A extensão da epidemia, as notícias de filas nas portas dos hospitais, as grandes tragédias sociais, e as familiares, produzirão uma segunda onda de temor. E aí poderá ser trágico, pois o pânico desorganizará da pior forma toda a atividade produtiva.
A lógica da economia segue a lógica da saúde. O ponto central de instabilidade é o avanço de uma doença, trazendo um conjunto amplo de incertezas:
- Os graus de letalidade.
- A capacidade dos governos em enfrentá-la.
- O tempo necessário para sua erradicação.
- A capacidade do governo em apoiar as empresas e as populações vulneráveis.
O ponto-chave é a rede hospitalar e a capacidade de oferecer leitos de UTI e de tratamento semi-intensivo. Essa é a linha central, em torno da qual há duas estratégias de enfrentamento, ambas trazendo mais incertezas.
A estratégia da quarentena horizontal estica o prazo de vigência da doença, para evitar picos que colocassem a demanda muito acima da capacidade de atendimento dos hospitais.
Por outro lado, a capacidade da rede hospitalar dependerá da rapidez da economia em produzir produtos estratégicos – respiradouros e máscaras – e dos governos estaduais e municipais em improvisar centros de atendimento em estádios de futebol e hotéis.
Quanto mais rápido atuarem, menor será o tempo de duração da quarentena. Quanto maior o tempo da quarentena, maiores os estragos na economia.
Aí se entra em outra variável, que é a capacidade dos governos em trabalhar os problemas sociais e econômicos decorrentes da quarenta.
Ele teria que agir nas seguintes frentes:
- Vulneráveis: definir uma renda mínima e operacionalizar a chegada do dinheiro até eles.
- Pequenas e médias empresas: montar sistemas de crédito que permitam atravessar o período de tormenta.
- Grandes empresas: garantir a recompra de debêntures, recebíveis ou crédito de longo prazo para preservar seu capital de giro.
- Sistema bancário: prover de liquidez, inclusive para dar liquidez ao mercado de capitais.
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É o único caminho para combater a peste, conter os estragos econômicos e preparar para a retomada, assim que a doença for vencida.
O segundo caminho – estimulado por Jair Bolsonaro – consiste em deixar tudo solto e acelerar o pico da doença. Com isso, também se reduzirá o tempo de quarentena, mas da pior forma possível: expondo milhares de pessoas à morte. Os infectados, assintomáticos ou curados, tornam-se imunes à doença, deixando de transmiti-la. E os mortos ficam pelo caminho.
Por essa visão, sacrificam-se algumas milhares de pessoas pelo coronavirus, para salvar a maioria pela retomada da economia. No fundo, é uma maneira do governo admitir sua incompetência para conduzir a economia de guerra e deixar que cada qual se vire.
Trata-se de uma visão equivocada, inclusive do lado econômico, pois não leva em consideração o chamado fator pânico.
O governo tem demonstrado uma má vontade expressa em erguer logo programas de assistência social para as populações vulneráveis. Deixou ao Deus-dará a população carcerária. E, com o estímulo de Bolsonaro à quarentena vertical, haverá uma enorme rachadura nos planos de defesa dos governos estaduais e uma explosão de novas doenças, especialmente nas capitais, lideradas por São Paulo e Rio.
Até agora, a população experimentou uma primeira onda de temor, que a fez acatar as determinações de quarentena. Bolsonaro está implodindo essas recomendações. Pode-se esperar, então, uma onda de rebelião contra as medidas restritivas. Essa onda produzirá um aumento grande do número de infectados.Leia também: Economia de guerra: Reino Unido pagará 80% do salário dos trabalhadores
A extensão da epidemia, as notícias de filas nas portas dos hospitais, as grandes tragédias sociais, e as familiares, produzirão uma segunda onda de temor. E aí poderá ser trágico, pois o pânico desorganizará da pior forma toda a atividade produtiva.
A Itália experimentou a flexibilização da quarentena logo que identificou o coronavirus. A consequência foi uma tragédia social, que não apenas deixou milhares de mortos, como afetou – da forma mais desorganizada possível – todo o ambiente econômico.
Mas o país está nas mãos de uma pessoa totalmente sem escrúpulos e sem discernimento. Enquanto Bolsonaro estiver no comando, a morte continuará rondando ele e o país.
LUIS NASSIF ” JORNAL GGN” ( BRASIL)