Bolsonaro avançou mais um pouco no projeto de contar com alguém terrivelmente evangélico no Supremo. Agora, deseja ter um pastor.
Será sua escolha para próxima vaga, a de Marco Aurélio, no ano que vem. Um ministro tão sério, compenetrado e cumpridor das liturgias poderá ser substituído por um exorcista.
Ministro do Supremo não precisa ser advogado, juiz ou promotor. Não precisa nem ter diploma de curso superior. Só deve provar notório saber jurídico.
Um exorcista sabedor das leis pode ser o que falta ao Supremo. Foi o próprio STF que ofereceu a Bolsonaro, com as concessões que sempre fez, a chance de contar com um pastor togado deliberando sobre ‘questões constitucionais’, com Deus acima de tudo.
Se quiser, como está à vontade e agora abriu para todos a amizade com Dias Toffoli e Gilmar Mendes, Bolsonaro pode ir adiante e sair atrás do nome de um general evangélico.
Nem a ditadura conseguiu tal façanha de ter um general no STF. Os militares tinham Gama e Silva, o jurista que atuava como se estivesse fardado e era mais furioso do que os generais.
Mas Gama e Silva era um civil prestativo encarregado de construir o lastro institucional do golpe. Foi assim que eles empoderaram o Superior Tribunal Militar no julgamento dos inimigos da pátria, incluindo os civis.
Os generais não precisaram de gente fardada no STF. Tinham tocadores de obras (Andreazza), articuladores políticos (Golbery), ‘educadores’ (Passarinho). Mas nunca as Forças Armadas dispuseram de um grande jurista.
Bolsonaro tem ministros que entendem de saúde, de articulações e acordos com o centrão e de programas pró- desenvolvimento, mesmo que engavetados. O governo tem até um general vice-presidente que agora entende de meio ambiente.
Bolsonaro se protegeu bem e empregou mais de 3 mil militares. Mas também falta a ele um jurista, não um que dê palpites, mas que participe das decisões no STF.
Esse é o déficit dos militares. Bolsonaro tem a chance de radicalizar e revolucionar, indicando um general à próxima vaga.
Um pastor cuidaria de questões de costumes e contemplaria os anseios do fundamentalismo religioso. Um general evangélico, fiel ao governo, como são todos os generais, trataria disso e dos temas que inquietam os Bolsonaros.
Os Bolsonaros têm demandas diferentes, na comparação com seus colegas da ditadura. Os militares tiveram a ajuda dos civis para construir a sustentação jurídica do golpe, principalmente com o AI-5.
Era uma empreitada complexa. Bolsonaro não precisa disso agora. Depende apenas de um Supremo que não incomode grileiros, desmatadores, racistas, homofóbicos e milicianos e que cuide bem dos problemas da família e dos amigos e cúmplices da família.
Não há nada mais ambicioso nos planos de Bolsonaro, que envolvem basicamente as questões familiares.
E o que aconteceria se Bolsonaro encontrasse esse general, como encontrou Mourão para ser seu vice, Heleno para ser seu segurança, Braga Netto para ser seu tutor e Pazuello para ser o cara da saúde que esnoba a pandemia?
Não aconteceria nada. Os jornais iriam passar dias debatendo o saber jurídico do general. Atuais e ex-ministros do STF mandariam recados sobre a escolha aos seus amigos jornalistas.
Um general no Supremo não incomodaria muita gente e logo a situação deixaria de ser esdrúxula para ser considerada inovadora.
Bolsonaro está com toda a corda. Se quiser intervir na CBF e nomear um general como técnico da Seleção, não acontecerá nada. Até o centroavante pode ser um general.
Depois daquele abraço de Toffoli, tudo pode acontecer. E Toffoli presidiu o Supremo por dois anos sob a proteção de dois generais.
Se quiser ousar um pouco mais, Bolsonaro pode ser o primeiro presidente a indicar um general para o STF. Só falta achar um que seja terrivelmente evangélico e depois ir comer pizza na casa de Dias Toffoli.
MOISÉS MENDES ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)
Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.