Maior banco privado do país, o Itaú acaba de revisar suas projeções, em 13 de setembro, para a economia brasileira em 2023 e 2024. Para quem previa até novembro de 2022 alta de apenas 0,7% no PIB deste ano, projeção revista em dezembro para 0,9%, a nova elevação da projeção do PIB, de 2,5% para 2,9%, (e o de 2024, de 1,5% para 1,8%) serve de amostragem dos erros cometidos pelos agentes econômicos nestes primeiros nove meses do governo Lula, que vai derrubando, mês a mês, as piores projeções do mercado.
Vale ressaltar que boa parte dos erros do mercado, quanto ao desempenho do PIB (foi maior), da inflação (está menor) e, em consequência, do nível da taxa Selic (também menor) que seriam adotadas pelo Comitê de Política Monetária Banco Central (Copom) para tentar encaminhar a inflação para o estreito nível das metas deste ano (3,25% de inflação + tolerância de 1,50% = 4,75%), decorre das próprias projeções do Copom nos Relatórios Trimestrais de Inflação, divulgados ao fim de cada trimestre. O do 3º trimestre sai dia 28.
Em 15 de dezembro, no último RTI de 2022, o Banco Central, que em setembro previra que o IPCA de 2022 fecharia dezembro em 5,8%, elevou a projeção para 6% (errou 2,1 ponto percentual, deu 5,79%, praticamente o que previra em setembro). Já a previsão para 2023 era de um IPCA de 5,0%. Os Departamentos Econômicos dos bancos, os institutos de pesquisas e as empresas de consultoria, além de fazer modelos de acompanhamento de preços e de produção e emprego semelhantes aos do IBGE, procuram seguir a metodologia do Copom para projetar a trajetória das taxas Selic.
Nelson Rodrigues, quando queria defender seu Fluminense por um gol anulado por impedimento (não havia o VAR, apenas o vídeo-tape da jogada, com o “frame” indicando o impedimento sem a atual projeção, que traça linhas e define diferenças por milímetros) tinha duas respostas quando o VT desmontava sua peroração: 1 –“o vídeo tape é burro” [de certa forma, antecipava a necessidade de visão tridimensional do VAR]; 2- quando o VT confirmava o claro impedimento, reagia, com muxoxo: “pior para os fatos”.
O pensamento do Copom
No caso do Itaú, por coincidência, é o banco brasileiro que mais acumula ex-integrantes do Copom em seus quadros. O atual economista-chefe do Departamento de Estudos Macroeconômicos do Itaú, Mário Mesquita, foi diretor de Política Monetária na presidência de Ilan Goldfajn, no governo Temer (maio de 2016 a dezembro de 2018). E o diretor de Política Monetária do Banco Central, Bruno Serra (que esteve à frente do Copom desde janeiro de 2019). Também veio do Itaú, para onde voltou após a quarentena. Também foi quadro do Itaú o atual diretor de Política Econômica, Diogo Guillen, no cargo desde abril de 2022, com término em 31 de dezembro de 2025.
O presidente Roberto Campos Neto, é oriundo do Santander, onde era diretor de Tesouraria para toda a América Latina até dezembro de 2018. A economista Ana Paula Vescovi, que foi secretária do Tesouro Nacional no governo Temer, comanda desde 2019 o departamento de Estudos Econômicos do Santander.
O atual diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo, que era secretário-executivo do Ministério da Fazenda, veio com duplo pensamento: de quem ajudou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a elaborar o arcabouço fiscal e os planos econômicos do governo Lula, e de quem veio da experiência de mercado no comando de um banco de porte médio, o Fator.
Galípolo pode mudar Copom?
Ao fazer a revisão mensal de setembro em suas previsões do IPCA para 2023 (que voltou a cair para 4,9%, após subir para 5,1% em agosto) e 2024 (reduzida de 4,3% para 4,1%), o Itaú passou a considerar a possibilidade de o Copom acelerar na última reunião do ano (12 e 13 de dezembro) o ritmo de baixa dos juros, passando a adotar o patamar de 0,75 ponto percentual, frente ao de 0,50 p.p inaugurado em 2 de agosto, quando a Selic caiu de 13,75% para 13,25%, e que seria mantido em 20 de setembro e 1º de novembro.
Na minha modesta opinião e de 99% dos agentes econômicos não ligados ao mercado financeiro – os empresários da indústria e do comércio que estão com estoques encalhados, devido à retração dos consumidores, endividados e que aguardam juros mais baixos para fazerem comprar – e as famílias endividadas, apesar do socorro exitoso do Desenrola, não faz o menor sentido baixar os juros em 0,75 p.p. em 12 de dezembro, fazendo a Selic fechar o ano em 11,50% e não em 11,75%, como previra em agosto. Para 2024, a taxa é de 9%.
Como se sabe, os juros sobem pelo elevador no sistema financeiro. Qualquer ruído em relação à inflação é pretexto para elevação dos juros (a taxa Selic é apenas o piso do mercado, na média, o mercado opera com o dobro ou o triplo da Selic, com juros que passam dos 400% no cheque especial e no rotativo do cartão de crédito. Quando a conjuntura é de baixa, liderada pelas decisões do Copom, a redução dos juros se dá pela escada (e de forma forçada, como se verifica nas periódicas reduções induzidas pelo INSS no crédito consignado para os aposentados).
Se formos aguardar dezembro para baixar os juros, o comércio e a indústria terão perdido pelo menos um trimestre (justamente o melhor do ano) para incrementar as vendas. Seria o mesmo que os bombeiros atrasarem tanto para combater o incêndio, que quando chegarem no local da tragédia só restaria o trabalho de rescaldo e da perícia da própria imperícia. Por isso, espera-se que o diretor Gabriel Galípolo estimule o Copom a antecipar o ritmo de baixa da Selic já agora neste mês de setembro, para estimular as vendas no Dia das Crianças (12 de outubro), na “Black Friday” e no Natal. Baixar a Selic em 12 de dezembro não ajudará a indústria a receber mais pedidos do comércio. E ao comércio, só poderá facilitar um pequeno escoamento de estoques.
PIB cai 0,2% no 3º tri e sobe 0,3% no 4º
Além de revisar para cima o PIB e a inflação para baixo, o Itaú considera que o “consumo das famílias deve continuar impulsionando o crescimento da economia, em meio à resiliência do mercado de trabalho”. Para a taxa de desemprego, o banco manteve a projeção de 8% para 2023 e 2024.
O banco observou que a “aprovação e implementação das medidas de recomposição das receitas é fundamental ao sucesso do arcabouço fiscal e da trajetória prometida de convergência do resultado primário” [neste caso, a antecipação dos cortes mais acelerados da Selic daria uma ajuda crucial, pois o Itaú, considerando uma retração na agropecuária neste 3º trimestre, espera queda de 0,2% no PIB].
Excluído o setor agropecuário, haveria crescimento de 0,2% no 3º trimestre. Para o período de outubro a dezembro, o Itaú espera avanço de 0,3%. Que poderia ser maior nos dois trimestres, com juros mais baixos e ainda estimular a reposição de estoques no início de 2024.
O Itaú prevê ainda déficits primários de 1,0% do PIB em 2023 e de 0,8% em 2024 e dívida bruta em 75% e 78% do PIB para os dois respectivos anos.
A título de lembrança, o Copom previa, em dezembro do ano passado, IPCA de 6,00%, com “retorno da tributação federal sobre combustíveis em 2023”, PIB de 1% e que a taxa Selic seria reduzida a 11,75% em dezembro de 2023.
Copom induz o mercado
Muitas vezes, as previsões pessimistas do Copom (além de levá-lo a operar na retranca, prevendo cenário mais desafiador e a manter os juros mais elevados que o recomendável), induzem o próprio mercado a previsões negativistas. Após o RTI de 15 de dezembro e das previsões negativas de Diogo Guillen, em coletiva no mesmo dia, o último Relatório Focus de 2022 (30 de dezembro), elevou a inflação para, 5,31% (5,45% nas previsões dos últimos cinco dias úteis) e estimou a Selic em 12,25% em dezembro de 2023 (11,88% nos últimos cinco dias), com alta de apenas 1% no PIN.
Assim, o Itaú já previa em dezembro (seus cenários mensais antecedem o RTI) inflação de 5,6%, PIB de só 0,7% e Selic de 12,50%. Em janeiro, começou a alterar e não parou mais de ser surpreendido pelos fatos, como o Copom. Em maio, o Itaú fez duas previsões de IPCA: 6,3%, depois reduzida a 5,8%. Em junho, reduziu i IPCA de 5,6% a 5,3% e deu um salto na previsão do PIB, mas só previu maior queda da Selic em julho.
GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)