A FANTÁSTICA CAMISA 10

No meio desta tarde de quarentena, assisti um pouco do divertido programa do Fabio Porchat, no canal GNT, “Que história é essa Porchat?”.

São pessoas famosas ou nem sempre contando episódios divertidos ou nem tanto de suas vidas.

No episódio em questão, um oficial da marinha, sozinho em seu barco, navegava pela costa da Colômbia quando foi surpreendido por um tufão.

Sua embarcação foi presa fácil para o violento furacão, virou, naufragou e ele se viu num pequeno bote de borracha jogado numa praia.

Sem ter como sair, sobreviveu durante 28 dias. Fraco, desnutrido, desidratado, ferido, viu ao longe na praia aglomerado de pessoas que lhe pareceu serem mulheres.

Com muito custo se aproximou e viu que eram índios.

E o que é pior: estavam todos armados e com cara de poucos amigos.

Ficou sabendo depois, bem depois, que eram contrabandistas.

Identificado como um possível policial, foi imediatamente ameaçado: mata!, mata!, gritavam.

Foi quando apareceu o chefe daqueles índios, uma espécie de cacique e se inteirou da situação.

Nosso sobrevivente, com dificuldades de falar, conseguiu se comunicar e disse que não era polícia.

O cacique viu uma pequena mochila e despejou o seu conteúdo na areia. Entre os objetos, caiu uma camisa do Flamengo.

Os olhos do cacique brilharam e, ao ver o número da camisa, 10, começou a gritar:

– Cico! Cico!, em referência a Zico.

Desfeito o equívoco, estabeleceu-se forte amizade do nosso sobrevivente com os mercadores, nome pelo qual os contrabandistas passaram a ser tratados, e todos viveram felizes para sempre.

Aí me lembrei de uma história envolvendo Pelé.

Aconteceu em 1981 quando estive em Israel cobrindo a Macabíada, que é uma competição esportiva, no estilo olímpico, só para atletas de origem judaica e disputada a cada quatro anos em Israel.

Moisés Rabinovici era o correspondente do Jornal da Tarde em Israel e deu forte apoio a mim e ao Luiz Carlos Ramos que também fazia a cobertura pelo Estadão.

Em uma determinada noite naquele calor abrasivo de Israel, Rabino nos levou para jantar em um restaurante árabe situado na cidade de Jafa, na região metropolitana de Tel Avive.

Jafa é considerada o mais antigo porto comercial do mundo.

Lá fomos nós para um restaurante árabe, charmoso, mesas ao ar livre, debaixo de belas árvores.

Faziam a cobertura da Macabíada, eu, o Luiz e o Samuel Ferro. Osmar Santos, recém-casado com a Rosa Maria, desfrutava de romântica lua de mel. Casado aqui no Brasil dias antes do embarque para Tel Aviv, Osmar e Rosa Maria tiveram lá um novo casamento dentro dos costumes judaicos.

Novo casamento, nova lua de mel, motivo pelo qual pouco víamos o jovem casal.

Naquele jantar, estávamos, portanto, eu, Luiz Carlos, Rabinovici, Samuel Ferro e três outros brasileiros que não eram jornalistas.

Ocupamos uma mesa sob aquele céu bonito, estrelado e imediatamente apareceram dois garçons prontos para nos servirem.

Solicitamos ao nosso tradutor oficial e guia naquele jantar, o jornalista Moisés Rabinovici, que dominava o hebraico e o árabe, que pedisse um vinho branco gelado para aplacar aquele calor.

Os dois garçons olharam para nós com expressão de incredulidade, gesticularam, falaram alto e, para nós, parecia estar começando uma briga.

Rabino nos acalmou.

– É o seguinte: estamos no mês de Ramadan e eles não podem nos servir bebida alcoólica.

Protestamos:

– Sem vinho, nada de jantar. Vamos para outro restaurante.

Rabino então explicou para o garçom que éramos turistas e turistas brasileiros.

O garçom nos olhou com outra expressão e perguntou na verdade exclamando em alegria:

– Brasil? Brasil?

Rabino confirmou e o alegre garçom começou a bater palmas e a gritar:

– Bel é, Belé, Belé – como se sabe, o árabe sempre troca o “p” pelo “b”.

Pelé, claro!

E então Rabino explicou que éramos jornalistas e todos conhecíamos Pelé.

Viramos atração. Fomos cercados por outros garçons que, ao serem informados, também nos cravejaram de perguntas. Todos queriam saber como era Pelé: mais baixo, mais magro, gordo, sorridente, simpático. E os gols, quantos gols havíamos visto…

Voltamos ao vinho.

Nós já sabíamos que Ramadan era – e é – o mês de jejum dos árabes.

Desde o nascer do sol até o seu poente, eles não comem nada nem bebem nada. É mês de respeito, de concentração, de muita oração.

No que diz respeito às bebidas alcoólicas, eles sequer podiam tocar num vasilhame que as contivesse.

Deu se o impasse porque eles não queriam que a gente fosse embora, e nós queríamos tomar o vinho.

Os garçons foram consultar o dono do restaurante.

Minutos depois, vieram com a solução: eles venderiam o vinho, mas nós tínhamos que ir à geladeira, pegar o vinho, abrir e nos servir. Assim, eles ficavam livres de tocar na garrafa.

Sábia solução.

Tivemos um jantar maravilhoso, num cenário deslumbrante e regado com um geladinho  Domaine du Castel.

Com direito até a aula sobre as vinícolas das Colinas de Golan, na região da Galileia, ao norte do País, onde, o barão Edmond de Rothschild, que você conhece pela excelência dos vinhos franceses, trabalhou na plantação de vinhedos.

Aliás, consta que a primeira linha telefônica da região foi mandada instalar pelo poderoso barão em uma de suas vinícolas.

Como se vê, Pelé também salva.

MARIO MARINHO ” BLOG CHUMBO GROSSO” ( BRASIL)

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FOTO SOFIA MARINHO

Mário Marinho – É jornalista. É mineiro. Especializado em jornalismo esportivo, foi durante muitos anos Editor de Esportes do Jornal da Tarde. Entre outros locais, Marinho trabalhou também no Estadão, em revistas da Editora Abril, nas rádios e TVs Gazeta e Record, na TV Bandeirantes, na TV Cultura, além de participação em inúmeros livros e revistas do setor esportivo.

(DUAS VEZES POR SEMANA E SEMPRE QUE TIVER MAIS
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