
Bandeirantes, conhecidos também como sertanistas, são louvados e exaltados, não só em São Paulo, berço das Entradas e Bandeiras, por terem conseguido desbravar e manter unificada a imensa colônia portuguesa nas Américas. Muitas vezes, inclusive, sem a proteção da própria Coroa de Lisboa.
Foram estes destemidos homens, originários de Portugal, que, aqui, juntos e misturados às populações indígenas e aos negros provenientes das Áfricas, avançaram, no século XVII pela América do Sul. Iniciaram, assim, a formação do futuro país que viria a ser o Brasil. Alargaram as fronteiras lusitanas, no Novo Mundo, muitíssimo para além das terras atribuídas no Tratado de Tordesilhas – assinado em 1494 na cidade do Reino de Castela.
Os sertanistas alcançaram o Pacífico, através do Equador, após cruzarem a Amazônia – área reservada integralmente aos espanhóis no acordo. A enorme expansão da colônia lusa nas Américas só seria reconhecida pela Espanha, em 1750, no Tratado de Madrid, no qual, com efeito, praticamente toda a Amazônia passou à Sereníssima Casa de Bragança.
O mais legendário e vigoroso daqueles pioneiros foi, sem dúvida, o alentejano António Raposo Tavares (1598 – 1659), chamado de o “Velho”, nascido em São Miguel do Pinheiro, próxima a Mértola – uma das ‘mecas’ do período da ocupação islâmica em Portugal (entre os séculos VIII e XIII). Ele chegou ao Brasil em 1618, aos 20 anos, acompanhando o pai.
Hábil explorador, Raposo Tavares cobriu, numa de suas empreitadas, mais de 10 mil quilômetros – percorrendo o atual Paraguai e Norte da Argentina, territórios que, à época, faziam parte do Quarto Vice-Reinado Espanhol nas Américas.
Outros sertanistas são referenciados até hoje, principalmente, em São Paulo, onde, aliás, uma autoestrada tem o nome de Bandeirantes, ligando a capital paulista à próspera Campinas, bem como uma popular emissora de rádio e televisão – a Rede Bandeirantes.
São, igualmente, festejados vários precursores que, inúmeras vezes, descalços, abriam trilhas nas florestas, segundo pesquisadores, como o britânico A. J. R. Russel-Wood (1940 – 2010), natural do País de Gales, autor da relevante obra “Histórias do Atlântico Português”. Notório como Raposo Tavares também é Manoel Borba Gato (1649 – 1718), já nascido em São Paulo – que, em julho último, teve vandalizado seu monumento, com um incêndio criminoso, no bairro de Santo Amaro, por um grupo autodenominado “Revolução Periférica”.
Integra o núcleo dos bandeirantes notáveis outro paulistano, Fernão Dias Paes Leme (1608 – 1681), “O Caçador de Esmeraldas”, assim como seu conterrâneo Bartolomeu Bueno da Silva, o “Anhanguera”, que, na língua tupi, significa “Diabo Velho”. Juntam-se a estes vultos, que redesenharam o mapa do Brasil, diversos personagens, dentre eles, o impetuoso Manuel Preto (1549 – 1630), contemporâneo de Raposo Tavares, e Domingos Jorge Velho (1641 – 1705), cujo retrato a óleo, de autoria do pintor Benedito Calixto (1853 – 1927), ilustra a coluna.
Eram vistos como uma anomalia por numerosos “portugueses natos”, segundo Russell-Wood, pois, de um lado, tinham ascendência europeia, falavam o idioma de Camões, praticavam o catolicismo e viviam em São Paulo, então, uma vila tipicamente lusitana. Mas, em contrapartida, conforme o estudioso galês, tinham sangue ameríndio, dominavam o tupi e tomavam índias como esposas. Por isso, provavelmente, devemos ainda aos bandeirantes o início da miscigenação racial do País – motivo hoje de orgulho nacional.
ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)
Albino Castro é jornalista e historiador