Não sei se você se deu conta, caro leitor, mas estamos (contando este domingo) a 56 dias, ou a menos de dois meses, da votação do 1º turno, para a renovação da bancada de deputados federais e senadores, bem como a renovação/manutenção do comando da Presidência da República. No mesmo pleito de 2 de outubro, devemos escolher nossos representantes nas Assembleias Legislativas, assim como o responsável pela gestão do Estado em que vivemos ou temos nosso domicílio eleitoral.
É verdade que a campanha está nas ruas desde 1º de janeiro de 2019, quando Jair Bolsonaro, eleito com votação surpreendente e expressiva, prometendo durante a campanha – em que aproveitou o fato de ter levado uma facada, em Juiz de Fora (MG), para evitar debates e não se expor – que não iria se candidatar à reeleição, começou a subir no palanque tão logo envergou a faixa presidencial.
Desta vez, porém, tem como principal adversário o ex-presidente Lula, que lidera as pesquisas eleitorais desde o 1º semestre de 2021. Lula foi alijado de participar da campanha de 2018 por decisão do então juiz da Vara Federal de Curitiba, Sérgio Moro, que determinou sua prisão, em abril de 2018, após a condenação pelo Tribunal Regional Federal na 2ª Região, em janeiro daquele ano.
Sem voz e palanque para ajudar o candidato do PT, Lula acompanhou da prisão federal de Curitiba o ex-ministro da Educação, Fernando Haddad, perder para Bolsonaro no 2º turno por 55,13% (57,797 milhões de votos) a 44,87% (47,040 milhões) dos votos válidos. Houve abstenção de 31,371 milhões de brasileiros. Outros 2,486 milhões votaram em branco e nada menos que 8,608 milhões de eleitores anularam, votando errado ou deliberadamente em outros números que não o 17 de Jair Bolsonaro, ou o 13 do ex-prefeito de São Paulo.
No Brasil, a abstenção tem oscilado em torno de 20% a cada eleição (foi de 20,33% no 1º turno de 2018, quando 29,941 milhões não votaram). E sempre aumenta no 2º turno. Em 2018, os que não foram votar aumentaram em 1,430 milhão, seja por desinteresse ou por falta de meios para comparecer às zonas eleitorais (muitas vezes os cabos eleitorais de candidatos à Assembleia ou à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal providenciam o transporte). A soma das abstenções com os votos brancos e nulos totalizou 42,466 milhões de brasileiros aptos a votar, superou a votação de Fernando Haddad.
Mudança de cenário
Quatro anos depois, a maré virou. Ou começou a mudar antes. Em 15 de abril de 2021, três anos e oito dias após Lula se entregar à Polícia Federal para cumprir condenação em 2ª instância, que o afastou da campanha de 2018, o Supremo Tribunal Federal decidiu que ninguém poderia ser preso antes de esgotados todos os recursos regimentais (vale dizer até a sentença ser confirmada nos tribunais superiores). Mais adiante, o juízo de Curitiba foi considerado pelo mesmo STF incompetente para julgar a situação de Lula, incluída nas investigações da Lava Jato. Livre, leve e solto, sobretudo depois que alguns dos seus processos prescreveram em janeiro deste ano, o ex-presidente Lula voltou a circular e a fazer pequenos comícios pelo Brasil ou conceder entrevistas a jornalistas brasileiros e à imprensa internacional.
Com mais exposição e a autoridade de quem governou o país por oito anos e deixou o poder em 1º de janeiro de 2011 no auge da popularidade (87% de aprovação em dezembro de 2010), ao passar a faixa presidencial para sua ex-ministra da Casa Civil, Dilma Roussef (com a promessa tácita de voltar a concorrer em 2014), Lula foi a típica vítima da criatura que se voltou contra o criador). O “poste” eleito, fez costuras políticas. Se julgou forte e se impôs com cabedal para tentar a reeleição. Lula teve de aceitar calado.
Reeleita em 2014, após congelar os preços dos combustíveis, baixar a conta de luz a canetadas, segurar os juros e o câmbio (esses preços foram “desamarrados” tão logo foi conhecido o resultado das urnas em 26 de outubro de 2014), o que produziu uma escalada inflacionária em 2015 e uma recessão que durou dois anos, criando o clima político-econômico para o “impeachment” de Dilma em 2016. Em 2015, o dólar subiu 48%; a energia elétrica, reduzida artificialmente em 2013, aumentou 51%; os combustíveis subiram 26%, sendo de 21% a alta da gasolina e de 29,63%, a do etanol. Responsável por 25% dos gastos familiares, a alimentação subiu 12,03% em 2015, com o açúcar, o mais tradicional produto do país desde o Brasil-Colônia, subindo 47,45%. O PIB encolheu 3,6% em 2015 e mais 3,3% em 2016.
O movimento de baixa artificial dos preços que estavam sob controle do Estado – os combustíveis, a energia elétrica (só no fim do 1º semestre deste ano a Eletrobrás foi privatizada), os juros e o câmbio (estes sob a batuta do Banco Central) – considerado um estelionato eleitoral, pode ser comparado ao pacote de bondades de R$ 41,2 bilhões (sem contar os efeitos indiretos da redução de impostos e dos preços dos combustíveis pela Petrobras), que Bolsonaro começa a distribuir diretamente ao bolso dos eleitores a partir desta 3ª feira, 9 de agosto, a uma semana do início da campanha eleitoral no rádio e TV.
Do bico de pena à caneta BIC
É interessante lembrar que a eleição de 2022, com maioria de 52,65% de eleitoras entre os 156 milhões de brasileiros aptos a votar, mas os 90 anos da Legislação Eleitoral no Brasil, instituída por Getúlio Vargas, junto com o direito do voto às mulheres. Foi uma revolução em relação ao sistema do “Bico de Pena”, que virou durante o Império, do qual, além da família real, faziam parte do poder político o clero e a nobreza, vale dizer, os barões do café (que também eram escravocratas e ganhavam na atividade de compra, venda e criação de escravos, mais do que na cultura do café ou outra atividade agrícola, como mostrou Laurentino Gomes no magnífico “Escravidão”, seu último livro sobre a exploração do povo preto no Brasil. Hoje, pretos e pardos são também maioria da população (56%).
Mas Jair Bolsonaro pretende testar esta semana, a partir da 3ª feira, o “poder da caneta BIC”. Neste dia, haverá a distribuição de duas parcelas do Auxílio Brasil turbinado para R$ 600, além do Vale-gás a 5,6 milhões de donas de casa escalonada diariamente nesta e na próxima semana. Dia 16, começa a distribuição de duas mesadas do vale-caminhoneiro de R$ 1 mil cada e ainda em agosto os taxistas das grandes cidades começam a receber as primeiras duas parcelas do vale mensal de R$ 1 mil.
A gasolina, o etanol, o GNV e o diesel começaram a cair. Será que haverá repasse, para baixo, nas tarifas para o consumidor, ou (como fazem grandes empresários quando o governo reduz impostos e eles dizem “recuperar suas margens” haverá transferência de renda pura e simples para estas categorias, em troca da aposta do voto em Bolsonaro?
Com a ajuda do presidente da Câmara, seu aliado Arthur Lira (PP-AL), para dar ares de legalidade às afrontas à Constituição, à Lei de Responsabilidade Fiscal, ao teto de gastos e à legislação eleitoral, o presidente Jair Bolsonaro tem se valido, ao extremo, da máquina pública para tentar seduzir o eleitor a mudar de lado. 1º, achou que a conclusão de pouco mais de 10% das obras de transposição das águas do São Francisco para o Nordeste (iniciadas no 1º governo Lula e continuadas por Dilma e Temer) faria jorrar votos no Nordeste, tradicional reduto de Lula, nascido em Garanhuns (PE). Não funcionou.
Em seguida, vieram as tentativas de retomada do Auxílio Emergencial (transformado em Auxílio Brasil, para tentar varrer da memória dos beneficiários o Bolsa Família, criado por Lula em 2003). Também não funcionaram muito. É que o Auxílio Emergencial voltou em R$ 400, após ter sido de R$ 600 na pandemia da Covid-19, caído para R$ 300, e sido interrompido, pela visão fiscalista do ministro da Economia, Paulo Guedes, em 1º de janeiro de 2021 (como se o vírus respeitasse o ano-fiscal). Voltou em abril de 2021 mais magro (R$ 250) e bem mais restrito que os 63 milhões que beneficiou em 2020. Por falhas do cadastramento, haviam sido incluídos 150 mil CPFs de falecidos (antes da pandemia) e centenas de milhares de funcionários públicos, incluindo militares das forças armadas, e aposentados.
O 3º passo foi culpar a Petrobras. Desde março deste ano, Bolsonaro vem brigando, de caso pensado, com a Petrobras, que elencou como o inimigo público número 1 de seu governo, a Geni na qual não se cansou de atirar pedras. A intenção era tirar de suas costas a responsabilidade pelos reajustes dos combustíveis. As últimas pesquisas eleitorais da Quaest/Genial Investimentos sobre o tema mostram que a estratégia funcionou. Em abril, 31% culpavam as causas externas (guerra Rússia-Ucrânia) pela escalada, 24% ao presidente Jair Bolsonaro, 15% à Petrobras e 12% aos governadores. Em junho, Bolsonaro empatava em 25% com as causas externas (a “culpa” da Petrobras aumentou para 16% e a dos governadores, para 14%). Em julho, Bolsonaro empatou em 28% com as causas externas, e a Petrobras já levou 20% da “culpa”, ficando os governadores com 13%.
Em agosto – após baixar no Congresso o ICMS (dos governos estaduais e dos municípios) sobre os combustíveis, energia elétrica e telecomunicações, além de assistir às primeiras reduções no preço da gasolina nas refinarias da Petrobras, seguindo a queda do barril de petróleo e dos combustíveis no mês passado, quando a economia mundial desacelerou (com recessão nos Estados Unidos) – Bolsonaro deixou o pódio da culpa com as causas externas (com 34%) e reduziu sua responsabilidade para 21%. A Petrobras ficou com 18% e os governadores com 12%. Deve tentar melhorar sua posição na campanha no rádio e TV, já usando a baixa recente de 4% no diesel pela Petrobras.
Apontei, aqui no JB, em fevereiro de 2021, que seus planos de repetir Dilma e Lula para usar a Petrobras como palanque eleitoral estavam desenhados quando decidiu afastar o então presidente da Petrobras, o economista Roberto Castelo Branco, indicado por Paulo Guedes. Acompanhando a retomada dos preços internacionais do petróleo e combustíveis, à medida que o avanço da vacinação nos países mais desenvolvidos devolvia dinamismo à economia mundial, a Petrobras promoveu aumentos (impopulares) dos combustíveis.
Bolsonaro ficou furioso. Aquilo afetava seus planos eleitorais. Em 2020 se desgastara com o negacionismo em relação à Covid-19 e a demora na compra de vacinas, que condenara, e pela forte alta dos alimentos (o óleo de soja acumulou alta de 100% em setembro, quando o país, maior exportador do mundo, teve de importar grãos para extrair óleo). Imaginando que poderia intervir nos preços, escolheu para comandar a Petrobras, em abril de 2021, o ex-presidente de Itaipu Binacional, general Joaquim Silva e Lula.
Acontece que a Petrobras (como outras estatais) passou por uma forte reforma em sua governança corporativa em 2016 e 2017. Foi criada a Lei das Estatais, para limitar a interferência do acionista controlador. Instituído o sistema de Paridade aos Preços Internacionais (PPI), que equiparava os preços dos combustíveis no mercado internos aos preços externos, atualizados pela taxa de câmbio. E a escolha de novos dirigentes teria de passar pela análise do Comitê de Pessoas, órgão assessor do Comitê de Elegibilidades.
Como Silva e Luna seguiu o PPI, e os preços explodiram em março deste ano, nos rastilhos do início da guerra em 24 de fevereiro, Bolsonaro quis trocá-lo em abril. Os dois nomes que indicou para presidir o Conselho de Administração (o do presidente do Flamengo, Rodolfo Valim) e a diretoria executiva (o consultor Adriano Pires) foram barrados pelo Celeg, por apresentarem conflitos de interesse com a empresa controlada pela União. Na pressa de não deixar acéfala a maior empresa do país (Guedes queria indicar Paes de Andrade, o atual presidente, que poderia ter a indicação demorada, por não ser do ramo), foi indicado pelo então ministro das Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque, o nome de José Mauro Coelho, oriundo da PPSA.
Mauro Coelho, seguindo o PPI e as cartilhas de governança, promoveu novo forte aumento em maio. Sobrou para o próprio almirante, trocado por um auxiliar direto de Guedes, Adolfo Sachsida, que era responsável pelo acompanhamento de preços e outros temas estratégicos no Ministério da Economia. Sachsida quis substituir, imediatamente, José Mauro Coelho por Paes de Andrade. Coelho resistiu mais 46 dias no cargo, a tempo de promover um 2º aumento antes de renunciar, em 20 de junho, após ser ameaçado por Arthur Lira, que insistia na sua renúncia, para não atrapalhar a redução dos preços dos combustíveis como um dos trunfos eleitorais de Bolsonaro.
Paes de Andrade foi aprovado, com restrições do Celeg, que vetou dois nomes indicador pelo governo para integrar o Conselho de Administração: o secretário-executivo da Casa Civil (que é o substituto eventual do ministro Ciro Nogueira), Jônathas Castro, e do procurador geral da Fazenda Nacional, Ricardo Soriano de Alencar. No primeiro caso, é notório o viés político de uma ministro-interino da Casa Civil. Quanto à PGFN, a Petrobras discute com o Fisco federal mais de R$ 110 bilhões em pendências tributárias. Ainda assim, o MME voltou a reenviar os dois nomes para compor a lista a ser votada na Assembleia da Petrobras convocada para 19 de agosto, o que gerou recurso prévio de um grupo de acionistas minoritários à Comissão de Valores Mobiliários, o xerife do mercado de capitais brasileiro.
As outras inflações
Bolsonaro está mirando nos combustíveis e nos governadores, quando baixou o ICMS (é um alvo para justificar a narrativa contrária à decisão de vários governadores e prefeitos de grandes capitais de limitar a circulação no auge da pandemia, o que afetou a economia). Mas esquece que a inflação segue em disparada. Nos últimos 12 meses encerrados em junho, o IPCA, o medidor oficial da inflação estava em 11,89%. O número de julho deve apontar deflação dia 9 agora, fazendo a taxa ficar próxima a 10%. Mas os alimentos tinham subido até 13,93% nos 12 meses findos em junho. A inflação já começa no café da manhã, quando o açúcar e o café, ao lado do leite, lideram as altas de mais de 20%. Os óleos e gorduras estavam subindo 25,83%.
Após permanecer mais de 10 meses acima dos dois dígitos, os aumentos vêm pesados nos reajustes anuais de tarifas de água e esgoto, energia elétrica (a baixa do ICMS faz caridade com chapéu alheio, em prejuízo da saúde, educação e segurança providos pelos estados e municípios), telecomunicações, pedágios, planos de saúde (subiram 15,50%, em média) e transporte público e alimentos.
Bolsonaro montou um calendário para aspergir boas notícias a partir do dia 9 de agosto, quando começa a distribuir R$ 41,2 bilhões para os brasileiros até 31 de dezembro, junto com desonerações de impostos para energia elétrica, comunicações e combustíveis. Nesta 3ª feira serão pagas duas prestações, do Auxílio Brasil (julho e agosto), junto com o Vale Gás Lula ainda venceria nas intenções de votos no 1º turno, com 51% dos votos válidos (no voto estimulado, 44% declararam que apertariam o 13 de Lula em 2 de outubro, enquanto 32% escolheriam o 22 de Bolsonaro).
Se vai ser suficiente para impedir a vitória de Lula no 1º turno e mudar o jogo até o 2º turno, em 30 de outubro, quando outras rodadas de benesses teriam sido distribuídas, só o tempo dirá. Agora que as chapas estão prontas, a campanha promete muitas surpresas e traições até a largada da campanha de rádio e TV, em 16 de agosto, o 1º turno em 2 de outubro.
Um pitaco sobre Jô Soares
Muito se falou e ainda vai ser dito sobre o inesquecível José Eugênio Soares, “el gênio Jô Soares”, que nos deixou mais tristes na madrugada de 6ª feira, 5 de agosto. Imagino a cena dele ser recebido no além pelo amigo, também impagável, Agildo Ribeiro (dupla que nos divertia a valer em seus “talks-shows”). Mas poucos se lembraram de falar do começo de Jô Soares como assistente do primeiro “talk-show” da TV brasileira, no final dos anos 50 na finada TV-Rio, que ficava nas antigas instalações do Cassino Atlântico, no Posto Seis de Copacabana, onde estão hoje o Shopping Cassino Atlântico e o Hotel Fairmont. Tratava-se do SS Show. Não, caro leitor, não estou trocando as bolas e afirmando que o Jô começou com o Silvio Santos (no SBT ele estreou em 1988, justamente nesse formato o “Jô Onze e Meia”, que ficou até 2000, quando voltou à TV Globo com o “Programa do Jô”, depois de brilhar como humorista desde o fim dos anos 60 e as décadas de 70 e 80.
SS eram as iniciais de Silveira Sampaio, o médico pediatra carioca José Silveira Sampaio (1914 a 1964) que estreou o primeiro programa de entrevistas e variedades na TV em preto e branco, já tarde da noite. Dramaturgo (suas peças de teatro fizeram um sucesso enorme nos anos 30 e 40), Silveira Sampaio era também multitalentoso e foi uma escola para Jô. No programa Silveira Sampaio inovava, “falando” ficticiamente ao telefone com o chefe da Casa Civil do governo JK (como tinha um tio deputado federal, com meus nove/dez anos de idade em 1959/60, lembro dele ligando para José Sete Câmara ou Augusto Maia Penido para cobrar coisas do presidente). Não raro, “ligava” diretamente para Juscelino Kubitschek. (anos depois, Jô adaptou a ideia para o “Zé da Galera” pedir, do orelhão, que o técnico Telê botasse “um ponta na seleção”; o recurso do telefonema internacional foi usado também para o exilado Sebá, codinome Pierre, “falar” com a mulher que ficou no Rio e saber coisas do Brasil. Incrédulo, dizia que ela não queria que ele voltasse).
Quando a capital mudou para Brasília e surgiu o Estado da Guanabara, o governador Carlos Lacerda também passou a ser alvo de críticas e ironias, pois a audiência da TV Rio era grande na cidade, onde duelava com a TV Tupi. Para provocar Lacerda, SS terminava os programas pegando o telefone preto e “ligando” para uma pessoa não identificada à qual dizia simplesmente: “Carlos, meu filho, tenha cuidado”. Um dia, o governador se encrespou com uma das críticas de Silveira Sampaio, e mandou as tropas da PM carioca cercarem a TV Rio, que cedeu ao governador e tirou o programa do ar. Foi o que bastou para Silveira Sampaio se mudar, com armas e bagagens, para a TV Record de São Paulo (o então canal 7, controlado pela família de Paulo Machado de Carvalho). Nas “bagagens” do novo talk-show”, batizado de “Bate-Papo com Silveira Sampaio”, seguiu Jô Soares, que, além de participar dos roteiros dos programas, já fazia impagáveis aparições em quadros aos sábados. Suas pequenas aparições eram inesquecíveis. Jô fazia a representação da sonoplastia de novelas do rádio. Uma que ele mesmo sempre lembrava, com saudades, era o “tropel” de cavalos ou pessoas, com os dedos “calçados” por sapatinhos de bonecas. Em outra noite, Jô narrava um afogamento num pântano. Para dar realismo à cena mergulhou numa piscina de lona com uma massa de farinha de trigo e água que fazia o barulho da imersão no pântano”. Um pândego. Quando Silveira Sampaio morreu precocemente aos 50 anos, em 1964, Jô já estava diplomado em programas de entrevistas.
Na Record, logo o talento de Jô, que já se manifestara no teatro e no cinema, passou a ser explorado na “Família Trapo”, comédia “siticom” em que era co-roteirista e tinha direção de Manoel Carlos e Nilton Travesso, com Ronald Golias, Otelo Zelloni, Renata Fronzzi e Cidinha Campos (então casada com Manoel Carlos). Também participava Ricardo Corte Real, filho do comediante Renato Corte Real, que junto com Jô foi fazer a dupla de soldados de cavalinho “Lelé e Da Cuca” no “Faça Humor não Faça a Guerra”, que estreou em 1971, na TV Globo. Quando decidiu sair da moldura do humor, no fim dos anos 80, e criar seu próprio programa de entrevistas (desde a redemocratização Jô Soares fazia comentários no “Jornal da Globo”, noticiário noturno da Rede Globo), foi barrado pelo então diretor geral, José Bonifácio de Oliveira, o Bôni. Então, levou os planos desenhados desde a participação do “SS Show” para o “Jô Onze e Meia” do SBT, de SS (Sílvio Santos) em 1988. Ganhamos todos nós com a difusão noturna de conhecimentos do Jô.
GILBERTO DE MENEZES CÔRTES ” JORNAL DO BRASIL” ( BRASIL)