Meu prezado Baden,
como vai indo a tua música por aí? Bom, sabe o que é, já há algum tempo eu queria falar contigo sobre um dos teus filhos, no caso o Marcel. Pois tu talvez ainda não tenhas dado conta de que a Kuarup lançou Pro Tião – Gilson Peranzzetta e Marcel Powell.
Mas antes de falar sobre o CD, quero contar da alegria que senti ao saber que o Vinícius comentou contigo sobre a minha coluna, dizendo que ela era o máximo e essa coisa toda… rsrsrs, brincadeira, Baden, imagina se o poetinha ia dar tamanha moral pra esse velho vocalista aqui! Tô cheio de graça, né? Mas voltando ao Pro Tião – Gilson Peranzzetta e Marcel Powell, gravado em homenagem ao violonista Sebastião Tapajós.
O álbum traz o duo do violão do Marcel com o piano do Gilson. Impressiona, Baden, a generosidade estilística do piano do Peranzzetta, tu vais adorar. E no que ele abre a porta para a energia do violão do Marcel, eis que tu surges ali, de corpo e alma. Emocionante!
Os dois formam desenhos enquanto improvisam. Tocando a melodia ou solando, as mãos se entrelaçam e se expandem. Seja nos movimentos agitados ou nos reflexivos, a criatividade busca o belo e sempre encontra. Como bem sei que bem cuidaste das dinâmicas, Baden, as do duo também são firmes, arrepiar-se ao ouvi-las é quase redundância.
A tampa abre com “Tocata Para Billy Blanco”, de Sebastião Tapajós. Peranzzetta dedilha o piano com sabedoria. Eis que chega Marcel, e de suas cordas brota a categoria de um instrumentista pleno em seu ofício – ao ouvi-lo, a saudade baterá, amigo, prepara-te.
Ó só, Baden, tuas parcerias com Vinícius têm o poder de tornar ótima a escolha do repertório a cargo de Gilson e Marcel, enquanto os arranjos de Peranzzeta dão o brilho que ilumina o álbum impecável – duas gerações de profissionais que se respeitam… isso não tem preço.
Em “Deixa”, por exemplo, o duo criou bela intro para o clássico. O entrosamento dos instrumentistas transparece como se existisse há milhares de anos.
Outro bom exemplo é o seu “Só Por Amor”. O violão soa sentido. O samba flui cadenciado. Os versos de Vinícius agradecendo ao amor são de arrepiar. O improviso do violão acrescenta lirismo à harmonia que o piano dedilha, para logo a seguir também improvisar.
E não dá pra não assinalar “Carioquinha”. O coro come! Delirantes, violão e piano recriam o chorinho de Waldir Azevedo. A delícia de relembrar o som irrequieto de tempos imemoriais é momento indescritível.
Assim como é importante “Pro Tião”, parceria do Gilson com Marcel. O piano inicia o tema. Logo o violão assume a melodia que, delicada, se revela amorosa: amor na ponta dos dedos.
E pra fechar a tampa, meu caro Baden, vem “Canto de Ossanha”. O som grave do bordão do violão sobressai, trazendo a força monumental do teu samba com Vinícius. Os improvisos vêm numa sequência de insana magia… até que a tampa fecha.
E eu fecho a prosa – gostastes das notícias, Baden? Assim espero. Saudade, véio!
Aquiles
AQUILES REIS ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)