O jornalista judeu perseguido por judeus será bem recebido no clube de Porto Alegre criado pelos que não temiam cara feia
Há um espaço histórico em Porto Alegre que os detratores de Breno Altman deveriam conhecer. Alguns deles já conhecem ou pelo menos sabem da sua existência.
É um lugar criado por judeus que se organizaram para conviver e acolher e propagar arte e cultura. Um espaço que foi recebendo gente de todas as etnias e religiões, até se consagrar como um reduto da diversidade e das liberdades.
Um lugar criado em 1950 e que, saiba Altman, chamava artistas e pensadores para que dissessem o que tinham a dizer, e não para censurá-los.
Depois de 64, esse lugar foi oferecido a quem defendia jornalistas e todos os perseguidos pela ditadura. Abriam o lugar a resistentes de todas as áreas, célebres ou anônimos.
Ofereciam o palco e chamavam públicos, porque a bravura deles era maior do que os temores naturais da época de perseguições, mordaças, torturas e mortes.
Eram os judeus criadores e continuadores do Clube de Cultura, do Bom Fim, o reduto histórico dos judeus progressistas de Porto Alegre, hoje com certeza o bairro mais alegre da cidade. O clube continua vivo, depois de um período de calmaria.
Palestraram em seu auditório sempre lotado Vinicius de Moraes, Erico Verissimo, Barão de Itararé, Graciliano Ramos, Jorge Amado, Dyonélio Machado.
Foram exibidas em seu palco peças clássicas pelo grupo do próprio clube e por trupes de todo o Brasil. O clube tinha um coral. Fazia exposições de Carlos Scliar, Danúbio Gonçalves, Vasco Prado. Mantinha oficina de cinema.
Frequentaram e frequentam a caverna de resistência e arte da Rua Ramiro Barcellos celebridades da cultura e também políticos, mas a maioria sempre foi de gente sem fama engajada à luta pelo direito de fazer arte, pensar e falar.
Breno Altman com certeza gostaria de conhecer a história dos Baumann, Dorfman, Scliar, Franck, Schwartz, Rotemberg, Wart, Zaslavski, Kreitchman, Kassow, algumas das famílias dos criadores do Clube de Cultura.
Para saber por que e como defendiam as liberdades e ouvir os relatos de Cesar Dorfman e Carolina Baumann, herdeiros dos fundadores, que se encarregam de levar essa história adiante.
Na semana passada, estavam nas paredes do clube desenhos de alguns dos maiores cartunistas gaúchos, que comemoravam os três anos da ressurreição do Grifo, um jornal que enfrenta o fascismo com humor.
Carolina e Dorfman estavam lá no espaço que resistiu até às pressões para que fosse transformado em garagem, mesmo que tenha sido tombado pelo município como patrimônio cultural.
Saiba, Altman, que os expositores das charges e os que foram ver seus trabalhos e ouvi-los são, claro, contra a matança em Gaza e contra o governo fascista de Israel, e muitos também são observados por caras feias.
É simbólico que tenham exposto seus desenhos no espaço criado por judeus do Bom Fim, o bairro de Moacyr Scliar e por onde andavam seus personagens judeus.
Breno Altman está convidado pela Grafar, que edita o Grifo, a conhecer esse lugar. Eu, como infiltrado no Grifo, faço o convite, e sem pedir licença a Carolina e a Dorfman.
Venha falar em voz alta no Clube de Cultura, Breno Altman, como faziam no tempo da ditadura, agora sob a proteção da memória dos judeus que não temiam os fascistas do século 20.
MOISÉS MENDES ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)