OS FATOS ENQUADRARAM ARTHIR LIRA; MAS, VIÉS COLABORATIVO É TEMPORÁRIO

CHARGE DE MIGUEL PAIVA

“Acossado por investigação, o presidente da Câmara esforça-se em gestos para agradar ao Governo e ao mercado financeiro”, escreve Costa Pinto

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), antecipou para domingo a reunião de líderes tradicionalmente marcada para as manhãs das terças-feiras e anunciou de pronto a pauta e o motivo da convocação. A pauta de 3 pontos: votação terminativa das novas regras fiscais (vulgo “arcabouço fiscal) depois dos ajustes feitos no Senado, votação em plenário da Proposta de Emenda Constitucional da Reforma Tributária e acordo em torno do Projeto de Lei que institui novas regras de funcionamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). O motivo da antecipação: mostrar boa vontade e sintonia para com o Palácio do Planalto e a agenda econômica que vem sendo sofisticadamente conduzida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com o auxílio luxuoso do vice-presidente Geraldo Alckmin e da ministra do Planejamento Simone Tebet.

Lira deseja iniciar o festival de gestos positivos direcionados ao Governo restituindo o chamado “voto de qualidade” à Receita Federal nos julgamentos do Carf. A regra, que permite aos auditores da Receita darem a última palavra em caso de empate nos contenciosos do Conselho, foi desfeita por uma canetada do ex-presidente Jair Bolsonaro e resultou em prejuízos ao Fisco no combate à sonegação de impostos. Por ordem do presidente Lula, o ministro Haddad quer restaurar a força do Estado, por meio da autoridade da Receita, com a volta do voto de qualidade nos julgamentos do Carf. O Projeto de Lei será aprovado. Depois dele, a Câmara encerra a tramitação e votação do novo arcabouço fiscal, incorporando algumas das medidas implementadas pelos senadores, e as regras fiscais irão à sanção presidencial. Por fim, antes do recesso parlamentar marcado para 17 de julho, a Câmara votará a Reforma Tributária em dois turnos e deixará para o Senado as tratativas de pacificação com os governadores estaduais que tentam iniciar – até aqui sem sucesso – rebeliões contra as vontades do Governo central. 

Em tudo, vê-se, é um Arthur Lira bem diferente daquele voluntarioso presidente da Câmara que em setembro do ano passado gravou um depoimento durante a campanha eleitoral assumindo-se “um grande bolsonarista”. Microfone em punho, no centro de um palanque em Alagoas, ponderou ele: “lá em Brasília, não posso dizer dessa forma.” A ponderação era necessária para fingir que guardava algum pudor em relação às regras eleitorais e à preservação do decoro do cargo temporário que ora ocupa e já então ocupava. “Mas, aqui posso dizer isso”, avisou aos eleitores alagoanos. “Sou bolsonarista e o governo atual (era o de Jair Bolsonaro, recém-declarado inelegível pela Justiça Eleitoral) está fazendo o melhor (sic) para o País.” Este é Lira, em suas próprias palavras. Era grato a Bolsonaro, que permitiu seu exercício do poder na presidência de uma das Casas do Parlamento extrapolando todos os ofícios antes dados a qualquer um que tenha sentado naquela cadeira que já foi de Ulysses Guimarães.

Reeleito em fevereiro com o apoio ostensivo da bancada do Partido dos Trabalhadores e inéditos 464 votos, Lira exerceu o poder com a rudeza e o pragmatismo que lhe são peculiares até a primeira semana de junho deste ano. Entrou em confronto com o Senado por causa do rito de tramitação das medidas provisórias, anunciou que o Governo Federal seria derrotado em MPs assinadas pelo presidente Lula, tentou derrubar a ministra da Saúde Nísia Trindade, articulou para derrubar a ministra do Turismo e pôr no lugar dela alguém para chamar de “seu”, advertiu que a agenda do Palácio do Planalto dependeria se sua vontade. Era um dínamo e se nutria da energia gerada pelas próprias bravatas. 

Foi então que as múltiplas barbelas dos anzóis da “Operação Hefesto” fisgaram-no: Luciano Cavalcante, um assessor da liderança do PP na Câmara que se vendia em Brasília como “operador e faz-tudo” de Arthur Lira, caiu na pesca de tubarões que a Justiça Federal, o Tribunal de Contas da União, a Polícia Federal e o Ministério Público promoviam em Alagoas atrás de desvios de verbas do Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação (FNDE). Os celulares de Cavalcante e de um motorista que o servia começaram a falar para os investigadores, que fizeram monitoramento por vídeo de ambos e de outras pessoas associadas a eles, e o nome de Lira virou uma espécie de trending topics do fio dos diálogos entre ambos.  Arthur Lira não mediu esforços para demonstrar alguma força e muita ousadia em defesa do próprio patrimônio (ainda que estivesse claro ser Luciano Cavalcante quem velasse por ele com denodo ímpar, como se depreende de todo o acervo das investigações). O presidente da Câmara cobrou diretamente o ministro da Justiça e o diretor-geral da Polícia Federal para que impusessem freios aos agentes investigatórios. Ordenou que seus advogados atuassem em parceria com os advogados de Cavalcanti, do motorista e de um casal de empresários cujo negócio era fabricar recursos cash no submundo de Brasília, para que se esforçassem no pedido de aprovação de medidas protelatórias tais como fazer ascender ao Supremo Tribunal Federal toda a “Operação Hefesto”. Afinal, argumentou, havia investigados com prerrogativa de foro – ele, claro, conservou-se como sujeito oculto no caso. O Ministério Público também foi procurado sob a névoa desse argumento, e o aceitou.

A Hefesto subiu, enfim, para o STF. Não sem que antes disso os investigadores dessem publicidade a muito do que se encontrou e sugerissem a existência de acervo muito maior de áudios, vídeos e fotos, além de depoimentos já dados, que comprometem o presidente da Câmara. Lira seguiu na luta e abriu seus canais de diálogos com o STF e dentro do próprio Palácio do Planalto. Para tanto, num gesto tático, recuou no pedido de trocas no Ministério da Saúde dizendo-se satisfeito com a mera restauração da Funasa, órgão que Lula desejava extinguir e que os deputados do baixo clero sempre adoraram colonizar. O recuo ali foi trocado pela certeza da queda da ministra do Turismo e uma futura troca no Ministério das Comunicações – tudo no âmbito do União Brasil, legenda que nem é de Lira, nem é do Governo; não é de ninguém, é de todo mundo, e quem oferecer mais poder provinciano, leva. 

A “Pax Lírica”, que dá confiança ao presidente Lula, ao vice Alckmin, aos ministros Haddad e Tebet, à Esplanada em geral e ao mercado financeiro em específico, durará o tempo necessário da consolidação dos resultados positivos para os indicadores econômicos. Em meio a esse calendário brasiliense virá o recesso de julho até o fim da 1ª quinzena de agosto. Depois, camaradas leitoras e leitores, o circo d’A Vida Como Ela É voltará a ser encenado na capital da República e Arthur Lira definirá qual papel encarnará  no picadeiro: o de anão? O de palhaço? O de homem-bomba? O de malabarista? O de domador de leões? O de mágico e ilusionista? Ou o de dono de tudo o que ocorre sob a lona?

LUIS COSTA PINTO ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *