Quando eu começava na carreira, final dos anos 70, havia um bordão nas redações, para ensinar sempre que jornalista descreve e analisa e não é personagem do jornalismo: “jornalista não é notícia”.
Ele também pensa assim, mas tenho de pedir licença ao velho mestre para dizer que Janio de Freitas, às vésperas de completar 90 anos, é notícia sim. Notícia e análise: concatenação de fatos e a relação destes processos com o interesse púbico.
Na entrevista que dá ao Poder360, publicada hoje, ele narra um sentimento que, tenho certeza, marca a alma de todo jornalista com mais de 60 anos e, portanto, testemunha do processo de redemocratização do país – para os do ofício, a esperança que a liberdade fosse nos trazer, senão uma primavera, uma caminhada em direção a um Brasil mais sério e justo.
Nós não estamos imunes ao que acontece à nossa volta, mesmo que seja distante. Mas [o jornalismo] é uma atividade cansativa, com períodos muito excitantes e com períodos não só de tédio, mas até de tristeza. Nos últimos anos o meu sentimento ao trabalhar é exatamente esse. Eu trabalho triste. O meu trabalho me amargura. Porque me obriga a ver exatamente o oposto do que eu desejaria que acontecesse para o país. E particularmente no que compõe o país para as pessoas que o habitam, que não merecem de maneira nenhuma o que tem o Brasil.
O pequeno consolo é ver (ou rever) Janio, às vésperas dos 90 anos – completa-os em 9 de junho -, firme, lúcido e íntegro, sem mesmo derramar-se em vaidades pelos 35 anos da reportagem com que, na Folha e com o recurso inteligente de publicar, como “classificado” (pequenos anúncios de serviços, compras e vendas, uma espécie de “mercado livre” daquela era) os resultados “acertados’ de uma concorrência da Ferrovia Norte-Sul.
Janio, na entrevista ao editor Paulo Silva Pinto, longe de ser um passadista, tem perfeita clareza dos desafios do jornalismo – não como profissão, sujeita a acabar como qualquer outra – mas como serviço público e insumo essencial para a formação do pensamento social.
O jornalismo segue necessariamente o nível de cultura política de cada país. Nos países mais desenvolvidos ele é incentivador, é promotor dessa cultura. E nos países não desenvolvidos, que é o nosso caso, o jornalismo fica sujeito a muitos condicionamentos políticos, econômicos, de desenvolvimento profissional. Isso resulta numa contribuição muito oscilante da mídia em geral e particularmente da televisão, muito mais contida do que o jornalismo impresso. E também há uma contenção grande por uma série de circunstâncias. O mercado de trabalho estreito para o jornalismo retém muito o jornalista, imensamente, com medo da perda de emprego. Há a vontade de fazer carreira, a dúvida sobre a sua continuidade na profissão, as ondas de demissões. Isso tudo pressiona os integrantes das redações. Ainda que não se possa dizer que é isso que reprime a liberdade das redações, é uma pressão grande de retenção da atividade e do jornalista como ser humano e profissional. O número de jornalistas que avançam contra essa contenção, e vão a uma temática que não é a usual, é muito pequeno. Precisaria ser muito maior para que a mídia brasileira cumprisse o seu papel. Do meu ponto de vista a internet não tem a menor culpa na queda do jornalismo impresso. Essa responsabilidade cabe aos jornalistas.
Assista a íntegra da entrevista e leia alguns destaques no Poder 360.
FERNANDO BRITO ” BLOG TIJOLAÇO” ( BRASIL)