Para o autor, a decisão do STF sobre o Telegram terá pouco efeito prático. E sugere que as medidas para coibir o mau uso da tecnologia devem ser discutidas em fóruns internacionais, para ele, problemas desse tipo devem ser tratados de modo imediato e geral.
Nessa semana tivemos noticias da decisão do Ministro do Supremo, Alexandre de Moraes sobre o TELEGRAM. A princípio, a sequência e decisões parecem OK.
Mas vou aqui tentar uma abordagem um pouco diferente.
Em resumo:
“Além de não ter representantes no Brasil e ignorar decisões judiciais , a plataforma dissemina informações falsas e conteúdos criminosos”. Completando “… multa diária de R$ 100.000,00 a quem descumprir a decisão, inclusive pessoas físicas…”
Uma empresa sem sede e representante no Brasil, cometendo crimes e afrontando a justiça! Pau nela!
Só que não..
Se fosse uma rede de lojas ou lanchonetes com milhares de unidades no Brasil, a solução seria implementada de forma simples. Tá proibido e pronto. A polícia garantiria que nenhuma loja abriria a partir da data X. Quem fosse comprar um sanduiche pagaria multa de R$ 100.000,00!
Mas o mundo da Internet e TELEGRAM não é esse mundo físico onde as coisas acontecem dentro das regras e fronteiras de cada país.
O TELEGRAM não depende de nenhuma instalação física no Brasil e nem precisa de representantes aqui. Tudo acontece na “nuvem” e nas suas interconexões.
É possível proibir o o Google e Apple de baixar os apps nas suas lojas. OK. Mas e os milhões de apps já baixados? E as outras lojas que podem continuar baixando?
É possível proibir as grandes operadoras (VIVO, OI, TIM e CLARO) de permitir o acesso aos IPs do TELEGRAM? Sim, mas, e as dezenas de milhares de operadores via Wi-Fi ou de Redes Locais Privadas (VPNs)? Além disso, os IPs podem ser trocados regularmente pelo TELEGRAM e a ANATEL não vai conseguir acompanhar.
A Rússia tentou bloquear o TELEGRAM nos últimos 2 anos e não conseguiu. Aliás e ao contrario. Nesse momento, o TELEGRAM é um dos poucos recursos que os povos ucraniano e russo tem pra saber o que está acontecendo de verdade na região.
Vamos mudar um pouco aquele texto inicial lá em cima?
Nova versão: O ministro do Supremo Tribunal de Gana (ou Niger, ou Moçambique ou Haiti ou Guatemala, ou….) proíbe o TELEGRAM no seu território por desrespeito às suas leis e por não ter representante no país e impõe multa diária de R$ 100.000!.
O que vocês acham que aconteceria? NADA, absolutamente NADA. E por quê? Porque esses países, como dezenas de outros não tem importância econômica ou populacional no mundo.
O Diretor-executivo do TELEGRAM já “piscou” em relação ao Brasil. Deu uma desculpa esfarrapada sobre um e-mail antigo e pediu um prazo pra atender à decisão. Por um motivo simples: O Brasil tem mais de 50% dos seus smartphones com o TELEGRAM instalado, com potencial pra crescer esse número nos próximos meses/anos. Da mesma forma, a Alemanha conseguiu ter várias demandas atendidas. Até porque existem dezenas de “Telegrams” por aí torcendo pra queda do concorrente para poderem atuar do mesmo modo que o TELEGRAM original.
E aqueles países citados? Seriam simplesmente ignorados, mesmo que as demandas fossem justas e exatamente iguais às do Brasil.
O problema é bem maior que esse que o Ministro está abordando. E se o TELEGRAM resolvesse a la Elon Musk colocar uma rede de satélites exclusiva gerando o sinal dos seus aplicativos e tornando infrutíferos os possíveis bloqueios nacionais (vários são possíveis). Multa de R$100 mil para os usuários? Teríamos uma Gestapo fiscalizando cada residência e empresa?
Enfim, esse problema só vai ser resolvido se o TELEGRAM topar. E parece que vai, apenas porque eles se interessam pelo Brasil.
Minha opinião pessoal é que a análise do problema está correta. Concordo que a comunicação livre de matérias fake ou criminosas ou enganosas terá que ser coibida de alguma forma.
Mas as medidas terão que ser supra-nacionais. Já está em tempo de percebermos que as legislações que consideram o território físico, seja para o cometimento de crimes ou penalização de criminosos ou para aspectos tributários e trabalhistas, já deveriam estar sendo discutidas nos diversos fóruns internacionais. Seja na ONU, Grupo dos 20, OEA, Comunidade Europeia, OECD, OMC e outras, até mesmo aqui no nosso Mercosul.
Minha opinião pessoal é que a análise do problema está correta. Concordo que a comunicação livre de matérias fake ou criminosas ou enganosas terá que ser coibida de alguma forma.
Mas as medidas terão que ser supra-nacionais. Já está em tempo de percebermos que as legislações que consideram o território físico, seja para o cometimento de crimes ou penalização de criminosos ou para aspectos tributários e trabalhistas, já deveriam estar sendo discutidas nos diversos fóruns internacionais. Seja na ONU, Grupo dos 20, OEA, Comunidade Europeia, OECD, OMC e outras, até mesmo aqui no nosso Mercosul.
Problemas desse tipo teriam que ser tratados pelos associados de modo imediato e geral. “Mexeu com um, mexeu com todos”. Só assim os Telegrams da vida poderiam respeitar e atuar dentro de padrões e limites razoáveis.
E o que seriam padrões e limites razoáveis? Evitar fake news? OK. Analisar conversas dos participantes? Proibir postagens? Qual é a fronteira para a censura prévia? Precisamos atualizar nossos conceitos em função da velocidade e volume de comunicações e possíveis consequências do mau uso das ferramentas tecnológicas disponíveis.
O Ministro vai cantar sua “vitória” na semana que vem, mas nesse exato momento vários concorrentes do TELEGRAM estão preparando seu marketing para captar os milhões de brasileiros que se sentirem prejudicados. E a novela vai ter novos atores em breve.
Encerrando, mais uma provocação: O site Anonymous, que não tem vínculo com nenhum país ou governo, decretou “guerra cibernética” à Rússia, contra a invasão da Ucrânia. Quando a paz for decretada e restabelecida entre os dois países (esperamos que em breve), o Anonymous vai respeitar/aceitar?
E nem estamos falando de METAVERSO…
PAULO MILET ” BLOG OS DIVERGENTES” ( BRASIL)
Paulo Milet é consultor em gestão, Inovação e EaD, Presidente do Conselho de Educação da ACRJ, Diretor da RioSoft e TI-RIO. Formado em Matemática pela UnB, com pós em Administração Pública pela FGV e Founder da ESCHOLA.COM.