O mercado tem uma dúzia de candidatos à espera da vaga de Paulo Guedes. Muitos são melhores do que ele, que sempre foi da série C do neoliberalismo do próprio mercado ou da academia.
O problema não é a saída Guedes, um mediano esforçado, mas o ainda não bem decifrado lastro militar de Bolsonaro. O fator verde-oliva é o que interessa ao mercado e às esquerdas.
O que os generais e seus mais de 5 mil empregados fardados em cargos de confiança estão articulando no governo? Que poder orgânico, de disseminação de ideias, conceitos e ações, têm os generais chamados por Bolsonaro?
Guedes é um subalterno substituível por um equivalente barato e, quem sabe, até com menos caspas. Se for mandado embora, o mercado vai dizer que ficou nervoso, vai especular por alguns dias, mas logo ficará calmo.
Há gente nos bancos, nas universidades, nas consultorias e nas esquinas à espera da vaga de Guedes. Tem gente aposentada, com boa reputação, que pode ocupar o lugar dele com o mesmo brilho, ou seja, sem brilho nenhum.
Exageram os que enxergam Guedes como a pilastra de Bolsonaro. O ministro está sendo fritado porque Bolsonaro sabe, por recados que recebe, que não haverá trauma nenhum se dispensá-lo.
Mas e os militares? O que planejam os generais esnobados por Guedes? O que Braga Netto, que Guedes chamou de despreparado, pode fazer para se aliar ao repentino êxtase populista de Bolsonaro?
O que é de fato o Pró-Brasil ‘desenvolvimentista’ de Braga Netto? Podem os militares, se Guedes for sacrificado, conspirar contra o que sobra do liberalismo de extrema direita construído por ele?
A dúvida circula ao redor do poder dos militares de concordar e induzir Bolsonaro a gastar mais, criar uma base social fiel a qualquer custo com a renda mínima, liberar alguma coisa para os empreiteiros e manter as mesadas do Centrão.
O que o mercado quer saber é se os militares têm poder suficiente para abalar convicções e medos que Guedes enfiou na cabeça de Bolsonaro. E se um ministro mais fraco do que Guedes poderá ser manejado sem dificuldade.
Os generais sabem tanto de economia quanto o próprio Bolsonaro. Mas estarão ao seu lado, mesmo que atrapalhados, para tentar viabilizar o governo com um grande projeto de salvação.
Se passarem dos limites, o mercado acionará seus alarmes. A questão é saber quais são os limites do poder de influência e cumplicidade dos militares, que estão felizes com seus empregos e com a promessa de que terão mais dinheiro para a Defesa, mesmo que não se saiba do que eles possam se defender.
Bolsonaro depende mais dos militares do que da sua base fundamentalista. Os generais advertem todos os dias o tenente: seu governo não se mantém sem a base fardada.
Há um sentimento de protagonismo e de busca de hegemonia, que pode ser falso. O ex-presidente argentino Eduardo Duhalde disse essa semana em entrevista a uma TV em Buenos Aires que os militares tomarão o poder na América Latina, como fizeram nos anos 70 e 80.
Duhalde citou o Brasil como exemplo de governo que já é militar. Será mesmo, ou os militares são apenas empregados de Bolsonaro e da sua estrutura olavista?
Sobra para as esquerdas a crença numa ruptura. Que em algum momento se quebre o equilíbrio que segura as tensões internas de Bolsonaro com os militares e desses com os colegas que estão de fora do governo.
Mas quem assegura que a corda das contradições entre civis, milicianos e militares está mesmo sendo esticada demais?
Para o mercado, nada deve se romper. Os militares precisam continuar como aliados do acordo (privatizações, reforma tributária, manutenção do teto, destruição de serviços públicos), e não como um risco ao que Bolsonaro se comprometeu a fazer e ameaça romper pela tentação de ser o Lula da direita.
É o cenário mais nebuloso desde a posse, porque agora Bolsonaro se acha pop. Para os interesses do capital, Bolsonaro pode acabar como uma cloroquina a serviço não da cura, mas de mais charlatanismo, desconfiança e confusão. E mais confusão dentro do governo é tudo o que as esquerdas desejam.
MOISÉS MENDES ” BLOG BRASIL 247″ ( BRASIL)
Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.