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O que caracteriza o estadista é a capacidade de transformar o Estado quando, aparentemente, todas as vias estão entupidas
No campo político, há dois Lulas: o pacificador e o estadista.
O preponderante é o pacificador. É ele que assume em 2003, manteve-se fiel a todos os dogmas econômicos – que a mídia batizara de “tripé virtuoso” -, apreciou o câmbio, manteve juros elevados, seguiu todo o receituário do mercado.
Mas, ao mesmo tempo, arrumou brechas para políticas sociais fundamentais, que não apenas tiraram o país do mapa da fome, mas consagraram seu governo.
Em 2008, baixa no mundo o Sr. Crise e, ali, nasce o Lula estadista.
O que caracteriza o estadista é a capacidade de transformar o Estado quando, aparentemente, todas as vias estão entupidas e há um congestionamento de interesses difusos, não atendidos.
Lula libertou-se dos dogmas, deixou o presidente do Banco Central Henrique Meirelles falando sozinho. Mobilizou bancos públicos, estimulou a população a continuar consumindo, alargou a participação geral com as conferências nacionais e o conselhão. E saiu da crise como o maior estadista da sua época, com o Brasil liderando o G20, o grupo das nações produtores de alimentos etc.
A crise não apenas consagrou-o, como salvou seu governo. Não fosse ela, o país teria terminado o ano em moratória.
Saiu do governo como referência maior da social-democracia – em crise depois de décadas de ultraliberalismo.
O que se poderia esperar do Lula 3: uma reedição do Lula 1, o pacificador, ou do Lula 2, o estadista.
Provavelmente, do conciliador. As condições políticas, o desmonte do estado, os receios em relação ao mercado, tudo isso dobrou os cuidados que Lula 1 teve, ao assumir o poder.
No front externo, continua com o mesmo dinamismo, com um discurso histórico nos BRICS e um acordo essencial com a China – embora a mídia se concentrasse exclusivamente em suas declarações sobre a guerra da Ucrânia.
Mas, internamente, anda em ovos. O novo arcabouço fiscal não teve um pingo de ousadia. A estratégia de cozinhar Roberto Campos Neto em fogo brando será bem sucedida, mas ao preço de jogar fora dois anos de mandato.
A crise se aproxima de forma veloz, com a Selic a 13,75%. Já pegou em cheio o varejo, a construção civil, criou problemas nas carteiras de crédito dos bancos e já começa a atingir as fintechs.
A inadimplência continua elevadíssima e uma eventual renegociação não fará retomar o mercado de consumo, devido ao baixo dinamismo da economia.
Resta esperar os impulsos externos, os investimentos provenientes dos países centrais, a possibilidade de reeditar o modelo tripartite adotado por Geisel para a petroquímica. E possibilidade do gênero.
Mas o Lula estadista só estará de volta quando o fogo da crise começar a se alastrar.
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)