CHARGE DE LATUFF
O sujeito pode mentir à vontade, sem ser incomodado nem pelos entrevistadores nem pelos adversários – em função das regras impostas ao debate.
O modelo telecatch de debate político, colocando dois candidatos para debaterem entre si, foi inaugurado nos Estados Unidos, na eleição de John Kennedy contra Richard Nixon. Teoricamente, deveria servir para que os candidatos explicitassem melhor suas ideias e pudessem ser questionados pelo adversário.
Foi adaptado no Brasil com um condimento tupiniquim: a possibilidade de participação de vários candidatos no mesmo debate, mesmo alguns pontuando zero ponto nas pesquisas. Pior: sem nenhuma espécie de checagem da enxurrada de números que brota dos debates. O sujeito pode mentir à vontade, sem ser incomodado nem pelos entrevistadores nem pelos adversários – em função das regras impostas ao debate.
Por exemplo, Bolsonaro despeja informações de que sua gestão foi a que mais fez pelas mulheres. Lá na frente, uma entrevistadora lembra que, este ano, houve o maior corte da história para investimentos em mulheres. No cipoal de números e chutes do programa, a observação passou em branco e Bolsonaro terá sua resposta editada para ser transformada em memes de redes sociais.
A primeira falha, então, é a ausência de checagem para as afirmações dos candidatos. No máximo, o candidato solta 5 mentiras e eventualmente um adversário desmente uma.
A segunda, é a falta de discernimento na escolha dos candidatos debatedores, provavelmente em função das limitações das regras eleitorais.
Aí, o espectador tem que ouvir dezenas de vezes o zero-candidato Luiz Felipe D´Ávila dizer que a salvação do país é acabar com o Estado. Ou soltar o bordão de que o Brasil gasta com educação valores de primeiro mundo e tem resultados de terceiro mundo – felizmente, no caso, corrigido em cima da bucha por Ciro Gomes. Ou apregoar a honestidade e profissionalmente do governador de Minas Gerais, Romeu Zema, envolvido até o pescoço em problemas com a Cemig, na indicação de fornecedores indicados pelo Novo.
Ou, então, ouvir dezenas de vezes a candidata Soraya Trhonicke, do União Brasil, apresentar como novidade a fórmula mágica o imposto único e classificar Marcos Cintra, seu autor, como um dos maiores economistas brasileiros.
Cria-se uma dinâmica maluca. Se Bolsonaro tropeça nos seus ataques às mulheres, se Lula vacila na explicação das condenações anuladas, se Ciro é exposto por erros passados, tudo isso é ecoado por uma turba vociferante, no Twitter, como se a eleição fosse decidida em um episódio – em meio a um caos amplo que caracteriza debates dessa natureza.
Pelo próprio formato, acusações mais complexas ou propostas mais amplas não são nem explicadas nem questionadas.
Mais: cria-se uma assimetria entre candidatos com possibilidade de vitória e os demais. Quem não tem perspectiva de vitória, promete tudo. Quem tem, precisa se conter. E, para a parte menos informada do público, a cautela em não fazer propostas descabidas é vista como timidez para governar.
Lula e a corrupção
Lula ainda não conseguiu desenvolver uma explicação simples para esse paradoxo de ter sido condenado em três instâncias, pela Lava Jato, e ser absolvido em 26 julgamentos, quando saíram do foco de Curitiba.
A lógica é simples:
- Sérgio Moro atuou politicamente. Por isso fez acordos com os corruptos para incriminar Lula, em troca de preservar parte do seu roubo. O corrupto dizia que Lula era culpado e ganhava o direito de ser libertado e manter consigo parte do que foi roubado.
- Toda delação, para ter validade, precisa ser acompanhada por provas. No caso da Lava Jato, não houve esse cuidado: passaram todas. Bastava a palavra do delator, que ganhou dinheiro para delatar.
- Os demais tribunais julgaram de acordo com as delações.
- Quando o Supremo anulou os julgamentos de Curitiba, as ações foram para outros tribunais. A mudança de foro não significou o fim das investigações. Provas reais, colhidas nas investigações foram mantidas. Quando novos juízes foram julgar os processos, perceberam que nos 26 processos havia apenas delações sem provas. E Lula foi absolvido em todos eles.
- O pagamento de Sérgio Moro foi ser nomeado Ministro da Justiça de Bolsonaro e ganhar contratos de empresas americanas beneficiadas por suas sentenças.
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LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)