NATAL BRASILEIRO, SEM A SOMBRA TENEBROSA DO MOSTRO

CHARGE DE BRUNO

Na pequena cidade do sul de Minas, a família, machucada, reúne-se para o Natal. Dois anos atrás, o Monstro a dividiu ao meio. Irmãos brigaram com irmãos, tias brigaram com sobrinhos e a família rachou, apesar da presença referencial da Matriarca, que não se metia em brigas de filhos.

Até então, era uma família normal brasileira, com seus pequenos problemas, pequenas diferenças que jamais azedaram o café da manhã. Filhos de sitiantes, os mais velhos seguiram a profissão do pai. Os mais novos estudaram, foram experimentar outros ares. 

Nas reuniões de famílias, reuniam-se todos e suas experiências de vida. Uma das moças enveredou pela área dos direitos humanos, outra pela profissão de professora, e pensavam como bons humanistas. Os irmãos perseguiram a vida rural, cada qual com sua história, e pensavam como bons ruralistas. E nada interferia nas reuniões familiares.

Até que o Monstro chegou espalhando o ódio e a cizânia e a família implodiu, envolta nos fakenews que, despejados diariamente nos seus celulares, contaminaram totalmente o ambiente familiar. E a família brasileira implodiu.

Mas o mundo deu voltas e, nas voltas que o mundo dá, tudo pode ser reescrito.

Os anos seguintes foram duros para o país e particularmente duros para a família. Dos 8 irmãos, um morreu de AVC, outro de coração e um terceiro de desastre; um sobrinho morreu de Covid. E a Matriarca se foi, lançando a suspeita de que nada mais conseguiria recolher os cacos da família. 

Aí bateu o desespero, a lembrança dos tempos felizes, antes da chegada do Monstro, a relevância das relações familiares como âncoras emocionais.

E a família, pacificada pelas lembranças e pela dor, decidiu se reencontrar no Natal. Não houve o tradicional Feliz Natal à meia noite, a pedido da irmã que perdeu o filho, nem a oração em família, puxada pela Matriarca. Mas houve palavras de carinho, todos abrigados debaixo do cobertor das boas lembranças. 

No dia seguinte, no almoço, houve o ritual da abertura dos arquivos da Matriarca. Havia a caixa das fotos de família, as cartas recebidas, as lembranças.

No dia 26, os de fora se foram. E as que ficaram foram até a calçada se despedir, da mesma maneira que fazia a Matriarca.

Em nenhum momento se falou do Monstro. O espectro do Monstro, finalmente, havia sido exorcizado daquela família mineira. E a paz voltou a reinar na família brasileira.

LUIS NASSIF ” JORNAK GGN” ( BRASIL)

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