Jornalismo é, para mim, um ofício, sobretudo, intelectual, como é considerado em diversos países europeus, a exemplo de França, Itália, Portugal e Espanha, apesar da criação nas últimas décadas de inúmeras escolas de comunicação em todo o planeta, que passaram a dar à atividade um caráter mais técnico – conforme ocorre, frequentemente, nos Estados Unidos e no Brasil.
Também é o Jornalismo, intrinsecamente, a maior das trincheiras da liberdade de expressão nas sociedades democráticas – da imprensa propriamente dita, com jornais e revistas, ao rádio, televisão e a vastíssima mídia digital. Mas, sem dúvida, é uma profissão que se desenvolve e se aperfeiçoa, a rigor, nas redações, com grandes mestres, ou por meio da leitura de primorosos articulistas.
Tive múltiplos mestres, nos diferentes veículos nos quais trabalhei. Aprendi – e aprendo ainda hoje com muitos deles. Destaco alguns: Celso Brandão e Miguel Arcanjo Terra, na paulistana Folha da Tarde, Rui Falcão, no diário A Gazeta, de São Paulo, Guilherme da Cunha, meu Editor Internacional em O Globo, no Rio de Janeiro, responsável por enviar-me como correspondente à Europa, o luso-moçambicano Augusto de Carvalho, no semanário lisboeta Expresso, Mario de Almeida, na Gazeta Mercantil, o ‘quatrocentão’ Roberto Pompeu de Toledo, na Istoé e em Veja, João Máximo, Raul Azedo e João Antônio, na Rio Gráfica Editora, agora Editora Globo, e Marcos Wilson, meu diretor no SBT.
Fui admirador de concorrentes, entre os quais, o mais carioca dos amazonenses, Araújo Neto, meu contemporâneo em Roma, correspondente do Jornal do Brasil. E me inspirei em autores estrangeiros. Do uruguaio Eduardo Galeano, de Marcha, de Montevidéu, e Crisis, de Buenos Aires, à italiana Oriana Falacci, da revista Epoca e dos cotidianos Corriere della Sera e La Reppublica, ao franco-cairota Robert Solé, do parisiense Le Monde, ao ribatejano José Saramago, do Diário de Notícias, de Lisboa, ao libanês Issa Goraieb, de L’Orient-Le Jour, de Beirute, e aos irmãos argentinos Algañaraz, de origem basca: Juan, um dos idealizadores da inovadora revista semanal espanhola, Cambio 16, que marcou nos anos 1970 ‘el destape español’, e Júlio, correspondente na Cidade Eterna do diário portenho Clarín.
O caríssimo Raul Azedo pregava uma máxima – que infringirei justamente nesta coluna. Legendário militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB), irmão mais velho de Maurício Azedo, ex-Presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), e pai do colunista político, Luiz Carlos Azedo, do Correio Braziliense, ele costumava ensinar aos jovens, como eu, que jornalista nunca é notícia. Só quando morre, porém, com uma ressalva: “Se fosse amigo do secretário de redação”, referindo-se ao profissional que então fazia a revisão final de todos os textos – como ele na antiga Editora Globo.
Atuara antes ao comando dos jornais cariocas O Dia e Luta Democrática e, nas suas folgas, editava sozinho, na clandestinidade, o órgão oficial do PCB, Voz Operária, numa gráfica em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Contudo, como disse, vou ‘desobedecer’ ao saudoso Raul Azedo e prestar, aqui, um especial tributo ao meu querido colega, o madeirense António Martins Araújo, cuja foto ilustra a coluna, que completará 80 anos na próxima terça-feira, 17 de dezembro, data com festejos na paulistana Casa de Portugal, presidida pelo Comendador António dos Ramos.
Martins Araújo chegou ao Brasil em 1955, às vésperas de fazer 16 anos, tornando-se um dos grandes nomes da comunicação da diáspora lusitana em São Paulo. Sou ouvinte de seus preciosos programas radiofônicos desde os tempos da Rádio Tupi à atual Rádio Trianon, onde vai ao ar às quartas-feiras, das 22h30 à meia-noite, e, aos domingos, das 11 horas ao meio-dia e meia.
Tive o privilégio, inclusive, de ser o Diretor de Jornalismo da TV Cultura quando a emissora transmitia os jogos do Campeonato Português com comentários do sempre bem humorado Martins Araújo, notável adepto do Marítimo, de sua Funchal, e do Benfica. O que poucos sabem é que, de 1960 a 2000, ele também foi livreiro. É um prazer estar novamente ao seu lado, neste Caderno de São Paulo sob a coordenação do transmontano Armando Torrão, um ‘amigalhaço’ – como o define Martins Araújo, ao juntar as palavras amigo com aço, ou seja, ‘amigo de aço’.
Nascido no Distrito do Funchal, Conselho de Santa Cruz, na Freguesia do Caniço, vizinha ao aeroporto da Ilha da Madeira, Martins Araújo e sua esposa, a apresentadora Adriana Cambaúva, têm bons motivos para comemorar. Resta-me somente contrariar um dos mestres e homenagear o amigo. Palmas e parabéns para Martins Araújo!
ALBINO CASTRO ” PORTUGAL EM FOCO” ( BRASIL / PORTUGAL)
Albino Castro é jornalista e historiador