QUANDO A INDÚSTRIA VAI REAGIR ?

CHARGE DE ZÉ DASSILVA

O Comitê de Política Monetária (Copom) inicia hoje dois dias de reuniões para decidir o tamanho e a trajetória futura da taxa básica de juros da economia (taxa Selic, que está em 13,75% ao ano desde 3 de agosto de 2022). Por coincidência, o IBGE divulgou hoje o resultado da indústria em junho, com pequeno avanço de 0,1% sobre maio, que registrara forte aumento, puxado pela produção da indústria automobilística, para aproveitar a janela de oportunidade do incentivo fiscal temporário do governo.

Ao analisar “a leve expansão industrial em junho”, o Itaú, considera que a produção industrial teria expendido 0,4% no 2º trimestre deste ano (com avanço de 2,7% na mineração e crescimento zero na manufatura). Mas o resultado representa um carrego estatístico da produção industrial de =),2% para o 3º trimestre (sendo mineração: +2,4%; manufatura: -0,1%). E a previsão do Itaú para o PIB do 2º trimestre foi mantida em 0,3% na variação trimestral com ajuste sazonal. Para os “próximos meses” o Itaú espera “relativa estabilidade”.

Sem apoio, carros desaceleram

Os dados mostram forte desaceleração da produção de veículos motores e carrocerias, que após avanço de 7,4% em maio, teve retração de 0,1%, passado o efeito do incentivo fiscal que esgotou no 1º mês de vigência. Mas a produção teve ligeiro avanço devido ao processamento das safras agrícolas (moagem de cana de açúcar e de soja) e do bom desempenho das indústrias extrativas (petróleo e gás e minério de ferro), que cresceram 2,9% sobre maio.

Os dados do 1º semestre são inequívocos: ao recuar 0,3% de janeiro a junho, a produção industrial nacional permaneceu com taxa negativa, mas reduziu a perda frente ao fechamento dos quatro primeiros meses de 2023, quando havia recuado 1%. Ainda assim, o desempenho foi desigual. Segmentos que dependem menos do crédito para a venda na ponta do consumo (como os bens de maior valor, que dependem de financiamento) estiveram travados, mas os bens intermediários (cujo beneficiamento é voltado ao mercado interno ou à exportação) tiveram algum dinamismo, mas ainda fecharam o semestre com queda de 0,5%, após recuo de 2,1% de janeiro a abril.

No semestre, o setor extrativo (à frente o petróleo e o minério de ferro, ambos destinados à exportação ou ao maior uso no refino da Petrobras, em substituição às importações, devido à nova política de preços dos combustíveis, que abre mais espaço para o uso das refinarias (em junho a estatal bateu o recorde de utilização da capacidade instalada, com 93%).

Segundo o analista da Pesquisa Industrial do IBGE, André Macedo, o processamento das safras e a demanda das exportações/substituição de importações foram os vetores da produção industrial. O analista destacou a importância dos produtos alimentares, liderados pelo açúcar e os itens derivados da soja; e os derivados do petróleo. As demais categorias ficaram travadas pelas taxas de juros do Banco Central.

Os dados de junho são frustrantes, na medida em que indicam esmorecimento da recuperação de maior. A Indústria Geral, que tinha apresentado variação positiva de 43,9% em maio, recuou para 41,7%. A queda foi mais expressiva nos bens de consumo duráveis (categoria que abarca os automóveis): após acelerarem 57,1% em maio, só 37,1% do segmento teve crescimento. Nos bens de consumo semi duráveis e não duráveis o recuo foi de 44,2% para 39,2%.

Nos bens intermediários, também houve encolha de 44,3% em maio para 42,7%. Vale ressaltar que, com o fim do pico do processamento da safra agrícola, este segmento tende a desacelerar naturalmente. Ainda haverá no 2º semestre impactos do beneficiamento de café e das safras de milho (2ª safra) e algodão, ambos plantados no Centro-Oeste e no Oeste da Bahia e no Matopiba, após a colheita da soja. Mas o peso grande é da soja.

O único alento foi o avanço em bens de capital (em parte causado pelos estímulos do BNDES à modernização da frota de caminhões a juros mais baixos), que teve aceleração de 38,4% do universo do segmento em maio para 42,4% do segmento com alta em junho.

Tudo depende dos juros

Por isso, o Copom tem grande responsabilidade em analisar os dados da economia. Um fato ocorrido no outro lado do mundo, na Austrália – uma das subsedes da Copa do Mundo de Futebol Feminino da Fifa, pode funcionar como um recado ao Banco Central do Brasil.

Na semana seguinte às decisões do Fed e do Banco Central Europeu de promoverem uma rodada de aumento de 0,25 ponto percentual nos juros básicos do dólar (para a faixa de 5,25%-5,50% ao ano) e do euro (para 3,75% ao ano) o Banco Central da Austrália decidiu manter a taxa básica de juros inalterada, surpreendendo expectativas do mercado, que esperava uma alta.

No Brasil, as apostas se dividem entre a corrente majoritária que considera que o Banco Central será cauteloso e manterá a parcimônia já anunciada para início do ciclo de baixa de 0,25 p.p. de 13,75% para 13,50% ao ano.

O mais interessante será o embate entre os dois novos membros do Copom, o ex-secretário executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, que assumiu a diretoria de Política Monetária (acumulada desde março por Diogo Guillem, com a diretoria de Política Econômica) e o funcionário do BC, Ailton Aquino, que assume a Fiscalização, com a marca de ser o 1º diretor negro da instituição desde sua criação em 31 de dezembro de 1964. Eu já teria reduzido em 0,50% desde junho.

Um dado que chama a atenção nos segmentos industriais foi a aparente reação da indústria de vestuário e calçados. Terá sido uma resposta às restrições do governo à liberdade de importação sem taxas de bens até US$ 50 (válido entre pessoas físicas), que forçaram a Shein e Shopee e outros sites asiáticos a procurarem parceiros no mercado doméstico. A conferir. Na verdade, a maioria dos setores mal reagiu aos impactos negativos da pandemia da Covid-19, em 2022, que foi travada pelos juros do Banco Central.

Macaque in the trees
. (Foto: OLM)

GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)

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