Contra todos os prognósticos médicos e científicos, o presidente disse que aqui o vírus “parece estar desaparecendo”
No domingo de Páscoa nas redes sociais se cruzavam em todo o mundo mensagens de empatia, compaixão, solidariedade, esperança e medo em relação à tragédia do novo vírus. Chegaram a viralizar vídeos em que os heroicos médicos e enfermeiros que se expõem para salvar vidas ganham aplausos e canções.
Enquanto isso, no Brasil, seu presidente, Jair Bolsonaro, em sua mensagem de domingo de Páscoa, mentiu à nação e insultou a inteligência das pessoas ao afirmar, contra todos os prognósticos médicos e científicos, que aqui o vírus “parece estar desaparecendo”, e continua provocando para que as pessoas saiam às ruas para trabalhar.
A realidade é totalmente o contrário. No Brasil a curva de infectados e mortos está apenas começando e segundo ministro da saúde, Luiz Henrique Mandetta, os meses mais críticos serão maio e junho. E mais, os especialistas afirmam que, pelo escasso número de testes realizados, os números do coronavírus já devem ser dez vezes mais altos.
Enquanto as pessoas passaram a Páscoa tristes e solitárias, Bolsonaro pareceu insensível à dor alheia. O presidente sempre se diz católico e evangélico. E o dia de Páscoa representa aos cristãos a vitória da vida sobre a morte, da esperança sobre o pessimismo.
Nesse dia Bolsonaro se limitou a dizer que o importante é que “nós aqui na terra, quando chegar nosso dia, estaremos ao lado de Deus”. De qual Deus? Porque no Brasil são professadas muitas religiões diferentes. E os sem Deus? Os agnósticos e ateus e seguidores dos ritos africanos não são brasileiros? Não somos um Estado laico pela Constituição?
O presidente em suas mensagens comentando o drama do coronavírus revela, na verdade, seus instintos de matiz nazista ao não dar importância ao problema dos idosos e dos mais frágeis que já possuem alguma doença crônica e que seriam os mais atingidos. Instigando outros a sair às ruas aumenta o perigo de contaminação dessas pessoas do grupo de risco dentro das famílias. Ele só faltou evocar os campos de concentração de triste memória.
A falta de empatia do presidente com os mais frágeis ofende o espírito da comemoração pascal que fala da redenção de todos os considerados inúteis à sociedade. Eles são vistos mais como um peso morto ao ex-capitão para quem parece que só têm direito à vida os jovens, os saudáveis e os produtivos.
Enquanto em todo o mundo todas as forças da nação sem distinção de credo político tentam se juntar para ganhar a guerra ao vírus, o presidente brasileiro fica cada vez mais isolado em seus sonhos de que a pandemia é uma bobagem e um engano, que conduz somente à quebra da economia e que, no máximo, poderá eliminar os que menos importam.
Em sua mensagem de domingo o presidente se limitou a dizer: “Vivemos um momento difícil e sabemos quem pode nos curar: Deus, sempre acima de tudo”. Desse modo, e continuando em confronto e desmentindo a cada dia seu próprio ministro da Saúde, se alguém não o parar, sua mão pode acabar conduzindo o país a uma crise e a uma hecatombe sem precedentes.
Manter o empenho em continuar considerando o presidente como um desequilibrado com cada vez menos crédito que parece falar somente por seus instintos de morte e suas alucinações paranóicas, deixando-o no poder, é abandonar um país como o Brasil a sua própria sorte. E isso quando a nação mais precisaria de uma liderança segura compartilhada com todas as outras forças da nação.
O presidente brasileiro, que se diz católico, não só desafiou em sua mensagem os brasileiros levando-os a minimizar a tragédia, como a seu próprio Deus. Deveria lembrar, por exemplo, as palavras de Jó na Bíblia quando se pergunta: “Quem poderá desafiar a Deus e sair vitorioso?”. Na verdade, o presidente saudoso da ditadura já foi derrotado em sua teimosia de querer negar a luz do sol.
Os desafios contínuos de Bolsonaro não somente a Deus como à vida das pessoas já o tornam, ele querendo ou não, um claro perdedor.
JUAN ARIAS ” EL PAÍS” ( ESPANHA / BRASIL)