A tensões em relação ao ambiente político, em Brasília, para a posse do futuro governo Lula em 1º de janeiro cresceram depois da prisão do terrorista George Washington de Oliveira Sousa. Pequeno empresário do ramo de postos de gasolina, George Washington veio do Pará carregado de fuzis, revolveres e farta munição e programou a explosão de uma bomba num caminhão-tanque de combustível no aeroporto de Brasília. Ele ainda confessou à Polícia Federal, ter participado dos atentados do dia 12 de dezembro na noite da diplomação do presidente Lula no Tribunal Superior Eleitoral e que gestou os atos nos acampamentos em frente ao QG do Exército na capital federal.
Se isso não fosse motivo de preocupação suficiente, diante do fato de que o presidente em exercício, Jair Messias Bolsonaro, que se recolheu a um quase mutismo desde que perdeu a eleição, já anunciou que não passará a faixa a Lula e que viajará para a Flórida (EUA) dia 28, onde irá permanecer um bom tempo (não se sabe se para fugir de uma eventual ordem de prisão a partir da zero hora do dia 1º de janeiro, pois seu mandato e imunidade acabam à meia noite do dia 31, ou um sinal cifrado para os apoiadores mais radicais), a questão é que como a posse de Lula está marcada para as 15 horas, haverá um vácuo no Poder Executivo de 15 horas no 1º dia do ano.
Por isso, os cuidados estão redobrados em Brasília para que os setores da segurança e da ordem já exerçam o comando antes mesmo da posse efetiva de Lula. A indicação do novo ministro da Defesa, o ex-deputado e ex-ministro do TCU, José Múcio Monteiro, e dos três novos comandantes das forças armadas (os novos comandantes do Exército e da Marinha tomariam posse ainda em dezembro; o novo comandante da Aeronáutica, só pode assumir dia 2 de janeiro), tenta neutralizar possíveis reações – que até aqui não ocorreram – às instigações de golpe dos bolsonaristas postados diante dos quartéis.
O trabalho maior é na segurança pública. Os graves atentados na noite de 12 de dezembro, quando ônibus e carros foram incendiados e uma delegacia e a sede da Polícia Federal foram atacados, sem que a polícia do Distrito Federal fizesse qualquer detenção, são preocupantes sinais de leniência, para não dizer conivência com os radicais que alegam ter havido fraude nas urnas eletrônicas e querem que as forças armadas impeçam que Lula suba a rampa.
O atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, ex-secretário de segurança do DF, vai retornar ao posto em 1º de janeiro. O histórico de suas ações recentes mostra um funcionário público servil às teses bolsonaristas. Quando Alexandre de Moraes decretou, na manhã do dia 30 de novembro, quando seria decidida a eleição em 2º turno, a prisão do ex-deputado federal Roberto Jefferson, por desrespeitar o uso de tornozeleira em sua prisão domiciliar, com a continuada incitação ao crime, que culminou que a reação a tiros e a bombas contra os policiais federais que foram executar a ordem de prisão em sua casa em Levy Gasparian (RJ), na divisa com MG, o presidente Bolsonaro ordenou que Torres acompanhasse diretamente o caso.
Torres, que comanda a PF, foi de avião a Juiz de Fora, distante uma hora de carro da casa de Jefferson. Com a resistência de Jefferson, que feriu dois agentes da PF, a execução da prisão foi se arrastando até o fim do dia. Como não é praxe o cumprimento de ordens de prisão entre 18 horas e as 6 da manhã seguinte, parecia ser estratégia de Jair Bolsonaro para desmoralizar a ordem de prisão exarada por Moraes. Entretanto, a reação violenta do ex-deputado configurou novos crimes e a prisão se fez necessária e irrevogável.
Até hoje, Bolsonaro e seus apoiadores creditam os 2,1 milhões de vantagem de Lula no 2º turno, à reação extremada de Jefferson e à perseguição da deputada Carla Zambelli, de arma na mão, a um petista negro com quem trocara insultos na véspera do 2º turno, em rua de São Paulo, próxima à avenida Paulista, onde ocorria concentração do PT, como um dos motivos da perda dos apoios que vinham num crescendo. O conjunto da obra mostra, a posteriori, que as intenções de Bolsonaro podiam ser mesmo sinistras contra a Democracia, se reeleito. E o desenho contava com as forças reunidas do lado de fora dos quartéis. Faltou só a adesão da força armada dos quartéis.
O vácuo na Economia
Mas a tramitação da PEC da Transição e o relatório da Equipe de Transição sobre o estado de coisas deixado pelo governo Bolsonaro em todas as áreas da administração, mostraram um descalabro e um rombo impressionantes. Estruturas desmanteladas e falta de recursos às atividades mais comezinhas. Há coisas mais urgentes que a escalação final do Ministério para acomodar Simone Tebet e futuros aliados políticos.
Tudo porque, para seduzir seus eleitores, o governo baixou, em julho, em 35% as alíquotas do IPI e os impostos federais sobre combustíveis fósseis, que (na contramão das recomendações dos acordos do Clima) ganharam estímulo extra ao consumo, com a “caridade” feita pelo Congresso e Bolsonaro com o chapéu alheio: a redução temporária (até 31 de dezembro de 2022) para 17/18% das alíquotas do ICMS, cobrados pelos estados e parte destinada aos municípios, sobre combustíveis, energia elétrica e comunicações. As alíquotas anteriores estavam acima de 30%.
Como o decreto era temporário (e os estados poderiam ser ressarcidos pela União caso comprovassem prejuízos arrecadatórios – o que foi óbvio), criou-se um impasse perigoso, vislumbrado por Lula que programou reunião geral com os governadores para renegociar a questão da reposição tributária. Estima-se que em base menor. Mas e o que fazer até um novo acordo, chancelado no Congresso, que entrou em recesso dia 23 de dezembro?
Sem um instrumento legal, os estados poderiam cobrar de volta as alíquotas anteriores o que representaria um impacto brutal na inflação. Se Bolsonaro tivesse sido reeleito, Paulo Guedes estaria tomando providências desde 1º de novembro para garantir novas licenças orçamentárias para bancar a promessa do Auxílio Brasil em R$ 600 a partir de 1º de janeiro (o OGU-2023 só previa receitas para R$ 405) e o pagamento do salário-mínimo de R$ 1.400, além de renegociar com os secretários estaduais de fazenda. Mas Paulo Guedes abandonou o barco antes de Bolsonaro, e saiu de férias. Deixou um enorme pepino na gaveta do Ministério da Economia.
Felizmente, há gestores sérios no país. Seus substitutos já acertaram com a equipe de transição do futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad, um decreto para estender a vigência da redução do ICMS e outros impostos por mais 30 ou 90 dias. O prazo é necessário para a construção de uma nova estrutura tributária que ampare estados e municípios, não assuste o consumidor e se ajuste ao espírito da Reforma Tributária do governo Lula.
Fatos desmentem as narrativas
Caro leitor, você já deve ter lido muitas críticas à intenção do governo Lula de descontinuar o projeto venda de 50% do parque de refino da Petrobras e, ao contrário, adaptar as refinarias à produção de combustíveis mais eficientes e menos poluentes, com a refinação máxima do petróleo produzido no país.
Mas o Plano de Negócios e Gestão da Petrobras 2023-2017, aprovada há três semanas pela administração nomeada em junho, vai na mesma direção. Vejam o trecho em que a estatal explica a decisão, tomada em 22 de dezembro, de fazer polo de lubrificantes onde seria o Comperj, em Itaboraí (RJ).
“Após estudos de diversos escopos, foi aprovada a alternativa com potencial de gerar mais valor para a companhia e para a sociedade. O projeto contempla unidades de Hidrocraquamento Catalítico (HCC), de Hidrotratamento (HDT), de Desparafinação por Izomerização por Hidrogênio (HIDW), unidades auxiliares, utilidades e off-sites (extramuros)”. (…)
“A implantação da planta de lubrificantes e combustíveis do GasLub integra a estratégia da Petrobras para expansão e adequação de um parque de refino mais moderno, com produtos de maior valor agregado e qualidade para atendimento ao mercado. Com esta nova unidade, a Petrobras se posicionará entre os produtores de óleos básicos lubrificantes de Grupo II, mais avançados. Além disso, esta nova configuração permitirá o uso adequado e rentável de grande parte das instalações e unidades do antigo Comperj, viabilizando o processamento de correntes intermediárias oriundas da Reduc e eliminando restrições operacionais. Como resultado, o conjunto de unidades terá capacidade aproximada de produzir 12 mil barris por dia (bpd) de óleos lubrificantes de Grupo II, além de 75 mil bpd de Diesel S-10 e 20 mil bpd de querosene de aviação (QAV-1), de baixíssimo teor de enxofre”.
“A decisão da companhia está alinhada à estratégia de manter sua atuação com ativos focados na proximidade da oferta de óleo e gás e do mercado consumidor, além de aumentar a produção de combustíveis, contribuindo de forma relevante com a redução de importações desses produtos”.
Mas o futuro governo já está recebendo críticas por ter anunciado que pretende rever as metas do PGN 2023-27 dentro de um prazo de 60 dias.
GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)