Como a entrada de Moro no páreo mexe no tabuleiro do jogo pela conquista do Palácio do Planalto
Mal estreou na campanha eleitoral, Sérgio Moro atiçou o fogo no parquinho e pôs em xeque a cômoda polaridade entre Bolsonaro e Lula. Bolsonaro entrou em pânico. Desde a sua live da quinta-feira (2), quando dedicou nada menos que sete minutos ininterruptos a confusos ataques a Moro, ele segue na mesma toada disparando tiros a torto e a direito, alguns até podem acertar seu próprio pé.
Nessa segunda-feira (6), no cercadinho do Palácio da Alvorada, acusou Moro de sabotar seu governo. “Como é que o cara aceita trabalhar comigo sabendo que sou armamentista e depois trabalhar contra? Ele trabalhou contra muito tempo, descobri mais tarde. Tem que ter caráter, né: `Olha, não me interessa trabalhar porque sou de esquerda`”. Mais do que desvario, é desespero. Bolsonaro simplesmente ignorou tudo que Moro disse na longa entrevista em que anunciou ter aceitado o convite para ser ministro da Justiça — aliás, um equivocado aval ao então novo governo.
Desde então, Moro paga, merecidamente, por esse gigantesco equívoco. Milhões de brasileiros que entraram na mesma onda, irritados com os bilionários escândalos nos governos petistas, também se decepcionaram com o negativismo na pandemia, o fracasso na economia e a corrupção no governo Bolsonaro.
De acordo com as pesquisas, que mostram a fotografia de momento, um quarto dos eleitores que elegeram Bolsonaro em 2018 se mostram dispostos a se bandearem para Lula em 2022. É justamente essa multidão sempre atacada pelos devotos de Lula que Bolsonaro, orientado pelo apetite e faro eleitoral do Centrão, tenta reconquistar com o Auxílio Brasil e outros programas sociais de última hora.
Nos cálculos dos bolsonaristas, isso o levaria pelo menos ao segundo turno presidencial. Dava de barato o apoio da direita e da centro-direita, que o apoiariam numa mescla de falta de alternativas entre os candidatos no páreo e sua reconhecida capacidade de enfrentar o petismo. A entrada de Moro pôs esses dois trunfos na berlinda.
Não foi apenas Bolsonaro que sentiu o baque. Ao já entrar em terceiro lugar, Sérgio Moro deu um sentido de urgência a todas as outras candidaturas da tão falada terceira via. Ciro Gomes, que apostava em atrair boa parte desse eleitorado em seu confronto com Lula, além de sair do pódio, parece encurralado com a mexida no tabuleiro. João Doria vive dilema parecido: decola até abril ou vai ter de abrir espaço na passarela.
Lula estava tão confortável no jogo que se sentia à vontade para, de vez em quando, desobedecer ao conselho para jogar parado. Não se expor, apenas se portar como um mar onde os rios de sua vitória desaguariam. Como ele não engoliu a descoberta pela Operação Lava Jato de malfeitos em seus governos e dos mimos que recebeu das empreiteiras que nadaram de braçada em suas gestões, aqui e ali ele tem uma recaída.
Acaricia a esquerda enferrujada do PT e satélites com o slogan perdido no tempo de regular a mídia. Minha geração de jornalistas lutou por isso quando a imprensa tinha um peso infinitamente maior que hoje. Atropelada pela tecnologia, a imprensa profissional hoje tem menos importância, mas maior relevância. Em seu apogeu, sempre foi protagonista da democracia, mas se habituou a usar e abusar desse poder. Como em outros momentos sombrios, a imprensa agora voltou a ser um dos carros-chefes da resistência democrática.
Outra doideira de Lula é elogiar quem agora virou opressor depois de relevantes lutas contra ditaduras que pareciam eternas na América Latina, caso de Daniel Ortega, para agradar às correntes de esquerda do PT que continuam acreditando nos delírios do tal Foro de São Paulo. É um engodo de sempre. Recebem afetos em seu mundinho enquanto Lula no escondidinho do cinema segue pegando na mão das tais elites políticas e empresariais.
O problema dessa peleja entre Lula e de Bolsonaro é o fator Moro. Mais do que seu potencial eleitoral, é a capacidade de Moro de reabrir o jogo que parecia jogado. Ele não apenas entra no páreo, mas também abre um novo cenário para outros presidenciáveis que vinham patinando frente à polarização entre Lula e Bolsonaro. Com essa porteira aberta, Ciro Gomes, Doria e outros façam suas apostas.
A conferir.
ANDREI MEIRELES ” BLOG OS DIVERGENTES” ( BRASIL)