Há Mello e Melo – sobrenome tipicamente português. Um nome de família originário da cidade de Vizela, na querida região minhota, banhada pelo Rio Minho, que separa Portugal da espanholíssima Galícia.
São encontradas nesta época do ano, em suas águas, as apreciadas lampreias, uma espécie de cobra, que, cozida à cabidela, ou seja, no próprio sangue, é uma das exóticas atrações da gastronomia do Norte lusitano. O sobrenome seria grafado, inicialmente, com o ‘l’ dobrado e, posteriormente, com apenas um. Como Francisco de Melo (1597 – 1651), de linhagem nobre, nascido na alentejana Estremoz, próxima à Évora, que se tornaria um dos heróis da Guerra dos Trinta anos (1618 – 1648), à serviço do soberano Habsburgo de Madri, Felipe IV (1605 – 1665), El Grande, ao comandar as tropas espanholas na vitoriosa Batalha de Honnecourt, em 26 de maio de 1642, contra os franceses, em Lens, ao Norte de Paris, reconquistando para os católicos os caminhos dos antigos territórios de Flandres – compreendendo, hoje, a Bélgica, Luxemburgo e parcialmente a Holanda. Ilustra a coluna retrato do personagem português.
Ele seria designado Governador-Geral de Bruxelas por Felipe IV – que, ao acumular o trono de Lisboa, recebera o título de Felipe III. Melo sucederia o irmão de Felipe IV, Fernando de Áustria (1609 – 1641), o Infante Cardeal, que havia falecido seis meses antes, aos 32 anos, na atual sede da União Europeia, após cair enfermo na campanha nos Flandres.
A Guerra dos Trinta Anos foi deflagrada com a ampliação do conflito entre católicos e luteranos, nos domínios do Sacro Império Romano Germânico, devido à entrada em cena dos segmentos mais fundamentalistas do protestantismo calvinista. O então Império Germânico abrangia também a Áustria e boa parte da Mitteleuropa – a Europa Central.
Foi decisiva em Honnecourt, ao lado de Melo, a presença do exímio estrategista de guerra, o luxemburguês Jean Beck (1588 – 1648), Governador de Felipe IV no Grão-Ducado do Luxemburgo, que liderou, na região gaulesa da Picardia, os legendários Tercios Españoles, contingentes formados, cada qual, por três mil combatentes. Os Tercios foram criados em 1534 pelo bisavô de Felipe IV, o Imperador germânico Carlos V (1500 – 1558), Carlos I em Espanha, para melhor controlar seus territórios na Itália, dentre os quais, estava a valiosa Milão.
Existiram também em Portugal, ainda no século XVI, com a tradução para Terços, em quatro localidades: Lisboa, Santarém, Alentejo e Algarve. Os Tercios de Melo seriam derrotados pelos franceses, quase um ano depois, em 19 de maio de 1643, na Batalha de Rocroi, na fronteira da França com a Bélgica. Beck não conseguira chegar a tempo de socorrer os Tercios de Melo e quem o substituiu foi o veterano Conde Paul-Bernard de Fontaines, de 77 anos, francês da Lorraine, que morreria naquele embate.
Tinha sido um grande chefe militar, porém, em Rocroi, cometeu vários equívocos táticos que causariam a debacle dos homens de Melo. O fidalgo alentejano era, a rigor, um diplomata, ao contrário de Beck e do Conde de Fontaines, tendo sido, anteriormente, embaixador madrilenho em Gênova e Viena e Vice-Rei da Sicília.
Portugal já havia restaurado sua Independência dois anos antes da Batalha de Honnecourt. Melo continuou, entretanto, batendo-se por Madri – a exemplo de outro compatriota, o transmontano Fernão de Magalhães, dono também de sobrenome minhoto, que fizera a Primeira Viagem de Circum-navegação, de 1519 a 1522, sob a bandeira da Coroa espanhola. E, por isso, com justiça, são, igualmente, heróis das duas nações ibéricas.
ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)
Albino Castro é jornalista e historiador