POR QUE NÃO FALAR NOS JUROS DA DÍVIDA ?

CHARGE DE JOTA CAMELO

O Banco Central divulgou nesta 4ª feira os dados fiscais consolidados do setor público, com superávit primário (receitas menos despesas) de R$ 6,7 bilhões, sendo saldo de R$ 8,8 bilhões no governo central (que inclui INSS e Banco Central) e déficits de R$ 1,4 bilhão nos governos regionais (estados e municípios) e de R$ 698 milhões nas estatais (exceto Petrobras e BB). Decompondo o resultado do governo central, o governo federal teve saldo de R$ 39,153 bilhões. Com déficits de R$ 30,258 bilhões do INSS e de R$ 123 milhões do Banco Central, o resultado da União murchou a R$ 8,8 bilhões.
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De janeiro a abril, o setor público consolidado teve superávit de R$ 61,320 bilhões, sendo R$ 122,868 bilhões no governo federal. Mas, o INSS acumulou déficit de R$ 92,295 bilhões e o BC ficou negativo em R$ 246 milhões, o que reduziu o resultado primário do governo central a + R$ 30,327 bilhões. Com o superávit de R$ 33,302 bilhões dos governos regionais e deduzidas as perdas de R$ 2,092 milhões das estatais, restaram R$ 61,320 bilhões. Os números parecem indicar que o INSS continua um sorvedouro de recursos públicos.

Juros da dívida crescem R$ 58 bilhões até abril
Entretanto, as análises do noticiário econômico, que jogam foco no resultado primário, cujo objetivo seria gerar poupança do setor público para bancar o serviço da dívida pública, costumam dar menor importância aos resultados dos juros. Os montantes são tão descomunais que o esforço do superávit primário é mais ineficaz do que enxugar gelo.

Em abril, os juros pagos pelo setor público consolidados aos credores (sobretudo bancos e investidores em papéis do Tesouro direto ou via fundos de renda fixa) somaram R$ 76,326 bilhões. Em relação aos R$ 64,158 bilhões de março, houve aumento de R$ 12,168 bilhões nos gastos com juros. As perdas de R$ 11,2 bilhões em “swaps cambiais” do Banco Central foram cruciais.

Mas o exame dos números do 1º quadrimestre e dos últimos 12 meses deixa um quadro bem mais preocupante. De janeiro a abril de 2024, os gastos com juros somaram R$ 285,565 bilhões, um aumento de R$ 58,022 bilhões sobre o mesmo período de 2023. Os gastos com juros foram mais do que o triplo do rombo do INSS, a conta mais deficitária do governo, de R$ 92,295 bilhões no quadrimestre. Em 12 meses, o montante de juros acumulou R$ 776,316 bilhões, um aumento de R$ 30,473 bilhões frente aos 12 meses acumulados até março. Este aumento se explica pelo fato de que em abril de 2023 o Banco Central teve ganho de R$ 14,2 bilhões em “swap” cambial e perda este ano.

Cada ponto na Selic gera R$ 50,1 bilhões em juros
Os dados do Banco Central indicam que cada aumento de 1 ponto percentual na taxa Selic implica, ao fim de 12 meses, aumento de R$ 50,1 bilhões em juros da dívida. Ou seja, só em cortar apenas 0,25% e não 0,50% na Selic em 8 de maio, para 10,50% ao ano, o Comitê de Política Monetária gerou gastos extras de R$ 12,525 bilhões para os próximos 12 meses.

O dilema do Copom
Se o Copom encerrar o ciclo de cortes da Selic em 19 de junho com um último corte de 0,25 p.p. para 10,25%, em relação às previsões iniciais de 9,00% para 2024 terá havido um desvio – para cima – de 1,25 p.p. Ou seja, um gasto extra de R$ 62,665 bilhões, afora eventuais ganhos e perdas com “swaps” cambiais.

Os dados da prévia da inflação de maio, com alta de 0,44% no IPCA-15 (apurado até 15 de maio) mostraram uma composição benigna da inflação, que ficou abaixo das expectativas do mercado (0,47%). A LCA Consultores está projetando alta de 0,42% para o mês cheio, ainda pelo impacto de Transporte, que subiria 0,62%, puxado pela alta da gasolina, devido ao encarecimento do etanol, que entra em 27% na mistura da gasolina comum. Mas os aumentos cairiam para 0,16% em junho e 0,25% em julho.

Tudo seria compensado pela desaceleração dos preços de Alimentos e Bebidas. A LCA prevê alta de apenas 0,33% em maio (sendo de 0,30% o aumento da Alimentação em domicílio. Os números caem para 0,06% em junho (deflação de 0,06% na alimentação em domicílio) e para -0,17% em julho (queda de 0,39% nos preços da alimentação em domicílio), o que arrastaria o IPCA para alta de apenas 0,06% em junho e -0,17% em julho.

Como em 2023 o IPCA subiu 0,23% em maio, caiu 0,08% em junho e subiu 0,12% em julho, a taxa pode passar de 4% em junho, mas entrar o 2º semestre abaixo de 4,00%. Todas as análises mostram um cenário confortável de desaceleração em alimentos e serviços.

O que pode gerar maior cautela do Comitê de Política Monetária do Banco Central – à falta de sinais de fumaça de baixa de juros nos Estados Unidos e na Europa – são os sinais de continuidade da expansão do mercado de trabalho no Brasil, com recorde de registros de empregados com carteira assinada e redução dos índices de desemprego da PNAD de abril a 7,5%, a menor para o período fevereiro-março-abril desde 2014 (7,2%).

Para a LCA Consultores, além da maior preocupação com “a resiliência da atividade e a pujança do mercado de trabalho”, que poderiam “induzir um processo de desinflação ainda mais lento”, os membros do Copom estão preocupados com a “desancoragem” de expectativas, sobretudo para prazos mais longos, que poderia estar associada: (i) a uma percepção de piora da situação fiscal; e (ii) a uma maior desconfiança dos agentes “acerca do compromisso da autoridade monetária com o atingimento da meta [de inflação]”.

Mas a LCA lembra que “a inflação corrente segue bem-comportada: o IPCA-15 de maio mostrou que a média das principais medidas de núcleo continua a correr em ritmo compatível com as metas; e que a inflação de serviços, embora siga salgada, continua a desacelerar em relação às taxas observadas em anos anteriores. Isso mantém na mesa a possibilidade de um derradeiro corte da Selic, de 25 pontos-base, na reunião do Copom de 19 de junho – desde que, reiteramos, até lá haja uma acomodação de riscos externos e domésticos”.

GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)

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