A MORTE DO DELEGADO FLEURY : UMA QUEIMA DE ARQUIVOS

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A namorada de Fleury faleceu meses atrás, levando com ela sua história. Ainda há testemunhas vivas dessa tragédia na qual o mais implacável dos torturadores brasileiros foi enredado nas teias de uma paixão.

Sérgio Paranhos Fleury, o temido Delegado Fleury, atuou como delegado do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) de São Paulo durante a Ditadura Militar no Brasil. 

Fleury ficou conhecido por sua crueldade e sadismo. Ele era conhecido por usar métodos de tortura brutais, incluindo espancamentos, choques elétricos e afogamentos. Ele também foi acusado de ordenar assassinatos de opositores políticos.

Foi o principal responsável pela captura e morte do guerrilheiro comunista Carlos Marighella, em 1969. Ele também foi apontado como participante da Chacina da Lapa, em 1973, na qual 11 militantes políticos foram assassinados.

Fleury nasceu em Niterói, Rio de Janeiro, em 1933. Formou-se em direito em 1966 e logo foi recrutado pela ditadura militar para atuar no DOPS.

Fleury morreu em 1º de maio de 1979, aos 45 anos, em circunstâncias misteriosas. Na madrugada de 1º de maio de 1979, Fleury e sua mulher, Maria Isabel Oppido, estavam em uma lancha no litoral de Ilhabela, no litoral de São Paulo, quando o delegado caiu na água e se afogou.

O laudo da morte, assinado pelo médico-legista Harry Shibata, que fez fama por falsificar atestados de óbitos de vítimas da ditadura, atesta que Fleury morreu por afogamento seguido de parada cardíaca.

A versão oficial é a de que Fleury estava ajudando sua mulher a passar para outra lancha quando perdeu o equilíbrio e caiu na água. Ele teria sido arrastado por uma correnteza fraca e não conseguiu se salvar.

No entanto, alguns familiares e amigos de Fleury acreditam que ele foi assassinado. Eles apontam que Fleury era uma figura controversa e que tinha muitos inimigos. Além disso, dizem que o laudo da morte é inconclusivo e que não descarta a possibilidade de homicídio.

Outra versão é a de que Fleury cometeu suicídio. Essa versão é baseada no fato de que ele estava passando por problemas pessoais e profissionais. Fleury estava sendo investigado por corrupção e também estava enfrentando dificuldades em seu relacionamento com a mulher.

Um caso de amor

A provável causa da morte de Fleury foi escondida da história, pela direita – já que provavelmente foi assassinado por comandantes da repressão – e pela esquerda, devido a questões pessoais.

Na época, Fleury apaixonou-se por uma jovem advogada. Seria apenas um caso de amor não fosse a circunstância de que era irmã de um dos principais jornalistas da oposição à ditadura. A moça morava em um apartamento atrás da PUC de São Paulo. Uma de suas amigas era a teatróloga Leilah Assumpção.

Mantinham encontros clandestinos, por razões óbvias. Em determinado momento, Fleury decidiu dar o passo mais audacioso da sua vida: fugir do Brasil com a namorada. Chegaram a planejar a fuga em uma viagem do ditador brasileiro João Baptista Figueiredo ao Paraguai, na posse de Stroessner. A ideia era levar a namorada e, de lá, fugirem para algum país da Europa. Seria a maneira de escapar dos crimes pelos quais era acusado, de tortura à corrupção. Ainda mais que, sendo civil, não teria a blindagem que as Forças Armadas montaram para seus torturadores.

A morte ocorreu logo depois de planejarem a fuga, e antes da ida de Figueiredo ao Paraguai. A viagem de Figueiredo foi adiada, devido justamente à morte de Fleury e à situação política instável no Paraguai. Acabou ocorrendo um ano depois.

Alguns meses antes, foi assassinado o embaixador José Jobim, depois de ter comentado, em uma festa, as informações de que dispunha sobre a corrupção na construção da binacional usina de Itaipu. A morte foi tratada como suicídio. Na época, o presidente da Itaipu era o general Costa Cavalcanti – que o jornalista golberista Elio Gaspari costuma apresentar como símbolo da honestidade.

Quando a Comissão Nacional da Verdade (CNV) reconheceu o assassinato de Jobim, em 2014, ficou claro que o governo militar planejara uma série de queima de arquivos antes da abertura gradual planejada por Golbery.

A namorada de Fleury faleceu meses atrás, levando com ela sua história. Ainda há testemunhas vivas dessa tragédia na qual o mais implacável dos torturadores brasileiros foi enredado nas teias de uma paixão.

LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)

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