A LÍNGUA VIVA DE DONA LEOPOLDINA

Uma das princesas herdeiras da vienense Casa dos três Felipes de Habsburgo, soberanos, nos séculos XVI e XVII, das Espanhas e do grandioso Império Português, por sua vez, descendentes do Bem-Aventurado monarca lusitano Dom Manuel I (1469 – 1521), a Imperatriz Dona Leopoldina (1797 – 1826), esposa do Imperador Dom Pedro I (1798 – 1834), O Libertador, teve uma influência determinante para a Independência do Brasil, ao incentivar o marido a declarar guerra contra o irmão Dom Miguel I (1802 – 1866), O Absolutista, que reinava em Portugal.

Foi também a irrequieta Habsburgo a estimular a emigração para o Brasil de várias populações de língua alemã, a partir de 1824, depois do empobrecimento, com os conflitos napoleônicos, de diversas regiões do Sacro Império Romano Germânico. Desembarcariam aqui, até meados do século XX, milhares e milhares de germânicos – data a ser comemorada no próximo ano com o Bicentenário da Imigração Alemã. Instalaram-se em diferentes pontos, como italianos e libaneses, porém, em menor quantidade. Criaram fortes raízes, sobretudo, no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Espírito Santo.

Como a família de minha querida esposa, Dona Andrea Wolffenbüttel, nascida no Rio de Janeiro, jornalista, como eu e o meu sogro, o escritor gaúcho Fausto Wolff (1940 – 2008). Esses valorosos povos, trazidos por Dona Leopoldina, ajudaram na árdua tarefa de construir a nova nação e, hoje, curiosamente, o segundo idioma mais falado em todo o País é o alemão – de acordo com levantamento da universidade americana Olivet Nazarene, do Illinois. E não o espanhol, inglês ou italiano.        

Mais curioso ainda porque sabemos que o Brasil esteve por 60 anos (1580 a 1640) sob a Coroa de Madri, com os Habsburgo filipinos, e, atualmente, é um dos líderes do bloco de países de habla castelhana integrantes do Mercosul – ao lado de Argentina, Uruguai e Paraguai. Um precioso trabalho do magistral mestre da Sociologia da História, o erudito pernambucano Gilberto Freyre (1900 – 1987), publicado postumamente, em 1988, tem como título “Nós e a Europa Germânica” – e mostra o quanto, inclusive no Nordeste, em pleno século XIX, os alemães tiveram um papel importantíssimo na vida cotidiana da região.

O autor ressalta a habilidade de seus artesãos, àquela época, na marcenaria, fabricantes, principalmente, de pianos e móveis domésticos – como cadeiras de braço, camas de casal e guarda-louças. Ao contrário, no Espírito Santo e nos estados ao Sul, os teutos se dedicaram mais à agricultura e, provavelmente, assim, preservaram a língua em comunidades que viveram profundamente isoladas, de uma certa maneira, do resto do País.

Foi somente no período final do regime de Getúlio Vargas (1882 – 1954), em 1943, com a entrada do Brasil na Segunda Guerra (1940 – 1945), que as inúmeras colônias germânicas foram obrigadas a estabelecerem escolas em português para formação das crianças. O meu sogro, por exemplo, só seria alfabetizado aos 12 anos no idioma de Luis de Camões (1524 – 1580). Até então expressava-se, exclusivamente, na língua do romântico Johann Wolfgang von Goethe (1749 – 1832).   

Já nos Estados Unidos o alemão quase se tornou oficial, pouco após a Independência, em 1776, em um plebiscito, no qual o inglês foi vencedor com uma pequena margem de vantagem. Foi quando ficou consagrado que o vernáculo do país será sempre o falado pela maioria de sua população. E, por isso, hoje, devido à intensa presença dos imigrantes ‘hispanos’, originários da América Latina, o espanhol, é, também, o idioma oficial em estados como a Califórnia, Texas e Florida. O mesmo poderá acontecer cá, com a popularização do castelhano, e a língua da Dona Leopoldina deixar de ser a segunda do imenso Brasil independente criado por ela e seu marido.  

ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)

Albino Castro é jornalista e historiador

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *