A BIRUTA JÁ VIROU NOS EUA; E NO BRASIL ?

CHARGE DE GAZO

Depois de atingir e até superar os R$ 5,40 na quarta-feira, com um misto de expectativas e especulação em relação à reunião do Federal Open Market Committee (FOMC, o colegiado de política monetária do Federal Reserve Bank, que manteve os juros estáveis e anunciou, pelo menos uma baixa este ano, os fatos se precipitaram nos Estados Unidos, com aumento nos pedidos de seguro-desemprego e deflação de 0,2% nos preços ao produtor, que se seguiu à desaceleração, na véspera, do índice de preços ao consumidor.
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Decididamente, a biruta nos Estados Unidos mudou de direção. Como as especulações na vizinha Argentina, de fracasso total no pacote de reformas do governo Milei – a votação, nesta manhã, terminou em empate, com 36 votos a favor e 36 contra, com o voto de desempate, da vice-presidente Victoria Villaruel, aprovando o pacote, o dólar chegou a ceder 5% na praça portenha e o movimento de baixa se estendeu ao Brasil. Depois de abrir a R$ 5,40 e não se sustentar, a cotação desabou por influência dos ventos da Argentina e a moeda era cotada por volta das 13 horas a R$ 5,37, com queda de 0,70%.

Engraçado que o noticiário em torno do dólar não faz qualquer ligação com a tensão na Argentina – com relação direta ao nosso mercado -, mas insiste, mesmo após os dados positivos da inflação, em desaceleração nos EUA (o que pode levar o Fed a baixar duas vezes os juros ainda este ano), em pressões fiscais no Brasil. De fato, os planos do ministro da Fazenda de cobrir o rombo criado por decisões do Congresso, com restrições às compensações de impostos do PIS/Cofins, caíram por terra, mas a situação não é desesperadora.

Serviços e comércio seguem positivos
Os dados do volume de serviços em abril – com alta de 0,5% sobre março – e o avanço de 0,9% no volume de vendas (o varejo restrito cresceu 2,2% na variação com desconto sazonal, e o varejo ampliado, com comércio de automóveis, motos, peças e materiais de construção, caiu 1,0%, mostrando que as elevadas taxas de juros estão freando as vendas no crediário) estão indicando que a dinâmica de crescimento da economia este ano é mais lenta (o agronegócio cresceu muito em 2023), porém, mais espalhada.

Isso implica em mais arrecadação, como disse o presidente Lula (embora o mercado procure entender como uma aversão a corte de despesas). E a arrecadação só não cresce mais – para o governo ampliar investimentos, voltados ao campo social e à infraestrutura, porque os juros elevados desestimulam os investimentos.

Por que ninguém fala dos juros?
O pior mesmo é que as ordens de grandeza entre eventuais aumentos do déficit primário (receitas menos despesas), que não considera os gastos com juros e os aumentos nas despesas com juros causados pela cautela do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) são forte e duplamente desfavoráveis à gestão pública.

A perda de receita com a não compensação do PIS/Cofins pode implicar despesa extra de R$ 25 bilhões, elevando o déficit a R$ 40/45 bilhões. Entretanto, cada ponto percentual a mais ou a menos na taxa Selic gera, ao longo de 12 meses, aumento de R$ 50 bilhões nos gastos com juros.

As previsões no começo do ano, quando se pensava que o Fed baixaria três vezes os juros em 0,75% no total, eram de que a Selic fecharia 2024 em 9,00% e em 8,50% ao ano em dezembro de 2025. Com a cautela do Fed e os riscos de pressões inflacionárias com a especulação dos preços dos alimentos e do dólar – com o pano de fundo da piora fiscal – o Copom redobrou a cautela.

Selic em 10,50% custaria R$ 225 bi em 2 anos
O mercado brasileiro está dividido entre nenhuma mudança na próxima reunião do Copom, que deixaria a Selic em 10,50% ao ano até meados do ano que vem (caso do Bradesco, que vê queda para 9,50% em 2025; Itaú e LCA Consultores projetam a estabilidade até dezembro de 2025) e uma última baixa de 0,25% em 19 de junho, para 10,25%, como pensa a UBS-BB Investimentos.

Além de gerar aumento descomunal nas despesas com juros – no pior cenário R$ 225 até dezembro de 2025, comparado ao cenário base das Pesquisas Focus do começo deste ano (9% e 8,50%, respectivamente), tem o efeito colateral da trava dos juros na redução do crescimento, do emprego e da arrecadação. Ou seja, o círculo vicioso da estagnação em vez do círculo virtuoso do crescimento.

O mais grave é que essas dezenas de bilhões em juros vão engordar a renda dos mais ricos. Mas os gestores dos fundos de investimento (que lucram ao gerir esta bolada, sem correr muitos riscos) querem constatar a cobrança de tributos nas taxas de administração, alegando ser prestação de serviços.

É sempre bom lembrar o mandato do Fed
O Sistema da Reserva Federal, o banco central dos Estados Unidos, desempenha cinco funções gerais para promover o funcionamento eficaz da economia dos EUA e, de forma mais geral, o interesse público.

A Reserva Federal conduz a política monetária do país:

para promover o emprego máximo, preços estáveis e taxas de juros moderadas de longo prazo na economia dos EUA [nosso Copom parece fazer justamente o contrário, quando o emprego cresce (o que tende a melhorar a arrecadação, inclusive do INSS, o grande déficit primário das contas públicas), o Copom acende o sinal amarelo e já pensa em elevar os juros];

promove a estabilidade do sistema financeiro e procura minimizar e conter riscos sistémicos através de monitorização e envolvimento ativos nos EUA e no estrangeiro;

promove a segurança e a solidez de instituições financeiras individuais e monitoriza o seu impacto no sistema financeiro como um todo;

promove a segurança e a eficiência dos sistemas de pagamentos e de liquidação através de serviços ao setor bancário e ao governo dos EUA que facilitam as transações e pagamentos em dólares americanos;

e promove a proteção do consumidor e o desenvolvimento comunitário por meio de supervisão e exame focados no consumidor, pesquisa e análise de questões e tendências emergentes de consumo, atividades de desenvolvimento econômico comunitário e administração de leis e regulamentos de consumo.

GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)

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