- O Imperador Dom Pedro II (1825 – 1891), cujo epíteto, com justiça, era O Magnânimo, foi um homem extraordinário e um monarca visionário. Nascido no berço esplêndido da Sereníssima Casa de Bragança, neto do impetuoso Dom João VI (1767 – 1826), O Clemente, e filho do revolucionário Dom Pedro (1798 – 1834), que cá é I, como O Libertador, e, na Metrópole, é IV, com o título de o Rei Soldado, Dom Pedro II foi, sem dúvida, um soberano à frente de seu tempo. Foi dele, inclusive, o primeiro projeto da Transposição do Rio São Francisco – que nasce na Serra da Canastra, em Minas Gerais, atravessa a Bahia, Sergipe e Alagoas. Ele sonhava em levar água aos imensos territórios áridos do Nordeste brasileiro – conforme lembrou, em novembro último, o Presidente Luis Inácio Lula da Silva.
- Foi de Dom Pedro II também a iniciativa de trazer para o Brasil os pioneiros libaneses, após visitar, em novembro de 1876, a Terra Santa, estendendo o périplo até a Síria e o Líbano – a antiga Fenícia. Já havia percorrido em 1871 o Egito. Cinco anos depois, curioso, foi de Jerusalém a Beirute. Escalou o sagrado e exuberante Mont Liban, montado numa égua branca, e o fértil Vale do Bekaa, onde se localizam as ruínas romanas de Baalbeck, grafada em Portugal como Balbeque, e a queridíssima Zahlè – principal cidade de maioria cristã do Oriente Médio, atualmente, com uma população de quase 300 mil habitantes.
- Debruçada sobre o Bekaa e banhada pelo Rio Bardauni, Zahlè é famosa por suas criações gastronômicas, nas quais se destacam o quibe e o tabule, e uma bebida destilada em seu meio rural, o arak, aguardente de uva aromatizada com anis. Foi junto aos generosos anfitriões, degustando o tradicional mezzé, um conjunto de pratos de entrada, no qual se sobressai o quibe cru, acompanhado de arak, que Dom Pedro II teve o impulso de convidar para emigrar ao Brasil os libaneses cristãos, vítimas, ontem como hoje, da intolerância islâmica.
- Calcula-se que, passados 147 anos, vivam em todo o País algo como oito milhões de libaneses e descendentes – quase a totalidade cristã. Eu sou um deles. Meu avô materno, o zahliota Aziz Rabay, de origem húngara, chegou ao Brasil nos anos 1910 – seguindo o roteiro de conterrâneos que foram convencidos pelo Imperador a deixar a Pátria dos Cedros e ir para Novo Mundo. Famílias inteiras de Zahlè vieram para cá, dentre as quais, estão nossos primos de sobrenomes Skaff e Duailibi.
- Determinante, para a decisão de abrir os portos aos libaneses, foi seu encontro com o Patriarca da Igreja Maronita, o Beatíssimo Paul Boutros Massad (pontífice de 1854 a 1890), de rito Católico Romano, na sede de Bkerk, nas encostas do Monte Líbano. O Patriarca narrou as agruras e perseguições sofridas pelos cristãos no País dos Cedros – e ainda na Síria e no Egito, ampliando-se às demais nações, não apenas às de língua árabe, porém, em todas nas quais os muçulmanos conseguem impor os rigores maometanos da charia – como Indonésia, Paquistão e Irã.
- O soberano brasileiro ficou comovido. Muitos acreditam, sinceramente, como eu, que existência do Líbano, com identidade cristã, se deve, essencialmente, à resistência dos maronitas à hegemonia islâmica – ao longo de 1.300 anos. Os libaneses, vindos de uma pequena nação do Oriente Médio, que conta com cerca de três milhões de habitantes, se estabeleceriam em todas as regiões do Brasil. Nem Dom Pedro II poderia imaginar que acabaria por persuadir tantos libaneses a vir para seu Império. Hoje, surpreendentemente, há mais libaneses e descendentes, aqui, do que no próprio Líbano.
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ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)
Albino Castro é jornalista e historiador