O Brasil possui um sistema ultrapassado e irracional de votação, agravado pela hipertrofia do número de partidos. Portanto, escolha de forma criteriosa os candidatos ao Executivo e Legislativo. É dessa escolha que dependem a liberdade, o progresso e a moral da República.
A história recente das eleições revela que o povo vota mal. O deputado Ulysses Guimarães, homem que sabia das coisas, com invejável experiência, certa ocasião declarou que o próximo Congresso Nacional sempre será pior do que o anterior.
Friedrich A. Haiek, Prêmio Nobel de Economia em 1974, autor de excelentes obras políticas, ao escrever sobre a Europa afirmou: “É inegável que os atuais parlamentos são bastante inaptos para a função legislativa propriamente dita. Não têm nem o tempo, nem disposições de espírito para desempenhá-la a contento” (Direito, Legislação e Liberdade, Ed. Visão, SP, vol. III, pág. 109).
No Brasil, com sistema ultrapassado e irracional de votação, agravado pela hipertrofia do número de partidos, os eleitos para a Câmara dos Deputados e Senado resultam, quase sempre, de escolhas aleatórias. Essa é uma das explicações para o fato de os eleitores, passado algum tempo, terem se esquecido dos candidatos em quem votaram nas eleições passadas.
Estamos há menos de dois meses do escrutínio de outubro. O País se defrontará com a desafiadora tarefa da escolha do presidente da República, dos governadores dos Estados – trazendo a reboque o vice-presidente e os vice-governadores – senadores, deputados federais, estaduais e legião interminável de suplentes.
Observo, reflito e constato que, aguerridas disputas pelo Palácio do Planalto e governos estaduais não se reproduzem nas campanhas dos aspirantes às funções legislativas. Alimentados por recursos públicos, surgiram e estão registrados 32 partidos. Em número semelhante são as legendas à espera de registro. Todos, salvo uma ou duas exceções, não têm ideologia definida, apresentam vagos programas e pereceriam à mingua se dependessem de cotas voluntárias de filiados, alguns verdadeiros e muitos falsificados para satisfazer exigências da legislação partidária.
Até o golpe de 1964, solidificado pelo Ato Institucional nº 2/1967, o panorama era melhor e diferente. Partidos fortes, como a União Democrática Nacional (UDN), Partido Social Democrático (PSD), Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Partido Social Progressista (PSP), dependiam do empenho dos dirigentes para arrecadação de recursos entre filiados e simpatizantes. Alguns praticavam fisiologismo, alimentando-se de dinheiro do governo. Não se sabia, entretanto, de investidas desavergonhadas sobre o Tesouro Nacional para remunerar dirigentes, comprar alianças e votos, ou cometer desvios de finalidade, como hoje se passa com bilhões de reais do Orçamento Secreto, do Fundo Partidário, do Fundo de Financiamento de Campanhas.
Enojado e impotente, o eleitorado se conserva à distância. No Tribunal Superior Eleitoral estão registrados 10.271 candidatos à deputação federal e 234 candidatos a uma cadeira no Senado, azucrinando o eleitor mediante plataformas construídas na internet, para conseguir a caridade do voto. São homens e mulheres, brancos, negros, pardos, ilustres desconhecidos ou conhecidos por demais, youtubers, influenciadores, pastores, militares da reserva, animadores de auditórios, em frenética busca de oportunidade para participar do eterno banquete em que vive a Praça dos Três Poderes.
Vocações inatas para a política, dispostas a se sacrificarem pelo povo e pela Pátria, são raras. Tão escassas quanto vocações ao sacerdócio, ao monastério ou à música erudita. Em crítica aos costumes da época, escreveu Eça de Queiroz (1845-1900): “A política é a ocupação dos ociosos, a ciência dos ignorantes, e a riqueza dos pobres” (Obras de Eça de Queiroz, As Farpas, Lello & Irmão Editores, Porto, 1979, vol. III, 1146). Apesar do sarcasmo, a frase contém fundo de verdade. Conheço ociosos que fizeram da política profissão rendosa; pobres que enricaram no exercício do mandato; néscios travestidos de sábios, na visão míope do povo.
Quando lhe pedirem o voto, não deixe de perguntar, como ensinou o jesuíta Antônio Vieira no Sermão da Terceira Dominga do Advento: “Vós quem sois, e vós quem dizeis que sois, porque os homens quando testemunham de si mesmos, uma coisa é o que são, e outra coisa é o que dizem”.
Analise o que lhe dizem. Escolha de forma criteriosa os candidatos. Afinal, é da enérgica, viril, e incorruptível atuação dos poderes eleitos pelo povo, que dependem a liberdade, o progresso e a moral da República.
ALMIR PAZZIANOTTO ” BLOG OS DIVERGENTES” ( BRASIL)
– Almir Pazzianotto Pinto é Advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidiu o Tribunal Superior do Trabalho.