei que, dentro da barca do PM, e sem discutir o maior ou menor talento de cada um (há quase desastres e glórias), não habita ali qualquer ilusão sobre os desafios a vir.

Um Governo pessimista é bom para tormentas.

Uma arma de Golias

Em novembro de 2022, o Irão anunciou a criação do “míssil hipersónico”: Fattah 1, ogiva de 450 kg, “alcance intermédio” e uma velocidade (tida como fantasiosa) de Mach 13.

Especulou-se que esta arma, provavelmente dada por Teerão ao Ansar Allah, seria a responsável pelo ataque ao centro de Israel, no domingo, disparada do noroeste do Iémen.

Nada prova que se tratasse verdadeiramente de um “hipersónico”. O tempo para cobrir os 2.221 quilómetros foi de 15 minutos a quase 2 horas, segundo fontes antagónicas, e a interceção deu-se, embora sem destruição total do atacante.


NUNO ROGÉRIO ” REVISTA SÀBADO” ( PORTUGAL)

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