O Supremo Tribunal Federal (STF) precisa urgentemente reafirmar sua condição de casa da última instância no país. A cada dia que passa, há uma afronta contra ele, seja no não cumprimento de ordens e recomendações, até afirmações explícitas, como a do líder do governo, deputado Ricardo Barros, de que em breve ninguém acatará as decisões do STF.
Barros é político conhecido. Tornou-se Ministro da Saude no governo Michel Temer e trouxe como operador o advogado curitibano o Roberto Bertholdo, alvo de vários inquéritos e condenações.
Em pouco tempo, Bertholdo tornou-se especialista nos negócios da saude. Patrocinou algumas licitações pouco nítidas na gestão Barros e, depois, passou a atuar no Rio de Janeiro, sendo preso pela Polícia Federal na operação que desarticulou o esquema da organização social IABAS no estado.
Recentemente, foi denunciado em outro inquérito que investiga um banco de doleiros onde são lavados recursos subtraídos da saude e dinheiro da cocaína do PCC.
O atrevimento de Barros é um ingrediente a mais na tentativa diária de desacreditar o Supremo, e passo perigoso em direção ao golpe pretendido por Bolsonaro. Como era previsto, esse movimento ganhou velocidade depois da decisão do comandante do Exército de não punir o general Eduardo Pazuello, por ter se apresentado em num evento político.
A situação política tornou-se mais aguda quando a Procuradoria Geral da República ordenou que fosse arquivado o inquérito das fake news para quem tivesse direito a foro. Mandou para a 1ª instância a continuação dos inquéritos, pegando a raia miúda.
O gesto de afirmação do Supremo poderá ser ordenar a prisão do Ministro Ricardo Salles, do Meio Ambiente, depois de sua decisão de não entregar seu celular quando houve busca e apreensão nos seu apartamento. Ontem, na iminência de ser preso, Salles devolveu o aparelho, com uma desculpa pouco convincente. Dependerá, agora, da perícia encontrar evidências de que apagou conteúdo.
Mesmo assim, não será um gesto de completa independência do STF, porque Salles tornou-se um pato manco. Convicto de que Bolsonaro não lhe mandaria uma boia de salvação, como fez com Pazuello, tratou de entregar o Ministro Luiz Ramos e o presidente do IBAMA, como responsáveis pelas decisões que tomou em favor de contrabandistas de madeira. Poucas vezes a vida pública testemunhou tal exemplo de pusilanimidade.
Salles continua na alça de mira mas, nos próximos dias, o STF terá que tomar atitudes drásticas que não possam ser questionadas, como foi o caso da ordem para que o Exército levasse remédios às aldeias indígenas – ordem não cumprida – ou que a polícia fluminense só aceitasse operações em casos extraordinários – ordem desobedecida, resultando no massacre de Jacarezinho.
Tanto o inquérito do massacre quanto o da não aceitação da denúncia contra Pazuello foram colocados em segredo.
A cada dia que passa, a sensação de impunidade vai ampliando a margem de arbítrio de Bolsonaro. É hora do STF assumir a iniciativa.
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)