As previsões semanais da Pesquisa Focus, colhidas pelo Banco Central junto a mais de 150 instituições financeiras, consultorias e institutos de pesquisa até cada 6ª feira e divulgadas às 2ª feiras, servem ao Comitê de Política Monetária (Copom) para balizar as expectativas do mercado sobre os diversos indicadores macroeconômicos. A precisão é maior no curto prazo. No médio e longo prazo levam em conta mais as previsões do próprio BC e as metas de inflação fixadas previamente com 18 meses a dois anos de antecedência.
Ante tantos erros recentes prefiro me ater ao horizonte até 18 meses. No último Boletim Focus de 2022 (30 de dezembro) o mercado previu que o PIB de 2023 ia crescer 0,80% (0,79% nas previsões dos últimos cinco dias úteis), que o IPCA subiria 5,62% (5,64% nos 5 dias), o dólar fecharia em R$ 5,27 (R$ 5,25 em 5 dias) e a Selic terminaria em 12,25% (1,88% nos últimos 5 dias úteis).
O IPCA será conhecido dia 11, (5ª feira), mas o mercado agora, na pesquisa de 5 de janeiro, previu 4,47% (4,54% nas previsões dos últimos cinco dias úteis). O PIB será divulgado pelo IBGE em março, mas o mercado previu 2,92% (2,93% nos últimos cinco dias. A Selic fechou em 11,75% e o dólar em R$ 4,95%.
Para 2024 a mediana das previsões para o IPCA foi de 3,90% (3,83% nos últimos cinco dias úteis); o PIB deve crescer 1,59% (1,50% na mediana dos últimos cinco dias, número já previsto em fins de 2022): o dólar deve fechar dezembro a R$ 5,00.
Selic pode cair menos
A novidade foi o recuo nas previsões dos últimos cinco dias úteis sobre o nível final da Selic em 2024. A mediana apontou 9,00%, mas as previsões dos últimos cinco dias úteis, refletindo a Ata do Federal Reserve, que praticamente fechou a porta sobre a possibilidade do ciclo de redução de 0,75 ponto percentual dos juros nos Estados Unidos – atualmente na faixa de 5,25%-5,50% – se iniciar no 1º trimestre deste ano, elevaram a mediana para 9,25%. E isso motivou a revisão para baixo do PIB, de 1,59% para 1,50%.
IPCA cai forte no bimestre
Na minha visão, dado o maior grau de acerto nas previsões de curto prazo, o dado mais animador da Pesquisa Focus diz respeito a uma importante redução na inflação dos dois primeiros meses do ano. Todos os começos de ano têm pressão forte na inflação, com aumento do novo salário-mínimo e as mensalidades escolares de fevereiro.
Mas as previsões para 2024 projetam uma partida bem mais suave na inflação. Em 2022, quando o clima de tensão entre Rússia e Ucrânia (a invasão ocorreu no fim de fevereiro) assustava os agentes econômicos, o IPCA subiu 0,54% praticamente dobrando para 1,01% em fevereiro, com a pressão dos reajustes das mensalidades escolares. O IPCA acumulou alta de 2,24% no 1º bimestre de 2022 (os impactos da guerra entre Rússia e Ucrânia vieram a seguir).
Ano passado, o IPCA subiu 0,53% em janeiro (havia expectativa de repique dos preços com a reoneração – adiada para março e de forma escalonada – dos impostos reduzidos, eleitoralmente, de julho a 31 de dezembro de 2022, em combustíveis, energia elétrica e comunicações) e em fevereiro, a pressão da Educação, gerou alta de 0,84%, com índice de 1,57% no bimestre.
Pois, agora, o mercado está prevendo alta de 0,37% no IPCA de janeiro (alta de 0,40% nas previsões dos últimos cinco dias) e de 0,65% em fevereiro (0,67% nos últimos cinco dias úteis). Na pior das previsões, a inflação acumularia 1,07% nos dois primeiros meses deste ano. Uma redução de 0,50 ponto percentual frente a 2023 e de um ponto frente a 2022.
Só Milei despreza a China
A radiografia do saldo recorde de US$ 98,8 bilhões da balança comercial em 2023 mostra que só um louco como o presidente da Argentina, Javier Milei, pode desprezar a China como parceiro de negócios. Para países como Brasil e China, que têm escala industrial mínima diante do poderio chinês, dos Estados Unidos, da União Europeia, Japão e Coréia do Sul, o poder de compra da china de alimentos e commodities minerais, e agroindustriais é indispensável.
O aumento de US$ 27,3 bilhões frente ao saldo comercial de US$ 61,5 bilhões de 2022 pode ser creditado, em boa parte, à expansão, favorável ao Brasil, da corrente de comércio com a China. Em 2023 as exportações para a China, Hong Kong e Macau somaram US$ 105,751 bilhões, um aumento de US$ 14,980 bilhões sobre 2022. Liderada pela soja, a participação da China nas exportações saltou de 26,8% para 30,7%.
Já na conta das importações, as compras brasileiras da China recuaram US$ 7,647 bilhões para US$ 53,925 bilhões. Assim, só o saldo da balança comercial com a China garantiu, com um saldo bilateral favorável ao Brasil de US$ 22,627 bilhões, um quinhão de 82,89% do superávit comercial.
E, por ironia do destino, entre os três maiores parceiros comerciais do Brasil o único que gerou crescimento dos negócios para o Brasil foi a Argentina. Imagine, então, Milei querer cortar os laços da Argentina com o Brasil, o vizinho mais importante, e a China, seu maior cliente, como ocorre no Brasil.
GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)