Quanto mais se aproxima a data de 7 de setembro de 2022, quando o Brasil vai comemorar os 200 anos da sua independência política e administrativa de Portugal (os traços linguísticos e culturais ficaram para sempre, como nossa herança), mais fica evidente que os planos golpistas do presidente Jair Bolsonaro de usar os desfiles militares na data para fazer proselitismo político contra as urnas eletrônicas, o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal, de onde são indicados, em rodízio, os líderes do TSE, afetaram a programação da data maior do país.
Havia muito o que fazer e pensar. Mas a aversão do presidente Bolsonaro pela cultura e a sua ideia fixa de usar a máquina pública, em especial as Forças Armadas, para coagir os poderes da República, levou o país a perder uma enorme oportunidade de revisar a sua própria história.
D Pedro I não merecia
A grandiosidade do bicentenário da Independência do Brasil do Reino de Portugal, Brasil e Algarves, em 7 de setembro de 2022, merecia uma comemoração mais robusta e com ampla programação cultural e política para louvar o significado da emancipação do Império do Brasil de Portugal.
Sem qualquer desrespeito aos descendentes da família Orleans e Bragança, o recebimento, com pompa, do coração de D. Pedro I, soa como uma arrumação de última hora para não deixar a data em branco e dar crédito ao responsável pelo gesto. Os historiadores lembram que o papel da Imperatriz Maria Leopoldina, que lhe mandou uma carta, após reunir o Conselho, alertando para as pressões de Portugal, que exigia seu retorno imediato ao país, também foi importante. Ela alertou o marido que tomou o gesto de brandir a espada após ler a carta.
Médici celebrou mais
Por muito menos – era apenas a comemoração dos 150 anos do evento, em 1972 – o governo do general Emilio Médici fez muito mais. Para mobilizar a população, realizou uma mini-Copa de junho a julho, com a seleção Tricampeã do Mundo no México, em 1970, enfrentando 20 países dos quatro continentes, incluindo países africanos, europeus, vizinhos da América Latina e seleções do Caribe.
O Brasil já não contava com Pelé (o Rei se despediu da amarelinha em 1971), mas ainda tinha a base tricampeã: Jairzinho, Tostão, Clodoaldo, Carlos Alberto, Rivelino e Gerson, que fez sua despedida no Maracanã, na final em que o Brasil venceu a seleção de Portugal, basicamente o time do Benfica, liderado por Eusébio. Jairzinho fez o gol da vitória aos 44 minutos do 2º tempo
Da TV a cores via Embratel …
As partidas se desenrolaram em 12 cidades: Aracaju (SE), Belo Horizonte (MG), Campo Grande (MS), Curitiba (PR), Maceió (AL), Manaus (AM), Natal (RN), Porto Alegre (RS), Recife (PE), Salvador (BA), Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP). Para mobilizar mais o país, o governo estava inaugurando as transmissões em TV a cores em escala nacional, pela Embratel (estatal).
… ao 5 G
Meio século depois, a celebração tem a extensão da telefonia 5G à metade do país. Detalhe, o Ministério das Comunicações tinha prometido a extensão para todo o país em setembro, mas 15 estados só terão a nova tecnologia em novembro.
Um livro para relembrar o presente
A campanha eleitoral está entrando na reta final e não dá para ficar alheio ao pleito de 2 de outubro próximo que poderá definir o futuro do Brasil nesta quadra do milênio. Há gente de memória curta até em relação aos tempos presentes. Assim, novas informações e subsídios para solidificar a escolha são muito bem vindos.
Por isso, recomendo “Diário da Indignação”, de Celina Côrtes, que inaugura uma nova forma de contar a história. Com textos enxutos, recheados de hipocrisia e humor, a jornalista, com larga passagens pelo “Jornal do Brasil”, em três períodos (incluindo a breve volta do JB em papel em 2018-19), “O Dia” e 11 anos na sucursal Rio da “Istoé”, tece uma cronologia desses tempos sombrios de governo Bolsonaro.
Além de colega e minha prima (3º grau), Celina escreve com leveza, mas contundência. O livro é um antídoto eficaz à falta de memória dos brasileiros. O lançamento será nesta quarta (24) , na Livraria Argumento do Leblon.
GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)