O crescimento de 1,9% no Produto Interno Bruto do 1º trimestre surpreendeu a todos, mesmo tendo sido majoritariamente influenciado pela safra recorde de grãos (a maior expansão desde 1996). E, como se sabe, a soja, que foi o motor do crescimento do agro, só dá uma vez, ao contrário do milho, que tem safras de verão e a chamada safrinha, plantada imediatamente após a colheita da soja. Assim, não haverá impactos tão grandes vindos do agro este ano.
Mas o fato é que mesmo esperando desaceleração neste 2º trimestre – e a contração de 0,6% na indústria em abril (em março houve expansão de 1%) – o carrego estatístico do 1º trimestre já garante crescimento de 2,1% no ano (projeções do Itaú) a 2,4% (projeção da Genial Investimentos. Pode-se dizer que a visão do mercado financeiro saiu do terreno negativo para o positivo para a macroeconomia.
Vale dizer que os dados das Contas Nacionais do IBGE no 1º trimestre vieram acompanhadas de revisões trimestrais em 2022. A variação da atividade no 1º trimestre foi de 1,3% para 1,0% t/t, no 2º trimestre o crescimento foi revisado de 0,9% para 1,1%, no 3º trimestre passou de 0,3% para 0,5%, e no 4 º foi de -0,2% para -0,1%. Com o resultado do 1º trimestre de 2023 e as revisões no ano anterior, o PIB se encontra 6,4% acima do patamar pré-pandemia e deixa um carrego estatístico de 2,4% para o crescimento do ano, sublinha a Genial que foi uma das gestoras que mudou radicalmente sua visão pessimista. O Itaú, calcula em 2,1% o carrego estatístico. Num e noutro caso, o PIB tende a crescer mais de 2,5% este ano, se não houver desarranjos na economia.
O peso da política
E é necessário ressaltar que fatos políticos ajudaram a reduzir o grau de pessimismo dos mercados, tanto no Brasil quando nos Estados Unidos. Nos EUA foi afastado o risco de calote parcial dos US$ 31 trilhões em títulos do Tesouro, com acordo afinal entre o presidente democrata, Joe Biden, e o presidente da Câmara, o republicano Kevin McCarthy.
No Brasil, apesar da chantagem do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que manobrou para a votação da MP que reformulou a esplanada dos Ministérios, com aumento de 23 para 37 pastas no governo Lula, o presidente da República teve sangue frio para resistir e contornar a pressão, com ajuda do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, para manter com poucas alterações a estrutura ministerial de seu governo.
Embora o governo tenha vencido por 337 votos a 125, numa folgada maioria, na verdade, foi uma negociação traumática. E que mostrou ao presidente Lula a necessidade de se dedicar mais à política interna, para costurar sólidos apoios aos projetos do governo no Congresso, sobretudo na Câmara, onde Arthur Lira manobra tranquilamente a pauta a seu “timming”, para dar demonstrações de força, e menos às articulações internacionais.
A ajuda dos juros
Se nos Estados Unidos o acordo sobre a dívida e os dados da inflação (declinante, mas menos do que deseja o Federal Reserve) e do mercado de trabalho (ainda com fortes contratações) sugerem que há pressões inflacionárias que dividiram o mercado entre os que esperam mais um último aumento de 0,25 ponto percentual e outros que acreditam sem prudente o Fed manter as taxas estáveis na reunião do dia 21, para ver como a economia reage, no Brasil aumentam as apostas de redução, se não agora, em agosto.
A Genial Investimentos, que chegou a prever aumentos da Selic, mantida em 13,75% ao ano desde 3 de agosto, ao decompor o resultado do PIB trimestral, considera agora que, “por ter o crescimento sido concentrado no aumento da oferta, com queda da demanda (- 0,5%) e aumento dos estoques, pode ter efeito desinflacionário, facilitando a tarefa do Banco Central de levar a inflação para a meta, o que pode, inclusive, antecipar o início do processo de redução da taxa de juros”.
Demanda X oferta
Se os juros caírem, certamente haverá estímulo à demanda, com maior consumo das famílias, que representam cerca de 63% da formação do PIB. No 1º trimestre, o Consumo das Famílias e o Consumo do Governo mostraram números positivos, porém mais modestos do que nos trimestres anteriores.
Entretanto, a Formação Bruta de Capital Fixo, indicador que aponta o aumento da capacidade instalação da economia, sofreu com a queda da produção interna de bens de capital, com destaque para caminhões e ônibus. O somatório de Consumo das Famílias, Consumo do Governo e FBCF (“demanda interna”), registrou recuo dessazonalizado de 0,5% no 1º trimestre deste ano, e aprofundou uma desaceleração que já havia ocorrido no final de 2022 (-0,1% no 4º trimestre, após altas expressivas de +1,2% no 3º e de +1,7% no 2º trimestre do ano passado).
Também houve expressiva acumulação de estoques no 1º trimestre deste ano (equivalente a 2,7% do PIB nominal em termos de Valor Adicionado a Preços Básicos), refletindo a evolução da produção agrícola já destacada acima.
O forte carregamento estatístico deixado (+2,4%), em conjunto com a ampliação das políticas de transferência de renda, o indicativo de adoção de novos estímulos e um encaminhamento razoável para o novo arcabouço fiscal apontam para um crescimento mais na casa de 2% neste ano (o Ministério da Fazenda revisou na semana passada o crescimento do PIB para 2,5%). Mesmo assim, a evolução trimestral na margem, com ajuste sazonal, deve ser modesta nos próximos trimestres, consequência de certa “devolução” da Agropecuária, além dos efeitos da política monetária restritiva e da desaceleração do crescimento global. Por isso, os juros no Brasil e no exterior vão ditar o ritmo da economia.
GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ) BRASIL)