Documento transcrito pela Polícia Federal em relatório entregue ao STF (Supremo Tribunal Federal) nesta quarta-feira (2) isenta um delegado da PF do Rio de Janeiro que pesquisou o nome do deputado federal e amigo do presidente Jair Bolsonaro, Hélio Negão (PSL-RJ), em uma investigação na qual o parlamentar não tinha nenhuma participação.
Já se sabia que o Ministério Público Federal havia pedido o arquivamento dessa suspeita, em fevereiro passado, mas agora há a prova documental de que também a PF afastou a teoria conspiratória de que havia uma trama na Superintendência do Rio para desgastar o então superintendente, Ricardo Saadi, por meio de uma investigação forjada contra um amigo do presidente.
A teoria conspiratória que acabou desmentida dizia que Hélio Negão virara alvo da PF do Rio de Janeiro de propósito e sem fundamento. Em 29 de julho a imprensa divulgou que o nome do deputado apareceu indevidamente em um inquérito na PF carioca. A imprensa também relatou que a citação a Negão contrariou Bolsonaro.
Duas semanas depois, em 15 de agosto, o então superintendente Saadi recebeu a notícia do então diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, de que os planos para sua substituição foram acelerados. No mesmo dia Bolsonaro disse, na saída do Palácio da Alvorada, que ele trocaria o superintendente por razões de “gestão e produtividade”. Os balanços da PF do Rio desmontaram esse argumento, pois a PF do Rio tinha uma boa produtividade.
Nesta quarta-feira (2), o Sinq (Serviço de Inquéritos) da direção-geral da PF, em Brasília, produziu um relatório de “narrativa cronológica de fatos”, incluindo o episódio sobre Hélio Negão, e o entregou ao ministro do STF Celso de Mello no bojo do inquérito que tramita desde abril no tribunal para apurar eventual interferência indevida de Bolsonaro na cúpula da PF. As pressões de Bolsonaro culminaram no pedido de demissão do então ministro da Justiça, Sergio Moro.
Para fazer a cronologia dos eventos, o Sinq disse que utilizou “fontes abertas e fontes sigilosas (de acesso à investigação)”. Um desses documentos é o relatório da Corregedoria da PF que apurou a citação a Negão, por meio de um inquérito, de 19 de setembro a 12 de dezembro de 2019.
O documento informa que o inquérito foi aberto por determinação do então ministro da Justiça, Sergio Moro. O objetivo era apurar “a suposta inclusão fraudulenta do nome do deputado federal Hélio Fernando Barbosa Lopes (Hélio Negão)” em um inquérito que tramitava na PF do Rio.
A Corregedoria analisou todos os documentos do inquérito e apontou que o nome do deputado apareceu apenas em um apenso e que a primeira referência ao nome de Negão apareceu em 29 de julho, em um despacho do delegado Leonardo de Sousa Gomes Tavares.
Em depoimento, Tavares explicou que, por volta de abril de 2019, viu o nome de um certo “Hélio Negão” em um inquérito que ele tocava e decidiu “diligenciar no sentido de verificar se ‘Helio Negão’, mencionado por investigados nos inquéritos que ele conduzia, se tratava de Hélio Fernando Barbosa Lopes, também conhecido como ‘Hélio Negão'”. O delegado disse que uma simples pesquisa no Google com o critério “Helio Negão vereador Rio” trazia notícias sobre o deputado federal.
Ao final da apuração, contudo, o delegado concluiu que não era possível afirmar que se tratava da mesma pessoa que ele procurava identificar. “[As] diligências permitiram concluir que não seria possível afirmar que ‘Hélio Negão’ se tratava do deputado federal.”
Ao final da sua investigação, a Corregedoria também isentou o delegado Leonardo Tavares, conforme o relatório final transcrito no inquérito que tramita no STF.
“Analisando de forma sistemática o conjunto de elementos probatórios trazidos aos autos, não há como concluir que a inserção do nome do deputado federal Hélio Fernando Barbosa Lopes tenha ocorrido de forma indevida, pois, conforme ficou demonstrado, somente no decorrer da investigação, conduzida pelo DPF [delegado] Leonardo de Sousa Gomes Tavares, constatou-se que ‘Hélio Negão’, citado em diversos inquéritos policiais que tramitam na Deleprev/RJ [delegacia de crimes previdenciários] não se tratava do citado deputado federal que tem a mesma alcunha.”
Segundo a Corregedoria, também “não há como concluir que esse fato (existência do nome de um deputado ligado ao presidente da República nos autos) tenha ou não sido utilizado para gerar algum desgaste ao delegado de Polícia Federal Ricardo Saadi, ex-superintendente regional da PF do Rio de Janeiro”.
Em fevereiro passado, o Ministério Público Federal do Rio também pediu o arquivamento da investigação sobre o despacho do delegado Tavares. O procurador da República Eduardo Benones escreveu na ocasião que “não é possível afirmar que a inclusão teria sido feita fraudulentamente, uma vez que é plausível a intenção de averiguar a possibilidade do Hélio Negão citado pelo investigado ser a mesma pessoa que o deputado federal eleito em 2018”.
RUBENS VALENTE ” SITE DO UOL” ( BRASIL)