Luiz Eduardo Ramos, chefe da Secretaria de Governo, é um general. Tal como o “He Man”, o personagem de desenho animado, ele tem a força. Tem tropas atrás de si. Está na ativa. E, portanto, apto a dizer ao povo brasileiro que os comandantes do Exército acham “ultrajante” falar que eles pretendem dar um golpe no melhor estilo quartelada, à moda de 1964. A declaração foi dada à Revista Veja, que circula neste final de semana. Mas em seguida, numa contradição, ele manda um recado sutil como a entrada de um touro numa loja de porcelana: “Agora, o outro lado tem de entender também o seguinte: não estica a corda”.
Usando da mesma “sutileza”, eu devolvo para o general a seguinte questão: onde foi que o senhor cuspiu no chão e demarcou o limite que nós, a população brasileira, os que pagamos o seu salário e os dos seus comandados, não podemos ultrapassar? É importante que o jogo fique absolutamente claro, general. Do contrário, podemos esgarçar a corda, ao ponto de sermos surpreendidos com as suas tropas na nossa porta.
As falas de Ramos circulam coincidentemente no mesmo dia em que o Chefe do Estado Maior Conjunto dos Estados Unidos, o general Mark Milley, principal autoridade no ramo, desculpou-se com os americanos por ter acompanhado o presidente Donald Trump, em um ato político e desastrado, enfrentando as manifestações contra o racismo, numa caminhada marketeira até uma igreja – que, diga-se de passagem, Trump não frequenta.
“Minha presença naquele momento, e naquele ambiente, criou uma percepção de envolvimento dos militares na política interna”, disse.
A frase do comandante americano, impensável na boca de qualquer um dos generais daqui, que como craca se agarram ao poder de um governo que oprime e desconsidera as questões cruciais do seu povo, incomodou o general Ramos. Fez ver a ele o quão ridículo são os militares que topam misturar tudo e, num “cozidão à brasileira”, festejar entre faixas inconstitucionais, a tomada gradativa dos direitos da Nação. Há um mês, lá estava ele, ao lado de Bolsonaro, numa manifestação dos bolsominions.
Para contornar o “constrangimento” que disse sentir depois do episódio, declarou. “Não tenho direito de estar aqui como ministro e haver qualquer leitura equivocada de que estou aqui como Exército ou como general. Por isso, já conversei com o ministro da Defesa e com o comandante do Exército. Devo pedir para ir para a reserva. Estou tomando essa decisão porque acredito que o governo deu certo e vai dar certo. O meu coração e o sentimento querem que eu esteja aqui com o presidente.”
Então, qual é a dúvida general? Que “leitura equivocada” é esta? Parece até o Pelé, falando como o Edson Arantes… Façamos o seguinte. O senhor fica com o seu coração, que nós, do outro lado da corda, concluímos que quem esteve na rampa do Planalto foi o general Ramos! E estamos conversados.
A ponderação sobre o pedido para ir para a reserva serviu apenas como um retoque na foto, borrada com o episódio. No duro, sua permanência na ativa garante ter à mão tanques, baionetas e fuzis para quando “esticarmos a corda”. Exigimos, como povo bem comportado que somos, que o senhor de verdade nos diga: qual é o limite? Pois saiba que o nosso, 41 mil corpos depois, contidos e consumidos por uma pandemia que não consta da sua agenda, está no fim.
A corda que nos cerca, general, está na altura do pescoço. Todo ser humano tem um forte instinto de sobrevivência. E, tal como cantou Aldir Blanc, uma das vítimas desta doença que nos contém e vocês não cuidam por considerá-la “de esquerda”, seria interessante prestar atenção a estes versos do poeta: “Não põe corda no meu bloco/Nem vem com teu carro-chefe/Não dá ordem ao pessoal/Não traz lema nem divisa/Que a gente não precisa/Que organizem nosso carnaval”.
DENISE ASSIS ” BLOG 247″ ( BRASIL)