A CONCENTRAÇÃO DA SELEÇÃO BRASILEIRA DE 1958 EM POÇOS DE CALDAS

Canhoteiro, que quem conheceu comparava a Garrincha, perdeu a posição para Zagalo e Pepe quando pulou a janela da concentração para conhecer as mocinhas.

Na Copa de 1958, os preparativos foram em Poços de Caldas. Meu pai era farmacêutico, mas apaixonado por jornalismo e futebol. Tornou-se correspondente da Gazeta Esportiva, diretor de futebol da Caldense e amigo de grande parte dos cartolas que vinham passar temporadas em Poços. Articulou com Carlos Joel Nelly, da Gazeta Esportiva, de ampla influência na CBD (Confederação Brasileira de Desportes) para conseguir trazer para Poços a concentração.

Eu tinha apenas 8 anos, mas acompanhei alguns detalhes do período. Outros, me foram contado por João Havelange, em um encontro fortuito com ele no Mosteiro, o restaurante preferido do Rio antigo.

Pelé ainda não explodira. Mazzola já havia sido negociado com um clube italiano. Nos treinos, era tão apático em campo, que julguei que fosse um dos Santamaria, padeiros que forneciam alguns jogadores para a Caldense.

Lembro-me que eram 4 grupos de 12 jogadores. Lembro-me até dos 4 goleiros convocados: além de Gilmar e Castilho, Hélio (acho que era do Botafogo) e Carlos Alberto (do Vasco).

Desde o início do século 20, uma das razões da fama de Poços eram as mocinhas da rua Paraiba – que depois se tornou rua Assis Figueiredo. Canhoteiro, que quem conheceu comparava a Garrincha, perdeu a posição para Zagalo e Pepe quando pulou a janela da concentração para conhecer as mocinhas.

Segundo me contou Havelange, os jornalistas ficavam de tocaia em frente a concentração, à espera de escândalos. Alguns chegaram a levar algumas mocinhas da Rua Paraná para serem  fotografadas junto às janelas, aguardando algum jogador incauto aparecer.

Depois veio a Copa, a conquista, e alguns jogadores voltaram a Poços para agradecer a hospitalidade. Foi armado um palanque na praça ao lado das Thermas. Não me lembro de todos os jogadores que vieram. Seguramente Pelé, que voltara consagrado da Suécia, e o capitão Mauro Ramos de Oliveira, cujo primeiro time foi o da Farmácia Central do meu velho, em um torneio em que cada comerciante bancava um time. Depois, meu pai levou Mauro para a Caldense. E Mauro ficou grato para sempre.

Lembro-me no início da carreira de jornalista, fazendo parte de uma equipe da Veja para levantar a história de Pelé para uma capa de comemoração dos mil gols. A concentração do Santos era na Chácara Nicolau Moran. Fui lá de gravador em punho, aguardei o fim do treino, vi Pelé saindo com Nenê e Léo, meio campo do Santos, e dando conselhos:

  • Quando pegarem a bola, façam que nem Dirceu Lopes, e caminhem imediatamente para o gol.

Aproxime-me timidamente, pedi uma entrevista e ele nem me deu bola. Aí fui falar com Mauro, que era técnico do Santos e me apresentei como seu conterrâneo.

  • Filho de quem?
  • Do Oscar Nassif.
  • Meu querido amigo Oscar?

Chamou Pelé e pediu que me desse a entrevista.

Voltando à comemoração em Poços, consegui ficar em cima do palanque, levado por meu pai e incumbido de distribuir confete e serpentina para os meninos que se acotovelavam ao lado do palanque.

Em determinado momento, o palanque cedeu e começou a cair lentamente para o lado onde estavam os meninos. Meu pai me pegou no colo e caímos, ficando encostados na armação do palanque. Lembro-me até hoje de um jogador caindo por cima de nós e sendo seguido pelo pé do meu pai no seu traseiro.

A maioria dos meninos conseguiu se safar. Um, ficou. E foi a grande tragédia da minha infância. Lembro-me até hoje de seu nome, Marcílio Dias, em homenagem ao grumete herói da guerra do Paraguai. Lembro-me que a família morava em cima da Vida Social, a grande livraria da cidade. Lembro-me do seu enterro, que comoveu toda a cidade. E da dor estampado no rosto de sua mãe.

LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)

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