De tão absurdas, falas do ministro da Economia lembram script dos programas de humor do século passado
Criado pelo grande humorista Chico Anysio, o personagem Justo Veríssimo era uma sátira aos políticos brasileiros. Dizem as más línguas que a voz do deputado era inspirada no falecido senador Humberto Lucena, que parecia ter uma batata quente na boca. Os mais jovens não devem lembrar, mas o personagem tinha como bordão famoso “quero que pobre se exploda”, no qual o deputado demonstrava todo o seu desprezo ao povo que o elegia.
Já nos anos 90, quem representou bem esse papel foi o genial Miguel Falabella com o personagem Caco Antibes, da sitcom Sai de Baixo. “Eu tenho horror a pobre”, bradava ele em todos os episódios.
Pois bem, o ministro da Economia, Paulo Guedes, vendido na campanha de 2018 ao establishment como o “Posto Ipiranga”, o único homem capaz de tirar o Brasil do buraco, não passa da mistura dos dois personagens. Suas falas são tão absurdas que parecem tiradas de um script de programa de humor do século passado.
Às vésperas de completar mil dias de governo, o ministro que está com a cabeça à prêmio – o Centrão reiterou o pedido pela saída do ministro -, continua falando asneiras. Promete um crescimento que não vem, minimiza a crise e, a cada discurso, revela não ter a mínima sensibilidade política e nenhuma conexão com o Brasil real.
Deputados e senadores já perceberam essa característica de Guedes e querem tirá-lo do cargo o mais rápido possível, antes mesmo da reforma de abril do próximo ano, quando os ministros que vão disputar a eleição serão obrigados a pedir exoneração. Tá certo que ele já esteve na corda bamba algumas vezes e não caiu. Em abril do ano passado, antes de Sérgio Moro deixar o Ministério da Justiça, todos apostavam na queda do Posto Ipiranga.
Aos poucos o superministério vem sendo desidratado. E a Faria Lima, antes sua fiadora, já percebeu que o ministro fala mais do que faz. Pior: fala bobagem. É bem verdade que ter Bolsonaro como chefe torna praticamente qualquer missão no governo impossível.
Essa falta de noção política e da liturgia do cargo faz com que Guedes se desgaste cada vez mais. Nesta semana, por exemplo, minimizou a crise energética do país perguntando durante uma audiência na Câmara: “qual o problema agora: que a energia vai ficar um pouco mais cara porque choveu menos?”. Diante da péssima repercussão, resolveu criticar a imprensa, em audiência no Senado, dizendo que sua fala foi tirada de contexto.
O problema é que essa não é a primeira nem a segunda vez que o ministro se equivoca em suas falas. Guedes já responsabilizou a pobreza pelos problemas ambientais. Em janeiro do ano passado, durante sua participação no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, ele disse que “o pior inimigo do meio ambiente é a pobreza”.
No mês seguinte, ao comentar sobre a alta do dólar durante um evento em Brasília, Guedes disparou a seguinte pérola: “Não tem negócio de câmbio a R$ 1,80. Todo mundo indo para a Disneylândia, empregada doméstica indo para Disneylândia, uma festa danada”.
A repercussão foi a pior possível. Mostrou o quão preconceituoso é o ministro da Economia do Brasil e o quanto ele não está sintonizado com os problemas do país. Ele até poderia ter defendido a alta do dólar, mas por outros motivos, não porque as “empregadas domésticas”, como se referiu, estão indo para o exterior. Só faltou disparar o velho bordão do Caco Antibes: “Eu tenho horror a pobre!”.
Em abril deste ano, durante reunião do Conselho de Saúde Complementar, Guedes criticou o Fies, mais uma vez da forma errada. Ele teria motivos para anunciar ajustes ao programa, que aumentou o endividamento dos jovens e favoreceu universidades caça-níquel- tenho uma sobrinha vivendo o drama de não ter como pagar o Fies.
Em vez de criticar os erros do programa, apontou como problema justamente a maior virtude do Fies, que é garantir aos estudantes com renda familiar até três salários mínimos o financiamento da universidade pagando juros zero, com juros variáveis aos alunos com renda familiar acima de três e abaixo de cinco salários mínimos. Como exemplo ele citou o filho do porteiro do prédio onde mora.
Ou Guedes faz urgentemente um media training para aprender a se expressar melhor, ou, realmente, assim como Justo Veríssimo, ele de fato “quer que pobre se exploda”.
E perde o cargo.
EDNA LIMA ” BLOG OS DIVERGENTES” ( BRASIL)