CHARGE DE NANDO MOTTA
Não adianta, o Brasil é brega. Isso não vai mudar nem com pandemia. Agnaldo Timóteo morreu. E você, metido a intelectual do Baixo Augusta, pensando que o cantor não contribuiu em nada com a música. Desculpa, leitor de orelha de livro do Adorno, contribuiu, sim. Não se mede a cultura de um país pelo que se lança de música eletrônica experimental ou de letras cifradas do Caetano Veloso. O Brasil também é Fábio Jr., Moacir Franco, Cauby, Roberto Carlos, Agnaldo Rayol. Tem mais: só começaremos a melhorar como civilização no dia em que soubermos o que somos. E o Brasil também é Agnaldo Timóteo.
MALES DE ABRIL
Mal, enfermidade, moléstia, sintoma,
síndrome, padecimento, sofrimento,
morbidez, definhamento, hematoma,
languidez, depauperamento, quebrantamento,
mal-estar, incômodo, achaque, achaqueira,
indisposição, morrinha, febre, estado febril,
ataque, acesso, frouxo, dispepsia, impaludismo.
adoecimento, lesão, invalidez, caquexia, pieira,
atrofia, marasmo, hemialgia, hemeropatia, héctica,
anemia, decadência, anquilose, anervia, dispneia
prostração, coma, letargia, sonolência letárgica,
infecção, septicemia, epidemia, flagelo, endemia,
peste, pestilência, vírus, chaga, ferida, caideira,
fístula, abscesso, pústula, apostema, apóstase,
horripilação, calafrio, apepsia, expectoração,
tosse convulsiva, doença terminal, doença fatal,
tísica galopante, langor, crupe, Osmar Terra.
DITADURA EM NÚMEROS
31+3+64= 98
9+8 = 17
PERDIDO EM BRASÍLIA
– Chama os comandantes das Três Armas.
– O senhor os demitiu, Excelência.
– Me traz aquele rapaz da Polícia Federal.
– Não está atendendo o celular.
– E o Alexandre Garcia?
– Disse que só fala com o Lira.
– Faz o seguinte: avisa o Hélio Negão pra passar aqui.
– Desculpa, Excelência, o Hélio se filiou ao PSOL.
– Cacilda, então liga pra aquele humorista, o Carioca.
– Sim, senhor.
– Alguém precisa me apoiar, pô.
CARTA DE DEMISSÃO
Excelentíssimo senhor presidente da República, excelentíssimas demais autoridades civis e militares,
Anuê Jaci, etinisemba-ê. Indê irú manunhê. Yara rekô embobeuká tupirã, rekôku ya subí. Embobeuká tupirabê: nge membyrá Tupã.
Anuê Jaci!
Ernesto Araújo.
UMA VELHA E BOA PASSEATA
O idoso olhou para o relógio de pulso: 15 horas. Estava na hora. Desceu as escadarias do escuro edifício, ganhou a avenida. Ali já estavam alguns de seus contemporâneos. Como fazia 20 dias que haviam tomado a segunda dose da vacina, abraçaram-se.
O grupinho mirou o meio-fio e viu 50, 100 mil anciãs e anciãos como eles se preparando para gritar contra o estabelecido, pedir alguém com juízo na liderança, o fim do banditismo e da boçalidade. À medida que a coluna de cabeças brancas caminhava, agitando bandeiras e faixas, a tropa entrincheirada e os tanques moviam-se para trás. Os jovens olhavam o gigantesco protesto das janelas da quarentena.
CARLOS CASTELO ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)
Jornalista e escritor. Lançou 13 livros, entre eles o romance policial ‘Damas turcas’ (Global), a coletânea ‘Crônica por quilo’ (Noir) e o volume de aforismos ‘Orações insubordinadas’ (Ateliê Editorial).