Juiz da vara que foi de Moro critica “versões deltônicas” e diz: “é chegada a hora do renascimento das garantias dos princípios constitucionais
O juiz Eduardo Fernando Appio, da 13a. Vara Federal de Curitiba, revogou nesta quinta-feira (16/03) a prisão preventiva do advogado Rodrigo Tacla Durán, que estava em vigor desde 2016.
“O cidadão Tacla Durán, como qualquer outra pessoa, merece e tem o direito constitucional de receber do Estado brasileiro uma jurisdição serena, apolítica e republicana, na qual os dois pilares fundamentais são a certeza do conteúdo da acusação (para que possa se defender), bem como plena isenção dos agentes de Estado (juízes, procuradores, policiais e demais protagonistas)”, escreveu Appio, no despacho de seis páginas.
Tacla Durán mora em Madri desde o final de 2016, com toda a família, que levou para lá para se proteger do que entendia ser a perseguição por parte de Sergio Moro e dos procuradores da Lava Jato.
Ele chegou a ficar preso por cerca de três meses no presídio Soto del Real, perto de Madri, em cumprimento a uma ordem de prisão de Moro. A Lava Jato pediu a sua extradição, mas a Justiça espanhola negou, por ter Tacla Durán, neto de espanhol, dupla cidadania – brasileira e espanhola.
O Judiciário daquele país chegou a oferecer ao Brasil a possibilidade de que o processo tramitasse lá, mas a Lava Jato não levou adiante, e os procuradores faltaram a uma audiência previamente agendada.
Tacla Durán conseguiu também cancelar o alerta vermelho da Interpol, acionado a pedido de Moro. A antiga rede internacional de polícia aceitou o argumento de sua defesa de que Moro agia com parcialidade. Na prática, foi como se a Interpol rasgasse o mandado de prisão assinado pelo então juiz.
Em novembro de 2017, Tacla Durán prestou depoimento na CPI da JBS e apresentou os prints da conversa que teve com o advogado Carlos Zucolotto Júnior, padrinho de casamento, amigo de Sergio Moro e ex-sócio da esposa do então juiz, Rosângela. A imagem da tela do computador de Tacla Durán foi periciada na Espanha.
Na conversa, Zucolotto oferecia facilidades num acordo de delação premiada, como prisão domiciliar e a redução de multa, mas, em troca, queria 5 milhões de dólares, pagos por fora. Zucolotto disse que iria bater o martelo com o DD (coincidência ou não, iniciais de Deltan Dallagnol).
No dia seguinte à conversa, o advogado de Tacla Durán recebeu uma minuta do acordo, com os termos acordados com Zucolotto. Questionado pela imprensa, Moro defendeu o padrinho e atacou Tacla Durán, prejulgando-o. Foi o que levou a Interpol a cancelar o alerta vermelho.
Foi a primeira vez que a fragilidade de Moro se tornou pública. Mesmo pessoas próximas diziam que o mínimo que se esperava de um magistrado correto é que determinasse investigação das graves denúncias apresentadas por Tacla Durán. Antes da CPI, a história foi relatada no capítulo de um livro de Tacla Durán que vazou na internet.
Tacla Durán também apresentou indícios de fraude na contabilidade e no sistema de comunicação da Odebrecht, MyWebDay e Drousys, juntadas no processo pelos procuradores da Lava Jato. O Supremo Tribunal Federal tem aceitado esses documentos de Tacla Durán como argumento para absolvições.
Na decisão que revogou a prisão preventiva, o juiz Appio associa a forma de agir da Lava Jato aos ataques ao Supremo Tribunal Federal e à sede de outros poderes da república, em razão das críticas exageradas. Ele chama esses ataques que partiram de procuradores da Lava Jato de “versões deltônicas”. E lembra que juízes e procuradores também são responsáveis pela sobrevivência das “frágeis raízes da jovem democracia brasileira”.
Tacla Durán aguardava a decisão do juiz para retornar ao Brasil. A decisão de Appio é consequência do julgamento do ministro Ricardo Lewandowski esta semana, que suspendeu as ações da Lava Jato em razão da “imprestabilidade” do acordo de delação da Odebrecht.
O juiz a 13a. Vara Federal de Curitiba estabeleceu algumas condições para a revogação da prisão. Tacla Durán terá que prestar contas de suas atividades (a Lava Jato o acusou de ser doleiro) a cada dois meses, a proibição de se ausentar do país sem comunicar à Justiça e o empenho para repatriar recursos “eventualmente depositados no exterior”.
Enquanto isso, responderá a processo, que terá se ser justo, como define a Declaração de Direitos Humanos, um dos fundamentos da Interpol.
Abaixo, a íntegra da decisão do juiz Eduardo Fernando Appio.
JOAQUIM DE CARVALHO ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)