CAVIAR, FILÉ, SALMÃO, CAMARÃO: A DOCE VIDA DOS MILITARES NO BRASIL DA FOME

CHARGE DE NANDO MOTTA

Para que servem as Forças Armadas? Para passar vergonha e se curvar aos trocados ofertados pelo presidente” (Luciana Saddi Mennucci (São Paulo, SP), no Painel do Leitor da Folha, em 27.12.2021).

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Nesta mesma segunda-feira, lê-se na manchete do jornal: “Defesa usa verba para conter Covid com filé e picanha”.

Foi um verdadeiro soco na boca do estômago vazio de 40% dos brasileiros de baixa renda para quem falta comida na mesa, segundo o Datafolha.

Auditoria do Tribunal de Contas da União, revelada em reportagem de Constança Rezende, constatou que R$ 535 mil foram desviados da verba de combate à pandemia pelo Ministério da Defesa, do general Braga Netto, para servir a mordomia dos altos oficiais na compra a granel de finas iguarias e bebidas alcoólicas variadas.

Camarão, caviar, salmão, filé, picanha: nada pode faltar à mesa dos donos do poder fardado, generais, almirantes e brigadeiros, encarregados de zelar pela segurança das nossas fronteiras e impedir a entrada de tropas alienígenas. Ninguém vai me dizer que esse apetitoso cardápio é oferecido às tropas.

Em qualquer país civilizado, já seria um escândalo que uma casta de servidores públicos viva na fartura do bom e do melhor, às custas do dinheiro público, mas uma afronta ainda maior é quando isso acontece em meio a uma pandemia, que já matou 620 mil brasileiros, enquanto o povo passa fome e faz fila para catar ossos e carcaças de frango na porta dos açougues ou corre atrás de caminhões de lixo para recolher restos de comida.

Mais ainda: o dinheiro foi retirado da pomposa rubrica “21Co – Enfrentamento da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional decorrente do Coronavírus“. Isso talvez explique por que as “Forças Armadas exigem vacinas de militares, mas não contra a Covid-19”, como a Folha informou no sábado passado, motivo da mensagem da leitora.

Assim fica explicado também por que todo ano as Forças Armadas reivindicam e recebem mais verbas do Orçamento, um saco sem fundo, que faz o governo cortar recursos da Saúde, da Educação e da Assistência Social, desde a posse do capitão reformado pelo Exército, aos 33 anos, por atos de insubordinação.

Em março, quando surgiram as primeiras denúncias de altas compras de picanha e cerveja pelos quartéis, deputados pediram a convocação do general Walter Braga Netto, mas o presidente da Câmara, Arthur Lira, simplesmente negou o pedido, atendendo a um recurso do líder do governo Ricardo Barros (PP-PR), um dos denunciados pela CPI da Covid. A ordem era não melindrar os militares.

A assessoria de imprensa do Ministério da Defesa limitou-se a informar que atuou no enfrentamento da pandemia com o emprego de 34 mil militares para executar atividades diversas, mas nada informou sobre as compras da mordomia encontrada pela auditoria do TCU, alegando que os “questionamentos solicitados estão baseados em relatório preliminar que ainda será apreciado por ministros do Tribunal de Contas da União, no qual (?) esta pasta já apresentou os devidos esclarecimentos”.

Tudo bem, e daí? Que esclarecimentos são esses? O que explica o uso de verbas de combate à Covid-19 para prover a mesa farta e a adega dos altos oficiais, ou vão alegar que esses comes e bebes finos foram servidos aos 34 mil militares de baixas patentes?

Em outros tempos de menos fartura nos quartéis, mesmo durante o regime militar, a refeição da tropa era chamada de “rancho” e consistia basicamente de arroz, feijão, farinha e uma mistura, o prato básico do restante da população sem galardões nos ombros.

Aguarda-se uma manifestação do exmo. ministro da Defesa, Braga Netto, mas como os três Poderes estão em recesso e o presidente saiu de novo de férias, desta vez em Santa Catarina, isso deve ficar para depois do Carnaval, quando ninguém mais lembrar dessa reportagem.

Vida que recomeça.

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