A PETROBRAS RETOMA OS INVESTIMENTOS

CHARGE DE DUKE

Toda companhia de petróleo baliza seus planos quinquenais de investimentos (Planos Estratégicos) em duas premissas básicas: variação do preço do barril (Brent) e da taxa de câmbio no período. Como o barril é cotado em dólar, as contas são feitas em dólar. Mergulhando nos PEs da Petrobras nas duas últimas décadas, a previsão de investimentos de US$ 102 bilhões no período 2024-2028 cresce 31% sobre os US$ 78 bilhões de 2023-27. Mas é bem inferior aos US$ 236,5 bilhões do período 2012-2016 (apresentado pela presidente Graça Foster) ou em relação aos US$ 74,5 bilhões para 2018-2022 (feito na gestão Pedro Parente, no governo Temer).

Há dois parâmetros do Plano Estratégico 2024-2028, que pretende gerar 280 mil empregos anuais, diretos e indiretos, nos próximos cinco anos. No total, US$ 102 bilhões. Nas inversões já detalhadas elas somam US$ 91 bilhões, o que representa aumento de 16,66% sobre o PE 2023-2027, o último elaborado no governo Bolsonaro. A diferença de US$ 11 bilhões envolve projetos de transição energética e descarbonização em avaliação (metodologia usada nos PEs). No último PE, esses investimentos eram de apenas US$ 4,4 bilhões.

O avanço dos novos investimentos pode ser medido na alocação para Exploração e Produção de petróleo e gás, que saltou de US$ 68 bilhões no PE 2023-2027, sendo 64% destinados ao pré-sal, para US$ 73 bilhões no PE 2024-2028 (+7,35%), com elevação para 67% na fatia do pré-sal. A companhia deve investir US$ 7,5 bilhões em projetos de exploração no período, sendo US$ 3,1 bilhões na Margem Equatorial; US$ 3,1 bilhões nas Bacias do Sudeste; US$ 1,3 bilhão em outros países, incluindo a perfuração de cerca de 50 poços em direito de exploração em blocos já adquiridos na Colômbia.

Como disse o presidente Jean Paul Prates, os investimentos nas áreas que sempre foram mais rentáveis na companhia: a produção – que se vale de baixos custos da exploração do pré-sal (com o barril do tipo Brent cotado até US$ 25) dá para sustentar, de forma confortável, investimentos; e o refino, vão permitir à companhia manter o petróleo e gás como “driver” principal, enquanto financia a transição energética justa. A expansão da capacidade do Gás e Energia, Refino e Logística, além da alta capacidade de inovação da Petrobras e os objetivos claros de diversidade e inclusão na empresa completam o plano.

Guinada no refino

Enquanto mantém o leme voltado à exploração das potencialidades do pré-sal, na Bacia de Santos, e na revitalização da Bacia de Campos, que terá mudança nos métodos de extração e produção, com o descomissionamento (e descarbonização) de dezenas de plataformas, substituídas por FPSOs – 10 navios dos 14 previstos já estão contratados, para separar água, gás e óleo extraídos e estocar de 150 mil a 225 mil barris/dia para posterior transferência a navios aliviadores -, a Petrobras fará a retomada da expansão do parque de refino em 225 mil barris/dia. Com a adição crescente de biodiesel na produção do Diesel-S10 (menos poluente), haverá expansão das linhas de refino e de tancagem e mistura dos teores do biodiesel (provenientes de oleaginosas e sebo bovino), serão mais 290mbd até 2030. Algumas refinarias terão investimentos para produzir querosene de aviação menos poluente.

Trata-se de guinada de 180 graus. O governo Bolsonaro forçou a Petrobras a vender 50% do seu parque de refino, limitado às refinarias do Rio (Reduc e Gaslub) e São Paulo (Replan, a maior, de Paulínia; a Presidente Bernardes, Cubatão; a Revap, do Vale do Paraíba; e a Capuava). Tudo para a privatização da companhia. A adoção do PPI (paridade de preços internacionais) induzia o país a refinar menos o óleo (mais leve) do pré-sal e exportá-lo em bruto e importar óleo derivados, transferindo renda, divisas e empregos para fora.

Foram postas à venda as refinarias Alberto Pasqualini (RS), Presidente Vargas (PR), Gabriel Passos (MG), Landulpho Alves (BA), do Nordeste (PE), Guamaré (RN), e Isaac Sabbá (AM). A Sabbá e a pioneira Landulpho Alves, que refinava 330 mil barris diários, foram as únicas vendidas (esta ao fundo Mubadala, dos Emirados Árabes Unidos).

Na campanha, Lula prometeu “abrasileirar” os preços dos combustíveis, com uso mais intenso do petróleo do pré-sal nas refinarias da companhia. Isso levou à utilização recorde de 96% da capacidade de refino no 3º trimestre. E a demanda recomendou novos investimentos em quase todas as refinarias para a sua adaptação às novas necessidades de demanda e da descarbonização.

O parque de refino do país foi feito entre os anos 50 e 70, quando a produção própria não chegava a 15% do consumo (1973, quando estouro a 1ª crise do petróleo). Usava-se os óleos do tipo leve (do Oriente Médio – Arábia Saudita, Iraque, Irã. Kuwait, Catar e Argélia). Por isso, quando se descobriu petróleo na Bacia de Campos (1974), com extração a partir de 1999, o petróleo do tipo mais pesado não podia ser processado nas refinarias. O Brasil exportava óleo (com desconto ante o Brent) e importava outros óleos leves e derivados.

Quando se começou a produzir petróleo, mais leve do pré-sal (na metade dos anos 2010) foi possível se projetar no país uma nova refinaria, a do Nordeste (PE) capaz de extrair o máximo de diesel (70%) no refino. O diesel é o combustível de maior consumo do país, o que excede a capacidade de fracionamento dos combustíveis no desempenho das atuais refinarias.

Além da ampliação da capacidade das refinarias (a RNest terá sua 2ª etapa concluída) e no caso do Rio, em vez da Reduc, a expansão será feita na vasta área da Gaslub, em Itaboraí, onde seria erguido o Comperj (Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro), que terá em 2024 a operação da Rota 3, do gás das bacias de Campos e de Santos, processado no complexo.

Alguns planos marcantes

Em todos os Planos Estratégicos é importante ver do pano de fundo da economia doméstica e da global (´trajetória de crescimento das economias e dos preços do Brent). Recorri aos planos de Graça Fortes e Pedro Parente porque foram pontos de guinadas importantes na Petrobras. Em fevereiro de 2012 houve troca na presidência da companhia. Graça Foster, que comandava a área de gás e energia substituiu a José Sérgio Gabrieli, ex-diretor financeiro, que assumira a Petrobras em 2005. Foi na gestão Gabrieli que a Petrobras descobriu o pré-sal (2006, mas só veio a produzir após 2013).

Como a economia mundial vinha crescendo acima de 4% ao ano e o dólar estava cotado a menos de R$ 3, enquanto o barril de petróleo entrava numa escalada de alta do barril que só foi interrompida pela crise financeira mundial de agosto de 2008 – em julho de 2008 o barril do Brent chegou a US$ 160 nos contratos futuros e a previsão era de que superaria os US$ 200 do final da década de 10 para a atual.

Em função disso e do deslanche do Programa de Aceleração do Crescimento (o PAC tratou de reunir sob o guarda-chuva do governo federal todas as obras mesmo feitas em parceria de financiamentos de bancos federais para estados, prefeituras ou estatais, que pudessem ter o selo do governo federal, os investimentos da Petrobras e de outros entes estatais foram engordar o PAC, a Petrobras resolveu abraçar o mundo com ambicioso programa de investimentos. O 1º a malograr (devido à crise financeira mundial de 2008, que travou o mercado de crédito internacional e o financiamento a projetos de longo prazo) e derrubou as cotações do petróleo a menos de US$ 40, foi o Comperj.

Cito o Comperj (e problemas posteriores em vários projetos da Petrobras em refino, fertilizantes, oferta de gás natural e do próprio aumento da produção de petróleo gás, então concentrada na Bacia de Campos, que dava sinais de declínio na produção) para rebater a visão estreita de que os problemas de endividamento e perdas da Petrobras decorram dos desvios apontados na Lava-Jato. Eles pesaram, claro. Mas o que afetou a Petrobras foi que a realidade da cotação do dólar atingiu, em 2015, o dobro do estava previsto, e o barril caiu mais de 50% abaixo (o pré-sal de lá e da Bacia de Santos, salvaram a estatal, depois de pesadas baixas nos investimentos que ficaram inviáveis; assim a companhia agora mira na Margem Equatorial para compensar a desaceleração prevista do pré-sal com o encontro de novas províncias para ajustar produção e consumo às mudanças da matriz energética)

Faço a observação sobre o PAC porque um dos embates entre a direção da Petrobras e a Casa Civil, que comanda pelo ministro Rui Costa o novo PAC e queria forçar a Petrobras a acelerar os projetos que pudessem gerar mais empregos e inaugurações em prazos mais curtos. Infelizmente, projetos de modernização de refinarias, de exploração de novos campos de petróleo exigem longo tempo de maturação. E tudo está sujeito às bruscas mudanças do cenário. O valor do dólar (maior hoje do que há 10/15 anos atrás é que explica por que o PE de Graça Foster para 2012-2016 (com US$ 236,5 bilhões) previa o dobro dos investimentos que o atual. Difícil é cumprir as metas.

Desvio da meta

Vale lembrar que quando Graça Foster, indicada pela presidente Dilma substituir Gabrieli, a nova presidente da Petrobras bateu duro nos desvios de metas. Ela lembrou, num Power Point, que no “Plano Estratégico 1999, a meta de produção para 2005 era de 1.850 mbpd; que no PE 2001, a meta de produção para 2005 era de 1.900 mbpd; e que em 2005, a produção efetiva foi de 1.684 mbpd devido a atrasos na P-43, P-48 e P-50”.

Enquanto tentava revitalizar a produção da Bacia de Campos, Foster ainda bateu duro nos atrasos de até mais de 500 dias na entrega das plataformas feitas no exterior para a exploração de petróleo do pré-sal. Era a justificativa para a construção dos novos estaleiros (no Sul, ES, Bahia e Pernambuco) que iriam atender às novas plataformas do pré-sal. Os planos de Graça também não se cumpriram e ela deixou a presidência em fevereiro de 2015.

Pelo menos, agora, graças ao pré-sal a produção total da Petrobras já supera os 3 milhões de barris/dia, 78% do pré-sal.

Mercado quer saber de dividendos

A arquitetura do Plano Estratégico foi examinada pelo mercado financeiro. Mas o que pesou na baixa inicial desta manhã para as ações da Petrobras foi a leitura de que os dividendos a serem distribuídos seriam afetados pelos planos de investimento. Após a apresentação do Plano pelo presidente Jean Paul Prates e a diretoria da Petrobra,s as ações fecharam o dia com alta de 0,28%. Não foi um mau resultado, já que o Ibovespa caiu 0,84%.

Na apresentação, a com base em suas premissas macroeconômicas, a empresa disse esperar que os pagamentos nos próximos anos totalizem US$ 40-45 bilhões (em comparação com US$ 65-70 bilhões do plano anterior), o que pode incluir recompra de ações, com potencial para mais US$ 5-10 bilhões de dividendos extraordinários.

GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)

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