Não é um detalhe irrelevante a ordem em que estão as três saídas que Bolsonaro enxerga para si mesmo, enumeradas em discurso nesse sábado para líderes evangélicos em Goiânia:
“Eu tenho três alternativas para o meu futuro: estar preso, ser morto ou a vitória. Podem ter certeza, a primeira alternativa, preso, não existe. Nenhum homem aqui na Terra vai me amedrontar”.
Como é ruim de improviso, Bolsonaro cometeu um erro que seria grosseiro para um político amador. O sujeito considerou a hipótese de estar preso (não de ser preso, mas estar), para logo depois se dar conta de que precisava desqualificar a hipótese que ele mesmo levantou.
Se a primeira hipótese não existe, não deveria ter sido apresentada como sendo a primeira. E a segunda, em que considera a possiblidade de “ser morto” (e não de estar morto), remete é claro à possibilidade de repetição da facada, que até hoje rende explorações políticas da pior espécie.
E, finalmente, em último lugar, a possibilidade da vitória. Que vitória? O que seria a vitória para Bolsonaro hoje?
Será um golpe que o liberte do cerco do Supremo e da CPI do Genocídio e da ameaça de enfrentar Lula e ser humilhado? Um golpe em que os militares ofereçam segurança à família e às suas mansões?
O que Bolsonaro vem construindo é o cenário para que, aconteça o que acontecer, ele consiga escapar.
Se vencer a eleição, tudo bem. Se perder, criará aqui o mesmo ambiente de confusão criado pela direita na Venezuela, nos Estados Unidos, na Bolívia e no Peru.
Qualquer aprendiz de ditador sabe que a melhor estratégia hoje é jogar, dentro da democracia, com armas sujas que, se for preciso, desqualifiquem a própria democracia.
Bolsonaro parece jogar o jogo de uma eleição, desde que seja o vencedor. Como já havia anunciado em 2018, ele só aceita a vitória.
O Brasil terá de se preparar para, a partir das experiências dolorosas dos países citados, erguer defesas desde já ao projeto de Bolsonaro
O sujeito quer tumultuar todo o processo de uma eleição, principalmente a apuração. O objetivo é criar o cenário da Bolívia em 2019, com a reeleição de Evo Morales, que deve se repetir no Peru de Pedro Castillo.
O resultado da eleição passa a ser questionado logo depois de anunciado e é indefinidamente posto em dúvida, mesmo que referendado pela Justiça Eleitoral.
Bolsonaro não aceitou a derrota do projeto do voto impresso na Câmara, porque ali estava a base da sua trama.
O voto com comprovante em papel possibilitaria questionamentos que tornariam a apuração um caos incontornável. Poderiam contar e recontar votos, porque Bolsonaro perdedor não iria aceitar os resultados e certamente não aceitará, sem o voto impresso.
O impasse tentado por Trump só não se consumou nos Estados Unidos porque lá a democracia tem bases que não tem na Bolívia, na Venezuela e no Peru. Mas pode acontecer no Brasil.
O problema é que o grau de confiança de Bolsonaro na capacidade de promover e manter o caos não parece ser muito grande. Ser preso (ou estar preso) é uma possibilidade cada vez mais considerada por ele mesmo.
Há no tensionamento provocado por Bolsonaro a denúncia da sua fragilização, expondo o medo que ele tem de Lula e de ser não só derrotado, mas humilhado.
Bolsonaro teme perder a eleição e, na sequência, sem poder político e abandonado, estar preso. Estar preso, no futuro, é mais do que vir a ser preso.
Há um sentido de alongamento do tempo, de permanência, nesse estar preso.
Ser ou estar preso no futuro, eis a falsa questão para o genocida hoje. Bolsonaro é um homem apavorado, que já se enxerga encarcerado.
MOISÉS MENDES ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)