E aí, pergunto: onde está a brava corporação do Banco Central, o mesmo BC que foi capaz de segurar a peteca nos anos 90, quando o país sofria ataques especulativos sem dispor de um centavo de reservas cambiais?
O Dr. Bregonaldo especializou-se em sanguessugas para combater as febre. Tinha duas sanguessugas especiais, daquelas bitelonas. O paciente chegava com febre, a sanguessuga era colocada nas suas costas, deleitava-se com seu sangue e a febre baixava. E o paciente saía derrubado do consultório, mas sem febre.
Aí surgiu uma tal de penicilina, aplicada por um jovem doutor formado no Rio de Janeiro e com acesso a literatura estrangeira, que muito impressionava os habitantes da cidade.
Aí o dr. Bregonaldo percebeu que o tratamento de sanguessuga precisava do aporte de uma literatura médica. E colocou seu espírito científico a serviço da sanguessugaterapia.
Primeiro, dividiu os pacientes em três grupos: os gordos, os idosos e os magros. E passou a avaliar o comportamento das sanguessugas aplicadas em cada uma.
Constatou que as sanguessugas aplicadas em gordos tinham uma propensão a colesterol alto. O grupo das sanguessugas em idosos tinham mais dificuldade em chupar os sangues. Havia diferença de comportamento em pacientes magros.
Depois, passou a analisar os efeitos da alimentação dos pacientes nas sanguessugas. Pacientes que comiam muito abacaxi antes do tratamento, deixavam as sanguessugas com afta. Havia uma certa rejeição nas sanguessugas a paciente que comiam jacas. De forma geral, preferiam pacientes que haviam acabado de comer. Mas nem passavam perto de pacientes que misturavam leite com manga.
Ao final de 6 meses de pesquisas intensas, o dr. Bregonaldo se tornou o maior especialista da região em sanguessuga, não nos pacientes. Depois de firmar reputação, dr. Bregonaldo não se via em condições de aderir a outros tratamentos. Simplesmente perderia todo o investimento que fez no seu conhecimento em sanguessugaterapia.
Mal comparando, não vejo diferença com os doutos especialistas na teoria da inflação inercial. São capazes de decupar as planilhas do Banco Central, antecipar a alta dos juros meramente vendo os sinais das taxas de juros longos casadas com os juros do FED, discorrer sobre o Forward Guidance, analisar o impacto dos CDSs sobre a rentabilidade do títulos, avaliar o ritmo de alta ou de queda dos juros. Em suma, uma enciclopédia, e em cima do quê? Do uso da âncora cambial para combater a inflação, um instrumento que só não é mais tosco que o tabelamento de preços. Sua única especialidade é a realidade paralela da teoria das metas inflacionárias. Ela se torna um objetivo em si, pouco importa seus efeitos sobre o organismo econômico, sobre as contas públicas, sobre o ritmo da economia. Eles não se especializam nos pacientes, mas apenas no remédio.
E aí, pergunto: onde está a brava corporação do Banco Central, o mesmo BC que foi capaz de segurar a peteca nos anos 90, quando o país sofria ataques especulativos sem dispor de um centavo de reservas cambiais?
Como é possível aceitar passivamente a teoria das metas inflacionárias, sabendo de todas as contraindicações para o organismo econômicos? O poder público banca estudos de parte deles em grandes universidades, têm a melhor formação, financiada pelo Estado. E como retribuem? Atuando como os ratinhos de Pavlov, aceitando acriticamente a estrutura de juros, a volatilidade do câmbio, o jogo das expectativas inflacionárias, tudo nas mãos do mercado, de um cartel de grandes operadores, sem a menor preocupação em atuar no contrafluxo.
Na tabela abaixo, a taxa básica efetiva de mais de vinte países. O Brasil só perde para a Argentina, que enfrenta uma hiperinflação, e para a Rüssia, que está em guerra.
Será que precisaremos chamar o Dr. Bregonaldo para aplicar sua ciência e explicar essa loucura?
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)