Exemplar na organização e apuração dos votos, não dá mais para a Justiça Eleitoral ser tão lenta e leniente nas punições a crimes de poderosos nas campanhas eleitorais
Depois de passar pano nos malfeitos da campanha presidencial de Bolsonaro em 2018, flagrados em inúmeras evidências, o TSE promete não ser tão condescendente nas eleições do ano que vem. Como na belíssima canção de Roberto Carlos “Se Você Pensa”, avisa que daqui pra frente tudo vai ser diferente. Em sucessivos votos, os ministros do tribunal anunciaram uma reversão em sua práxis de só julgar crimes eleitorais nos estertores dos mandatos de quem teria sido beneficiado pelas irregularidades nas campanhas.
Há precedentes que beiram ao ridículo. No julgamento da cassação da chapa Dilma Rousseff/Michel Temer, o relator Gilmar Mendes constatou uma profusão de crimes eleitorais. Quando seu parecer finalmente foi a julgamento — depois do impeachment de Dilma, Temer no poder — virou o disco e foi o voto decisivo para a não cassação da chapa.
É mais ou menos o que ocorre agora. Punir Bolsonaro, e seu vice Hamilton Mourão, pelo comprovado abuso das redes sociais, abriria uma buraco negro sobre a sucessão no poder a um ano das eleições. Quem assumiria? Arthur Lira com sua penca de processos? Talvez por pragmatismo, os ministros do TSE optaram por não criar um perigoso vácuo institucional.
O ministro Alexandre Moraes, que presidirá as eleições ano que vem, pôs o dedo na ferida:
— A Justiça Eleitoral pode ser cega, mas não pode ser tola. Não podemos aqui criar de forma alguma um precedente avestruz. Todo mundo sabe o que ocorreu. Todo mundo sabe o mecanismo utilizado nas eleições e depois das eleições. Uma coisa é se há uma prova específica da imputação, mas não se pode aqui criar um precedente avestruz “ah, não se ocorreu nada”. É fato notório que ocorreu e continuou ocorrendo.
E daí? Pelos argumentos nos votos da maioria dos ministros, a chapa Bolsonaro/Mourão deveria ser cassada. Mas, pelas circunstâncias políticas, recorreram a uma brecha legal para não agravarem a crise institucional que ameaça levar o país ao caos. “Houve disparo em massa. Se os autores da ação negligenciaram a prova, isso é outra questão. Há gabinete de ódio”, afirmou Alexandre de Moraes.
O pragmatismo é uma das ferramentas políticas. Às vezes produz resultados excepcionais. Foi assim, por exemplo, no acordo que nos estertores da ditadura militar resultou na anistia ampla, geral e irrestrita.
Assim como no caso da campanha da Dilma, independente do mérito das acusações, o julgamento das estripulias de Bolsonaro chegou fora de hora. Com tanto atraso, qualquer veredito parecia mais vingança do que justiça. Menos para nossa justiça eleitoral, parece óbvio que se um candidato cometeu crime eleitoral sequer pode assumir o mandato.
O que promete o TSE é mudar essa prática daqui para frente. Ao justificar a não punição de Bolsonaro, Alexandre de Moraes anunciou uma boa nova que se espera ser cumprida:
— O lapso temporal pode ser impeditivo de uma condenação, mas não é impeditivo da absorção, pela Justiça Eleitoral, do modus operandi que foi realizado, e que vai ser combatido nas eleições 2022. Se houver repetição do que foi feito em 2018, o registro será cassado. E as pessoas que assim fizerem irão para a cadeia por atentar contra as eleições e a democracia no Brasil.
Tomara!
A conferir.
ANDREI MEIRELES ” BLOG OS DIVERGENTES” ( BRASIL)